Secretário diz que 86% das famílias do Moinho aceitaram reassentamento

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No mesmo dia em que moradores da favela do Moinho, na região central de São Paulo, protestaram contra o plano da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) de desocupação do terreno, o secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação de São Paulo, Marcelo Cardinale Branco, afirmou em coletiva de imprensa que o programa estadual de reassentamento já foi aceito por 86% das famílias da região.
O que aconteceu
Entrada do Moinho, localizada entre duas linhas de trem, está com sua principal via de acesso bloqueada por viaturas da Polícia Militar desde a última sexta-feira (18). O bloqueio, segundo o secretário, tem como objetivo garantir que caminhões contratados pela CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo), responsável pelo plano de reassentamento dos moradores, façam a mudança de algumas famílias que aceitaram sair da comunidade. As primeiras mudanças estão oficialmente previstas para serem concluídas hoje e outras dezenas devem ocorrer ao longo da semana.
Plano estadual prevê a remoção das mais de mil famílias da comunidade. No lugar, serão criados um parque e uma estação ferroviária. Em nota, a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo), responsável pelo reassentamento, afirma que o governo busca realocar as famílias "em moradias seguras e dignas", para, posteriormente, "requalificar a área".
Representantes do governo afirmam que 716 famílias já aceitaram sair da comunidade, mas contratos assinados até hoje ainda são minoria. "Hoje, nós temos 47 contratos definitivos assinados de famílias que já escolheram seu imóvel", afirmou o presidente da CDHU, Reinado Iapequino, na mesma coletiva de hoje.
Associação de moradores do Moinho divulgou que a presença da polícia na comunidade há cerca de uma semana pressiona famílias a aceitar a oferta do governo. O secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação nega essa relação. Ele afirma que a PM realizou incursões na favela para combater o tráfico e, mais recentemente, para "garantir o direito" das famílias que desejam deixar a favela.
Uma pessoa foi presa no último dia 18, acusada por tráfico de drogas, e moradores denunciaram ações policiais truculentas na última semana. Pelas redes sociais, a associação local do Moinho divulgou que a PM utilizou bombas de gás lacrimogêneo e gás de pimenta que atingiram moradores e crianças. A reportagem tenta contato com algumas lideranças locais para mais informações e o texto será atualizado no caso de novas manifestações.
UOL apurou que parte das famílias teme não conseguir se manter nas moradias propostas pelo estado. No fim de março, lideranças comunitárias do Moinho afirmaram à reportagem que o plano estadual não leva em conta a realidade local. "Não conseguimos pagar o que estão exigindo para que a gente saia daqui", disse uma delas.
Se sairmos daqui para pagar uma moradia que não vamos conseguir sustentar, vai dar um tempo e vamos parar na rua ou em outra comunidade. Aliás, é assim que surgem as favelas. A questão é que eles pretendem jogar essas comunidades pras periferias. No centro novo e bonito que eles querem, não podemos ficar. Liderança local do Moinho
Secretário diz que os que não querem sair do Moinho são minoria, mas que remoções forçadas não estão nos planos do governo. "Temos absoluta certeza de que esses 14% que ainda não querem sair irão acabar optando por essa mudança de local porque ninguém está feliz em morar ali, naquela área de risco", afirmou Branco.
"Esperamos que próximas operações policiais se deem na maior tranquilidade possível, acrescentou o secretário. Questionado durante a coletiva sobre as acusações de truculência por parte da polícia na última semana e sobre a previsão de como serão as próximas operações, Branco afirmou: "Vamos continuar seguindo o cronograma da CDHU, que tem o plano de tirar cerca de 80 famílias durante essa semana e com com certeza faremos isso da melhor forma possível."
CDHU pretende transferir famílias para moradias financiadas dentro e fora do centro. Uma das opções é a oferta de uma Carta de Crédito Individual para o morador adquirir um imóvel pronto, pré-selecionado pela CDHU ou disponível no mercado e escolhido pelo morador. O valor dos imóveis financiados não pode passar de R$ 250 mil, caso estejam na região central. Em outras regiões da cidade ou outros municípios, o valor máximo é de R$ 200 mil.
Prestações deverão ser pagas em até 30 anos, como prevê a política habitacional. O período é o mesmo da duração do contrato de parceria público privada entre o governo e as empresas responsáveis pelas obras de requalificação e administração de imóveis no centro da cidade. A proposta do estado também inclui um auxílio moradia de R$ 800. O valor será pago pelo governo estadual e pela prefeitura até que os moradores sejam realocados nos novos imóveis.
Embate com governo federal
Área do Moinho pertence à União. A SPU (Secretaria do Patrimônio da União), ligada ao governo Lula (PT), confirma que a gestão estadual "solicitou a cessão de uma área para a implantação do Parque do Moinho", mas ressaltou que "a transferência do terreno está condicionada à garantia do direito à moradia das quase mil famílias que vivem no local". Ainda não há previsão para a cessão da área, porque depende da entrega pela CDHU "de um plano de reassentamento que contemple as necessidades dos moradores". Somente depois disso "será possível avançar nos trâmites administrativos para a formalização do contrato de cessão", conclui o órgão.
No último dia 19, SPU emitiu nota técnica desautorizando a demolição de habitações na favela do Moinho, até que a área seja definitivamente cedida ao estado. O documento assinado no início da semana passada pela chefia do órgão federal é uma resposta ao plano de reassentamento do governo estadual.
Desfazer construções faz parte da estratégia do governo paulista para evitar a reocupação dos imóveis. O governo Tarcísio diz que o risco que a permanência representa aos moradores impõe a necessidade da retirada das habitações. Como o plano prevê que as mudanças ocorram aos poucos, as casas seriam desfeitas também progressivamente, tão logo fossem desocupadas, conforme apuração da Folha de S. Paulo.
Favela do Moinho é a última do centro de São Paulo
Comunidade é cercada por trechos das linhas 7-Rubi e 8-Diamante da CPTM e ViaMobilidade, respectivamente. O acesso ao Moinho é uma entrada atravessada por trilhos. Moradores convivem com barulhos e tremores pela passagem constante dos trens.
Favela foi construída a partir de uma ocupação sob o viaduto Engenheiro Orlando Murgel. Era ali que ficava o Moinho Central, uma indústria de processamento de farinha e de rações para animais. A indústria foi desativada no final da década de 1980. Nos primeiros anos, os moradores eram ex-trabalhadores da fábrica.
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