Ativista pernambucana é primeira pessoa a conseguir registro como intersexo
A jornalista pernambucana Céu Albuquerque é a primeira pessoa do Brasil a conseguir o registro como intersexo na certidão de nascimento. A ativista entrou com o pedido de mudança no documento em julho de 2021, e no último dia 7 teve o reconhecimento oficial expedido.
O que aconteceu
Ativista pelos direitos da pessoa intersexo, Céu é a primeira pessoa a conseguir o registro na certidão de nascimento. O marco histórico foi reconhecido pela Abrai (Associação Brasileira Intersexo).
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A pernambucana foi registrada, inicialmente, como sendo do sexo feminino. Céu, hoje com 32 anos, é portadora de Hiperplasia Adrenal Congênita. Isto é, uma condição genética que interfere no desenvolvimento sexual e na formação da genitália externa.
Ainda criança, a ativista foi submetida a uma cirurgia de redesignação sexual, vista pela comunidade como uma forma de mutilação. Por ter uma genitália ambígua, foram feitos sequentes exames para identificar sua estrutura de cromossomos, o que levou ao procedimento cirúrgico e ao registro inicial feminino.
Os trâmites para mudança se iniciaram há três anos. Já integrando a Abrai e consciente da necessidade do reconhecimento de pessoas intersexo, Céu contou com o auxílio da Defensoria Pública do Estado de Pernambuco no processo.
Pessoas intersexo existem desde o início da humanidade. Está em todas as espécies. Quando a gente vê em pleno 2024 a gente ter o primeiro registro no Brasil, dá a sensação de avanço e de atraso. Isso deveria ser natural.
Céu Albuquerque, jornalista e ativista
De acordo com a Abrai, para além do Brasil, não há conhecimento jurídico de outro caso no mundo em que a pessoa conseguiu a alteraação no registro. Segundo Céu, a vitória vai possibilitar um avanço para a Justiça brasileira.
Mais direitos para pessoas intersexo. Céu acredita que a partir do seu caso, toda comunidade intersexo do Brasil vai se beneficiar.
A Justiça brasileira vai reconhecer um corpo intersexo, uma pessoa nascida assim. Representa a criação de políticas públicas, para acolher crianças, famílias e adultos intersexo. Essas pessoas podem usar judicialmente seus direitos para registro.
Céu Albuquerque, jornalista e ativista
Além do registro de sexo, Céu também mudou seu nome na certidão. A pernambucana disse ao UOL que foi uma vitória dupla, pelo fato de agora não precisar mais ficar desconfortável e ser tratada no masculino.
Agora, Céu vai seguir os trâmites para adequação de todos os seus documentos. Thais Emilia, presidente da Abrai, disse ao UOL que a conquista já está repercutindo internacionalmente. Associações de outros países passaram a parabenizar e reconhecer o impacto do primeiro registro para a comunidade.
É o reconhecimento de que esses corpos existem e que eles devem ser protegidos, ter sua integridade respeitada tanto física como psicologicamente. E a gente também tem feito várias articulações, várias políticas públicas de proteção de saúde integral às crianças intersexo. É um ganho essa retificação da Céu, porque ela traz todo esse debate da importância de reconhecer que existem corpos intersexo. E esse reconhecimento faz com que, automaticamente, se gere debate sobre e que, principalmente, se preserve a existência destes corpos, dessas pessoas e da sua saúde.
Thais Emilia, presidente da Abrai
O que é ser intersexo?
Segundo a ONU, pessoas intersexo nascem com características sexuais (incluindo genitais, gônadas e padrões cromossômicos) que não se encaixam nas noções binárias típicas de corpos masculinos ou femininos.
Até os dois meses de vida intrauterina, a genitália e as gônadas (glândulas sexuais) masculina e feminina são idênticas. A partir da oitava semana de gestação, se o feto possuir testículo, ele produzirá hormônio masculino, e consequentemente desenvolverá pênis, uretra e bolsa escrotal. Mas, se esse feto não produzir o hormônio masculino ou esse hormônio não agir como deveria, ele nascerá com a genitália incompleta.
Por não serem exclusivamente masculinas ou femininas, essas pessoas com genitália incompleta são consideradas intersexuais. Elas podem ter, por exemplo, pênis e útero. No mundo, existem cerca de 1,7% pessoas que se identificam como intersexo.