PM repudia crítica a falsos confrontos policiais após condenação na Justiça

Após o Tribunal de Justiça de Goiás condenar cinco policiais por matarem três jovens em Goiânia, a Polícia Militar do estado divulgou "repúdio" a uma crítica de jornalista que afirmou que "a maioria" dos confrontos entre policiais e criminosos era "armação".

O que aconteceu

PM de Goiás repudia fala de jornalista. No sábado (26) à tarde, o comandante da Polícia Militar de Goiás, coronel Marcelo Granja, declarou que as "afirmações não condizem com a realidade". O UOL apurou que era uma referência à acusação de que a maioria dos confrontos era uma armação. Isso foi considerado uma generalização pela cúpula da PM de Goiás.

Na nota, o coronel disse que "informações distorcidas ou infundadas" sobre a atividade policial gera "consequências graves". Granja disse que isso colocava em risco "a vida de homens e mulheres que cumprem sua missão constitucional de proteger a população". A nota menciona o jornalista Oloares Ferreira, autor do comentário, e não cita o julgamento dos policiais, mas só foi divulgada quase dois dias depois da decisão judicial. A reportagem pediu esclarecimentos a PM de Goiás, mas não os obteve até o momento.

Apresentador de TV questionou os confrontos no dia do julgamento dos policiais. Na quinta-feira (24), a TV Record de Goiás noticiou o início da realização do júri de cinco policiais acusados de matarem os dois adolescentes e um jovem em 2019, caso conhecido como "chacina do Jardim das Aroeiras", em Goiânia. Ao final da reportagem, o apresentador Oloares Ferreira, do "Balanço Geral", comentou que "a maioria absoluta do 'confronto' não foi confronto". Ele ainda criticou os policiais "valentões" e destacou que eles acabam presos e sem ajuda do governo até para pagarem seus advogados.

A maioria é armação que [quando] diz que foi confronto, mas, como muitos [mortos] têm passagem pela polícia é o famoso 'defunto sem choro'. Ninguém da sociedade vai levantar bandeira para quem tem antecedentes criminais.
Oloares Ferreira, na TV

O julgamento começou naquele dia e, à noite, os cinco policiais foram condenados a sete anos de prisão. Eles iniciariam a pena em regime semi-aberto, mas podem recorrer em liberdade. Ricardo Martins Vinhadelli, de 40 anos, Pablo Andrade Corrêa, 38, Willian Kennedy Palmier Capucho Leão, 34, Paulo Henrique Borges, 40, e George Gomes de Souza, de 40 anos, foram condenados por matar os jovens: Pedro Henrique Souza Santos, Wallison Barros dos Santos e Maycon Ferreira Conceição da Silva em 27 de março de 2019, no Jardim Aroeira.

No sábado, a PM criticou o comentário de Oloares, afirmando que há "compromisso" da corporação com a proteção da população e com o cumprimento dos "direitos humanos".

Reiteramos nosso compromisso inabalável com a legalidade, a ética e 0 respeito aos direitos humanos, pautando nossa atuação sempre pela transparência e pelo interesse público.
Nota da PM de Goiás

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"Repudiamos, de forma veemente, qualquer tentativa de deslegitimar ou enfraquecer o trabalho sério e abnegado desempenhado pela Polícia Militar do estado de Goiás", continuou a corporação.

No domingo (27), Oloares rebateu a nota a PM e disse que se baseou-se em dados. "Quando afirmei que muitos confrontos não são 'de fato' confrontos, não tirei essa informação da minha cabeça", afirmou.

Basta pegar o levantamento da própria Corregedoria da PM, dos processos na Justiça, dos júris já agendados e as investigações na Polícia Civil. Pegue as perícias da Polícia Técnica Científica e veja quantos casos ficaram comprovados de não ocorreu confronto como alegaram os policiais.
Oloares Ferreira, em rede social

Ele destacou que "a maioria dos casos o Estado é condenado e quem paga a conta somos todos nós". "Continuarei respeitando e divulgando os bons policiais, porém, continuarei sempre implacável contra os policiais que fizerem coisas erradas", afirmou Oloares.


O UOL pediu uma entrevista com o comandante geral da PM de Goiás, Marcelo Granja, ou outro representante da corporação no sábado e no domingo. Os esclarecimentos serão publicados se forem recebidos.

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MP diz que mortes tinham confronto falso

No processo da condenação dos cinco policiais, os agentes alegaram em interrogatórios que houve "confronto com as vítimas". Segundo relatório da desembargadora Carmecy Rosa Oliveira, feito no ano passado, a defesa "insiste na tese de que houve confronto durante seu empenho no combate à criminalidade e que não há espaço para questionamento acerca da alegada legítima defesa com que agiram os réus".

Mas, para a Promotoria, o confronto era falso. De acordo com comunicado do Ministério Público, na tarde de 25 de março de 2019, "os policiais se dirigiram a uma casa no Setor Jardim das Aroeiras para averiguar a notícia de que ali se encontrava um veículo que estaria sendo utilizado para o cometimento de roubos na região". "Entraram no imóvel arrombando o portão da casa, momento em que foram efetuados três tiros na vítima Pedro Henrique Souza Santos, causando-lhe a morte instantânea." Walisson e Maycon pularam o muro para fugirem, mas acabaram mortos pelos policiais. "Walisson foi alvejado por três disparos, enquanto Maycon foi alvejado nove vezes", narrou a Promotoria.

O Ministério Público diz que os policiais "demoraram" a acionar o atendimento médico, "bem como na comunicação do 'suposto confronto' ao centro de operações". "Para dar suporte à versão do 'confronto', os policiais declararam que as vítimas efetuaram disparos de arma de fogo contra a equipe policial após o rádio utilizado pelo denunciado Ricardo ter tocado". "Ficou comprovado que o veículo não possuía impressões digitais compatíveis com nenhuma das vítimas."

O MP disse que estuda recorrer da sentença para aumentar a punição aos policiais. Eles vão recorrer em liberdade.

Defesa nega fabricação de confronto

A defesa pretende recorrer para anular o julgamento porque entende as provas foram ignoradas. "A decisão foi contrária às provas do processo", disse o advogado dos cinco policiais, Rodrigo Lustosa.

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Houve, de fato, situação de confronto entre as vítimas e os policiais. Existem fortes evidências de que realmente houve uma situação de confronto.
Rodrigo Lustosa, advogado

. Ele disse ao UOL que a alegada simulação de confronto é apenas "posição argumentativa" dos promotores e que "não existem elementos concretos que apontem isso".

Lustosa evitou entrar na discussão sobre falsos confrontos entre o jornalista Oloares Ferreira e a Polícia Militar de Goiás. "Uns casos ou outros envolvem discursos políticos. Dentro do processo, as questões têm que ser examinadas de forma técnica."

A Defesa compreende que a decisão dos jurados tenha sido manifestamente contrária a prova dos autos, isso porque nos autos exigem fortes evidências de que realmente houve uma situação de confronto entre as vítimas e as equipes policiais. Por isso, consideramos a perspectiva de recorrer ao Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, buscando a anulação deste

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