Homem condenado por estupros é inocentado após passar 12 anos preso em SP
Tiago Minervino
Colaboração para o UOL, em São Paulo
17/05/2024 17h47
Depois de ter a inocência provada por exames de DNA, o jardineiro Carlos Edmilson da Silva, condenado a 137 anos, 9 meses e 28 dias de prisão em regime fechado por uma série de estupros, deixou a cadeia após 12 anos.
O que aconteceu
Carlos Edmilson da Silva tinha 24 anos quando foi preso em 10 de março de 2012. Ele foi reconhecido por meio de uma foto como o responsável por estuprar 10 mulheres em Barueri e em Osasco, na região metropolitana de São Paulo, entre 2010 e 2012. Posteriormente, o jardineiro foi condenado pelo Tribunal de Justiça do estado a mais de 137 anos de detenção.
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Preso injustamente, Carlos passou os últimos 12 anos no sistema carcerário de São Paulo. O jardineiro só obteve a anulação de sua condenação após exames de DNA do Instituto de Criminalística da Polícia Técnico-Científica comprovarem não apenas sua inocência, mas também revelarem o verdadeiro culpado.
Carlos Edmilson sempre alegou inocência. Entretanto, durante o julgamento, nenhuma instância comparou o DNA dele com o material biológico encontrado nas vítimas. O caso mudou após ele receber o auxílio do instituto Innocence Project Brasil, uma ONG criada para prestar serviços gratuitos a vítimas de erros judiciais.
Defesa do jardineiro requisitou comparação de DNA dele com os encontrados nas vítimas. Ao UOL, a advogada Flávia Rahal explicou que dos 10 casos nos quais o Innocence Project Brasil atuou, em apenas cinco tinham sido coletados material genético das vítimas e foi exatamente nesses em que foi possível produzir o exame de DNA. Em alguns casos, contou Rahal, nunca se tinha tentado essa prova pericial, e em alguns poucos outros "tinha-se a compreensão de que o material coletado não era suficiente para a realização dos exames".
Mas fato é que nós conseguimos a produção de cinco exames de DNA que comprovaram com segurança que o Carlos Edmilson é inocente, quatro dos quais apontaram outro homem como autor dos estupros.
Flávia Rahal, diretora e fundadora do Innocence Project Brasil
Verdadeiro culpado descoberto. Os exames que atestaram a inocência de Carlos também revelaram que o autor dos estupros é José Reginaldo dos Santos, 34, que já estava preso no sistema prisional paulista por roubo. O material genético de Reginaldo foi encontrado em pelo menos quatro das cinco vítimas que tinham fornecido DNA às autoridades.
STJ determinou liberdade do jardineiro. Com o resultado dos testes de DNA, o Tribunal de Justiça de São Paulo e o Superior Tribunal de Justiça, em Brasília, determinaram a soltura de Carlos Edmilson.
Advogada critica reconhecimento por foto
Rahal criticou a condenação de vítimas a partir de reconhecimento por fotografias. A advogada reiterou que as vítimas não mentiram sobre os abusos sofridos, mas destaca que elas foram levadas a acreditar que Carlos Edmilson foi o responsável por violentá-las apenas por uma foto e induzidas pela investigação de se tratar de uma pessoa que já estava sendo reconhecida em outros casos analisados pela polícia.
Para Flavia Rahal, o reconhecimento por foto "tem sido uma das grandes causas [de erros] judiciários no Brasil". A advogada destacou que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) tem "tentado orientar da forma mais precisa possível a realização desse procedimento como meio de obtenção de provas", mas, "sem dúvidas, há muitas chances de erro quando esse reconhecimento [do suspeito] é feito por meio de fotografia".
Erros em reconhecimento por foto. De acordo com o STJ, em 2023, das 377 decisões tomadas pela Corte que revogaram a prisão temporária ou absolveram réus devido a falhas no seu reconhecimento como autores de crimes, 281, o equivalente a 74,6% dos casos, tiveram como fundamento a existência de erros na identificação por meio de fotografias.
Carlos está aliviado
Ao UOL, Flávia Rahal disse que Carlos Edmilson pensa em reconstruir sua vida. Fora das grades, o jardineiro está aliviado e ao lado da família e ao deixar a cadeia ontem acompanhado por sua mãe, ele disse apenas estar "sem palavras".
Ele está muito aliviado, feliz de está livre, com a família. O pensamento agora é na reconstrução do futuro dele.
Flávia Rahal
Estado deve reconhecer falha e indenizar o jardineiro. Para a advogada, "é fundamental" que a Justiça de São Paulo reconheça não apenas o erro, mas que indenize Carlos Edmilson pelos 12 anos em que esteve encarcerado. Rahal, entretanto, não informou se ele pretende processar o Estado.
SSP informou que apura possível "irregularidade na investigação" que resultou no indiciamento e condenação de Carlos Edmilson. Em nota, a Secretaria de Segurança Pública estadual afirmou que tomou "as medidas cabíveis" e reiterou "prezar por apurações minuciosas".
Veja a íntegra da nota da SSP-SP:
A Polícia Civil está ciente da decisão judicial e analisa todos os fatos. Constatada qualquer irregularidade na investigação que resultou no indiciamento do homem mencionado pela reportagem, as medidas cabíveis serão tomadas, inclusive com abertura de procedimento apuratório junto à Corregedoria. A Instituição destaca que exerce suas atividades dentro da lei, de forma rigorosa, imparcial, e preza por apurações minuciosas.