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Quem manda no Cristo? Morte de turista expõe embate entre Igreja e ICMBio

Cristo Redentor está em unidade de conservação federal Imagem: Yasuyoshi Chiba/AFP

Do UOL, em São Paulo

19/03/2025 05h30

A morte do turista Alex Duarte, 54, em uma escadaria de acesso ao Cristo Redentor, no Rio, expôs uma briga, já antiga, entre os responsáveis pela administração do lugar: a Arquidiocese do Rio e o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). O Procon-RJ chegou a fechar o acesso ao Corcovado por um dia após o caso.

Quem é responsável pelo Cristo?

O ICMBio gerencia o Parque Nacional da Tijuca, uma unidade de conservação federal onde está localizado o monumento ao Cristo Redentor. Como o Corcovado pertence à União, toda a infraestrutura do morro é gerida pelo ICMBio, assim como as outras áreas do Parque Nacional da Tijuca. O ICMBio, ligado ao Ministério do Meio Ambiente, também cuida da cobrança dos ingressos dos visitantes.

Já a Arquidiocese do Rio (instância da Igreja Católica) cuida da manutenção da estátua do Cristo. Também administra a Capela de Nossa Senhora Aparecida, localizada na base do monumento. Juntos, a estátua e a capela formam o Santuário Cristo Redentor.

O transporte de turistas até o Cristo é feito por duas concessionárias. A concessionária Paineiras-Corcovado faz o transporte das vans. E o transporte por trem é de responsabilidade da concessionária Trem do Corcovado. Este último contrato de concessão foi firmado em 2014 entre o ICMBio e a Trem do Corcovado.

Parque Nacional da Tijuca é administrado pelo ICMBio Imagem: Rafael Duarte/ICMBio9

Santuário fala em 'entraves burocráticos'

A morte do turista motivou reclamações por parte da família —e troca de acusações entre os órgãos ligados ao monumento. Para a família do turista, houve demora no atendimento ao homem.

A administração do Santuário criticou supostos "entraves burocráticos" do ICMBio. "O único posto médico que deveria atender os visitantes fica boa parte do dia fechado. A Arquidiocese do Rio de Janeiro busca a todo momento colaborar com o desenvolvimento do Alto Corcovado, mas esbarra nos entraves burocráticos impostos pelo ICMBio."

Para o Santuário, o Complexo do Alto Corcovado não está preparado hoje para receber o número de visitantes. "O complexo não possui acessibilidade universal, não possui uma equipe de brigadistas e socorristas nem ambulância." A Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro disse que vai disponibilizar uma ambulância para suporte às atividades religiosas no Santuário, "frente à situação crítica de desassistência por parte do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade".

Diversos projetos estão sem o devido andamento sem nenhuma justificativa legal para tal, inclusive o de colocar uma ambulância de prontidão no Alto Corcovado.
Santuário Cristo Redentor, em nota

O órgão ambiental disse, por meio de nota, que vem trabalhando, mesmo antes do ocorrido, para aprovar projetos de acessibilidade. "Reforçamos ainda que as tratativas do ICMBio junto ao Iphan [Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional] para a rápida aprovação dos projetos de acessibilidade em todo o Alto Corcovado estão em andamento e as obras devem iniciar o quanto antes."

Sobre o caso do turista, o ICMBio disse que o atendimento médico é de responsabilidade do Trem do Corcovado, conforme estabelecido no contrato de concessão. "Informamos que a manutenção e o pleno funcionamento do Posto de Primeiros Socorros no Alto do Corcovado é de responsabilidade da empresa concessionária Trem do Corcovado."

Já o Trem do Corcovado diz que mantém um posto de enfermaria em funcionamento no Alto do Corcovado. Conforme a nota, os profissionais são treinados e habilitados para atuarem em atenção aos primeiros socorros, com manuseio de desfibrilador. Ainda de acordo com a empresa, o turista chegou a ser atendido por profissionais, mas "não houve possibilidade alguma de salvamento, apesar de os socorristas chegarem com o desfibrilador no mesmo instante e, em seguida, o Samu".

Cristo Redentor com iluminação em homenagem à campanha do Brasil nas Paralimpíadas 2024 Imagem: CPB/Divulgação

Embate chegou ao Congresso

A discussão sobre o controle do Cristo já chegou ao Congresso. Um projeto de lei no Senado propõe excluir o Corcovado, que abriga o Cristo, dos limites do Parque Nacional da Tijuca. O PL 3.490, de 2024, é de autoria de Carlos Portinho (PL-RJ), Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Romário (PL-RJ). Segundo o texto, a mudança ajudaria na administração do monumento que, segundo os autores, "enfrenta sérios problemas de estrutura e gestão como a falta de acessibilidade para pessoas com deficiência, escadas rolantes que ficariam meses inoperantes, equipamentos degradados e a falta de banheiros para atender a quantidade de visitantes."

Na Câmara dos Deputados, o PL 3.208/2024 sugere a transferência da área que compreende o entorno do Cristo Redentor à Mitra Arquiepiscopal do Rio de Janeiro, da Arquidiocese de São Sebastião —órgão responsável pelo patrimônio religioso da cidade, como museus de arte sacra. A proposta é de autoria de Washington Quaquá (PT), ex-deputado federal e atual prefeito de Maricá (RJ).

As propostas enfrentam resistência do Conselho Consultivo do Parque Nacional da Tijuca, formado por órgãos do governo e associações ligadas ao meio ambiente. Em uma moção de repúdio no ano passado ao PL no Senado, o conselho argumentou que o projeto propõe a concessão de parte da área a uma "entidade privada religiosa" e coloca em risco a integridade ecológica, a identidade cultural e a soberania do Estado.

Padre já foi barrado

Essa não é a primeira vez que o Santuário Cristo Redentor critica o ICMBio. Em 2021, um padre disse que foi barrado na entrada do Cristo pelo órgão ambiental. Padre Omar Raposo, reitor do Santuário Cristo Redentor, afirmou que seguranças não o deixaram entrar para a realização de um batizado.

Na época, o sacerdote falou em "atos hostis" do ICMBio. "De maneira recorrente, o reitor do Santuário Cristo Redentor, padre Omar, bispos e outros religiosos do Rio de Janeiro, juntamente com fiéis e convidados da igreja que participam das missas, casamentos, batizados e ações culturais promovidas pelo Santuário Cristo Redentor, passam por constrangimentos para acessarem o santuário. Os gestores do Parque Nacional da Tijuca inviabilizam a servidão de passagem, entre outras ações vilipendiosas", disse a Arquidiocese do Rio, em nota.

À época, o ICMBio disse que qualquer pessoa precisa se identificar. "Por questões de segurança dos frequentadores e conservação ambiental de alguns parques nacionais, todos os veículos que acessam as áreas restritas precisam se identificar", informou a nota.

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