Bolsista serve à diversidade, mas escolas não acolhem: 'Sofrem em silêncio'
Ler resumo da notícia

Em meio a mais um caso de bullying contra uma bolsista em uma escola de elite em São Paulo, o movimento negro exige recursos voltados a políticas de combate ao racismo e à igualdade racial no Plano Nacional de Educação, em debate no Congresso Nacional. Entre as ideias defendidas, especialistas querem evitar que bolsistas "sirvam" à diversidade, mas sem que sejam efetivamente incluídos na comunidade escolar.
Combate ao racismo na grade curricular
Entidades propõem formação de professores para lidar com racismo. Educador e fundador da Uneafro Brasil, Douglas Belchior cita a necessidade de medidas contínuas. "O racismo não vai ser combatido com uma palestra ou uma aula. É preciso que tenha uma formação permanente de professores para lidar com momentos de conflito. E, também, criar um espaço de conscientização para os estudantes", diz.
Regulação inclui reforma na grade curricular. "O conteúdo antirracista não faz parte do procedimento pedagógico das escolas, e fica limitado a iniciativas pontuais que precisa partir do próprio professor. O Estado precisa regular com mais efetividade não só a atuação das escolas públicas, como também das escolas particulares, na contramão do que tem acontecido no país", avalia Douglas Belchior.
A grade curricular prioriza uma visão eurocêntrica em um país de maioria negra. Isso reflete a incapacidade de garantir uma educação de qualidade que corresponda à própria história do país. É preciso também que haja um compromisso de pessoas brancas em ações antirracistas para garantir uma política que não amplie as violências com as pessoas mais vulnerabilizadas.
Gabriel Maia Salgado, Instituto Alana
Combate à violência envolve punição a agressores. O fundador da Uneafro Brasil cita ainda a necessidade de monitoramento e avaliação em casos mais de racismo em sala de aula, com identificação e punição aos agressores. "Mas, principalmente em escolas particulares, não é o que acontece. Como é um negócio, as instituições costumam acobertar os fatos para manter a credibilidade da marca", diz Douglas Belchior.
Escola precisa destacar referenciais positivos sobre o local de origem do bolsista. "A instituição de ensino não deve só identificar as ausências de direito à educação, negligenciada durante a trajetória do bolsista. É preciso identificar características positivas naquele território e no ambiente cultural onde ele está inserido", diz Gabriel Maia Salgado, do Instituto Alana
Os bolsistas acabam mais expostos onde há uma maioria branca de famílias ricas e conservadoras, em um ambiente naturalmente violento e opressor com jovens negros. Mas eles só parecem estar sendo beneficiados. Na verdade, sofrem em silêncio, porque prestam serviço para a comunidade escolar, que tem essa demanda por diversidade. Como o coletivo não os acolhe, isso gera exclusão e um peso psicológico.
Douglas Belchior, Uneafro Brasil
As escolas particulares precisam adotar medidas para garantir a presença com dignidade para que bolsistas negros possam compor um espaço formado por uma maioria de pessoas brancas. Não permitir a reprodução do racismo nesse espaço é fundamental para a construção de uma identidade de pertencimento e fortalecimento de referências para todos os estudantes.
Gabriel Maia Salgado, Instituto Alana
O que se sabe sobre racismo no Mackenzie
Uma bolsista de 15 anos foi encontrada desacordada no banheiro do Colégio Mackenzie, em Higienópolis, bairro nobre de São Paulo. Segundo a família, ela vinha sofrendo ataques racistas e bullying desde o ano passado. Caso ocorreu há uma semana.
Menina era chamada de "cigarro queimado" e "lésbica preta". Em depoimento à Polícia Civil na segunda-feira, a mãe da vítima detalhou ataques racistas atribuídos a cinco estudantes do Mackenzie.
Mãe de vítima disse que buscou ajuda psicológica na própria escola, mas que auxílio não ocorreu por falta de vagas. "Nenhuma providência foi adotada", disse a advogada Réa Sylvia, que representa os familiares da adolescente.
Colégio Mackenzie diz que prestou ajuda e segue dando acolhimento. "[A escola segue] prestando suporte com cuidado, escuta e responsabilidade. Assim, o contato e o apoio à família têm sido contínuos", disse a instituição de ensino, em nota.
Comissão antirracista de pais do Colégio Equipe vê relação com caso no shopping Higienópolis. Há um mês, dois alunos negros foram alvo de abordagem racista de uma segurança do local, perto do Colégio Mackenzie. O episódio mobilizou 500 manifestantes em um ato dentro do estabelecimento. Em nota, shopping diz repudiar atos de racismo.
Procure ajuda
Caso você tenha pensamentos suicidas, procure ajuda especializada como o CVV (www.cvv.org.br) e os Caps (Centros de Atenção Psicossocial) da sua cidade. O CVV funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados) pelo telefone 188, e também atende por e-mail, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil.
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.