Contra mototáxi, Prefeitura de SP faz campanha com motoboy cadeirante
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Em mais um capítulo na queda de braço entre a Prefeitura de São Paulo e empresas de aplicativos, a gestão Ricardo Nunes (MDB) utilizou um motoboy que sofreu um acidente e hoje é cadeirante para criticar a regulamentação de outra categoria profissional na cidade: o mototáxi. No vídeo lançado no sábado (8), o homem afirma que proibir mototáxi evitará que aconteça a outras pessoas o que aconteceu com ele, "ou até pior".
O que aconteceu
A peça publicitária explora a história de um motoboy que ficou em uma cadeira de rodas após um acidente. "A gente sabe que moto é perigoso. O número de mortos em acidentes está crescendo", diz o motoboy Renato Dantas dos Santos. "No ano passado foi o maior da história: 483 mortes."
Por isso a prefeitura não permite o mototáxi por aplicativo. Pra não acontecer com você o que aconteceu comigo ou até pior.
Renato Dantas dos Santos, motoboy
Carros por app também sofreram pressão
Há uma década, a prefeitura também foi contra a regulamentação do transporte de passageiros em carros de aplicativos. De olho no apoio dos taxistas, contrários à chegada do Uber no Brasil, a prefeitura tentou resistir à regulamentação da modalidade, mas acabou não resistindo à pressão.
Agora, o serviço de mototáxi ameaça os taxistas e os motoristas de app regulamentados na década passada. Com regras parecidas, o mototáxi podem ter placa vermelha, devem contar com uma série de itens de segurança, os condutores são submetidos a treinamentos e podem ter ponto fixo para apanhar passageiros.
Alinhada à prefeitura, o SindimotoSP (Sindicato dos Mensageiros Motociclistas, Ciclistas e Mototaxistas Intermunicipal do Estado de São Paulo) critica o serviço. Em nota, diz que a 99 "não está preocupada nem com a vida dos motociclistas nem com a dos passageiros" e classificou a modalidade de "ilegal".
Rigor não é o mesmo com motoboys

Regulamentado desde 2009, o serviço de motoboy é, literalmente, celebrado na cidade. Desde 2016, o dia 27 de julho é o Dia do Motoboy. Indispensáveis para a rotina dos grandes centros urbanos, eles têm uma das maiores jornadas de trabalho: em média, 46 horas semanais, enquanto os outros profissionais brasileiros trabalham, em média, 39,5 horas, segundo o IBGE.
Não há dados sobre o número de motoboys e entregadores na capital paulista. Ainda segundo o Instituto, 1,5 milhão motociclistas trabalhavam com aplicativos em todo o Brasil em 2023 — 39,5% (589 mil) eram entregadores.
Contra os mototáxis, a prefeitura diz que se baseia no aumento de mortes e lesões para vetar o mototáxi. Ela afirma que o crescimento de acidentes e mortes na cidade é proporcional ao crescimento da frota, com um salto de 35% nos últimos dez anos: de 833 mil em 2014 para de 1,3 milhão em 2024. Já as mortes saltaram 22% de janeiro a novembro de 2023 (350 óbitos) para 427 no mesmo período de 2024, mesmo com a implantação pela prefeitura da Faixa Azul, exclusiva para motociclistas.
Quem usou a Faixa Azul, no entanto, esteve mais seguro. O número de óbitos nessas vias caiu 47,2% de 2023 para 2024, de acordo com dados do Infosiga, sistema estadual de monitoramento da letalidade no trânsito. Foram 36 mortes em 2023 contra 19 no ano passado. Circulam diariamente cerca de 500 mil motociclistas pelos 212 quilômetros de Faixa Azul em 34 vias da cidade de São Paulo até dezembro do ano passado — 40% da frota total de motos.

Prefeitura X Uber e 99
A confusão começou porque o mototáxi é regulamentado em âmbito federal, mas cada município estabelece suas normas. Em São Paulo, por exemplo, um decreto de 2023 proíbe o serviço, o que provocou o conflito.
Em 2023, a prefeitura criou um Grupo de Trabalho para discutir o meio de transporte. A conclusão, diz em nota, foi que "a implementação desse modal custaria um grande risco para a saúde pública, envolvendo a integridade de condutores e usuário, com potencial aumento no risco de acidentes", diz em nota. "Assim, um decreto daquele ano proibiu o transporte remunerado de passageiros por motocicletas."
Anualmente, o município gasta cerca de R$ 35 milhões com cuidados de pacientes vítimas de acidente de moto na cidade.
Prefeitura de São Paulo, em nota
Serviço está suspenso

A 99 foi o primeiro aplicativo a desafiar a prefeitura ao lançar o serviço, no dia 22 de janeiro deste ano. Apesar dos protestos imediatos da gestão municipal, no dia seguinte a Uber lançou seu Uber Moto. As viagens ocorriam fora do centro expandido, se concentrando na periferia, "onde o transporte público é menos presente", disse na época a chefe da Uber Moto no Brasil, Laura Lequain. A modalidade seria "complementar ao serviço público" e nas viagens de "última milha", do ponto de ônibus ou estação de metrô até a casa, ou vice-versa.
A prefeitura respondeu cobrando na Justiça R$ 1 milhão de multa diária contra a 99. Em uma ação da Procuradoria-Geral do Município, a gestão justificou "danos morais coletivos e crimes de desobediência".
A 99 recorreu afirmando que a prefeitura não podia proibir, apenas regulamentar e fiscalizar a atividade. "Já existem mais de 20 decisões judiciais confirmando esse entendimento, que é confirmado também pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em decisão de repercussão geral", disse a 99 em comunicado.
Primeiro, a Justiça concordou com a 99. Uma decisão negou multa aos aplicativos, mas permitiu a fiscalização da prefeitura. Em decisão do último dia 27, porém, o juiz Eduardo Gouvêa mandou os aplicativos suspenderem o transporte de passageiros, o que foi acatado. Por se tratar de uma liminar, a decisão é provisória.
E o que acham os passageiros?
Sete em 10 paulistanos são a favor do transporte de pessoas em moto. Os dados são de um levantamento feito pelo Instituto Locomotiva, a pedido da 99, entre 17 e 20 de janeiro. A pesquisa ouviu 2048 pessoas em São Paulo.
O mesmo levantamento mostrou que 80% concordam que a moto é uma alternativa mais rápida para chegar em casa. Além disso, 74% dos entrevistados dizem que o transporte por moto é uma alternativa para trajetos a pé com menos exposição a riscos, e 80% dizem que é uma opção acessível para áreas de difícil acesso ao transporte público.
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