Eles usam colete, capacete e patins: guardas vigiam a Paulista sobre rodas

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Em vez de calças, eles usam bermudas. Como seus colegas, vestem coletes à prova de balas e carregam armamento, mas também utilizam joelheiras, cotoveleiras, capacetes e, no lugar dos sapatos, um item inesperado para um guarda: patins.
Três guardas civis metropolitanos têm chamado a atenção de quem circula diariamente pela avenida Paulista nos últimos dias. Eles fazem parte do "Programa Paulista Mais Segura", lançado pela Prefeitura de São Paulo no último dia 21 de março, em frente à Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo).
A medida, coordenada pela Secretaria da Segurança Urbana, tem o objetivo de intensificar o monitoramento na região, uma das mais movimentadas e visadas por criminosos na capital paulista.
Além de 376 agentes da GCM (Guarda Civil Metropolitana), o programa conta com o suporte da tecnologia do Smart Sampa, com 68 câmeras, drones, cão-robô, base móvel e uma equipe de policiamento com patins —atualmente formada por dois homens e uma mulher.
Guardas e campeões
Elis, 42, começou a andar de patins muito antes de vestir o uniforme da guarda civil. "Ganhei um par de patins usados quando tinha 7 anos. Ninguém me ensinou a andar, coloquei no pé e nunca mais larguei", diz ela, que tem uma tatuagem do equipamento no pescoço.

"Às vezes, passam grupos de patins na Paulista e acenam pra mim, porque também patino fora do trabalho", acrescenta a policial, vencedora da medalha de ouro na maratona de patins Let's Roller & Run, realizada em São Bernardo do Campo, em 2019.
Paulino, 42, patina desde os 11 anos, e Natil, 47, aprendeu aos 20. Ambos também já ganharam medalhas em competições envolvendo patins.
O que era apenas um hobby começou a se misturar com o trabalho em 2016, ano em que eles se inscreveram em um curso de patins para policiamento promovido pela GCM.
Depois de oito meses de aulas com um instrutor especializado, os três guardas civis substituíram os sapatos pelas rodas no parque do Ibirapuera, onde a modalidade foi inicialmente adotada pela corporação.
No parque, as atividades mais comuns incluíam orientar o público sobre as regras de uso do espaço, coibir o consumo de entorpecentes e prevenir casos de assédio, incluindo a prisão de um assediador.
A experiência durou até 2020, quando os "guardas patinadores" foram redirecionados para diferentes delegacias, após a gestão Ricardo Nunes (MDB) conceder a administração do parque à iniciativa privada.

Agora, os patins voltaram a ser instrumento de trabalho. "Quando estávamos no Ibirapuera, chegamos a subir algumas vezes na Paulista para ajudar a fazer o policiamento aos domingos. Então, na verdade, estamos voltando para a Paulista", afirma Natil.
Prevenção de "crimes de oportunidade"
O saldo dos primeiros dias nessa nova etapa foi positivo, segundo o trio. "Como a guarda civil em geral está fazendo o policiamento na Paulista, com muitas viaturas, a tendência é a taxa criminal cair. A nossa parte no policiamento com patins é prevenir os crimes de oportunidade", diz Paulino.
Crimes de oportunidade são aqueles cometidos quando os criminosos aproveitam uma situação favorável, como a distração das vítimas ou a falta de vigilância, para furtar bolsas ou celulares, por exemplo.
Com os patins, é mais fácil se deslocar com agilidade entre as multidões, especialmente em áreas onde veículos são restritos, afirmam os guardas. E é um equívoco pensar que o equipamento compromete o equilíbrio dos profissionais, segundo Paulino.
"Muita gente pergunta 'mas e se vocês forem abordar o ladrão e ele empurrar, vocês não vão cair?' e a resposta é não. É muito mais fácil derrubar uma pessoa a pé firme do que de patins", diz ele.

"Se a pessoa vier nesse intuito de agarrar, é pior para ela, já que isso nos dá mais estabilidade, porque a gente vai usar o ponto de apoio da pessoa, que está contra nós, a nosso favor. É mais fácil levar a pessoa para o chão", acrescenta o guarda civil.
O treinamento que o grupo recebeu em 2016 não tinha como objetivo apenas ensinar os inscritos a andar de patins, mas principalmente a usar técnicas de segurança sobre rodas.
Segundo Natil, na época, a equipe de artes marciais da GCM também ajudou a desenvolver técnicas de mobilização específicas para o policiamento com patins, modalidade que também é usada em cidades como Paris, Barcelona e Miami.
"A gente usa as técnicas de artes marciais que foram adaptadas para a equipe de patins, é uma mistura personalizada", diz ele.
O próprio patins serve para te defender. Ele é pesado e, se bem utilizado, pode machucar outra pessoa, então também consigo me defender com o material que está no meu pé. Elis
"Tem gente que só quer desabafar"

Elis, Paulino e Natil trabalham em turnos de 12 horas, metade delas sobre os patins.
"Como nesse começo estamos em três pessoas, acabamos patinando de 6 a 7 horas por dia, com intervalos de meia hora ou 60 minutos a cada 1 hora", explica Paulino.
O trio foi "escolhido a dedo" pelo comandante geral da GCM, Eliazer Rodella, que era inspetor fiscal quando a modalidade começou a ser usada no parque do Ibirapuera. "Devido às nossas habilidades, ele perguntou 'vocês topam?', e viemos".
Em nota, a Secretaria de Segurança Urbana afirmou que "a Guarda Civil Metropolitana de São Paulo está empenhada em aumentar o número de agentes treinados para o policiamento com patins" e informou que o curso de aperfeiçoamento está programado para acontecer ainda no primeiro semestre.
A equipe de policiamento sobre patins circula por toda a extensão da avenida Paulista, que se estende por quase três quilômetros, indo da praça dos Ciclistas até a praça Oswaldo Cruz. Eles atuam em áreas de pedestres, ciclovias e asfalto.
Guardas mais humanos
No caminho, o olhar de curiosidade dos pedestres é inevitável. "Muita gente pede pra tirar foto, pergunta curiosidades sobre os patins. Tem pessoas que param a gente só pra desabafar", conta Paulino.
O uso de patins também faz parte de uma estratégia para humanizar a figura dos guardas. "Não estamos dentro de uma viatura, estamos no meio das pessoas", observa Natil.
Tirar dúvidas de pedestres e turistas foi uma das atividades mais comuns para o trio na primeira semana de patrulhamento. "Qual é a estação de metrô mais próxima?" ou "onde fica o shopping?" são algumas das mais comuns, segundo eles.
Também foram frequentes as orientações sobre as ciclofaixas e faixas de pedestre. "Nesse sentido, é um pouco parecido com o que fazíamos no parque do Ibirapuera, mas em uma escala muito maior", avaliam.
Mas uma ocorrência mais grave também já aconteceu. O sistema Smart Sampa localizou uma pessoa procurada pela polícia na rua Augusta. "Acompanhamos a situação junto com as viaturas e motos, fazendo o patrulhamento na Augusta", relembra Natil.
O foragido foi preso pela equipe das motos. "Eles chegaram um quarteirão antes de nós", admite Paulino. "Mas isso não importa, porque não é uma competição, a gente tem o mesmo objetivo".
Em nota, a Prefeitura de São Paulo informou que, desde a sua implementação, em 21 de março, a operação Paulista Mais Segura registrou 13 ocorrências e realizou 6 prisões.
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