Balonismo: é possível pular? Entenda os riscos e protocolos de segurança

O acidente com um balão em Santa Catarina, que matou oito pessoas, expôs a falta de protocolos específicos para emergências em voos turísticos. Especialistas ouvidos pelo UOL explicam os riscos de permanecer no cesto ou de saltar durante uma queda e apontam a necessidade de regulamentação para o turismo de aventura no Brasil.

O que aconteceu

Oito morreram e 13 escaparam com vida após um balão de ar quente pegar fogo e cair em Praia Grande (SC), no sábado (21). O piloto conseguiu baixar o balão até uma altura menor e orientou os passageiros a saltarem quando tocasse o chão. Com menos pessoas, o balão voltou a subir. Quatro vítimas pularam quando ele estava no alto e morreram na queda. Outras quatro permaneceram no cesto e não resistiram ao fogo ou ao impacto com o solo.

Pular de uma altura média pode ser menos letal do que permanecer no cesto até o impacto final. Segundo o professor doutor em física Gilberto Murakami, da Universidade São Judas, ao atingir o solo com todo o peso da estrutura, o balão sofre uma desaceleração súbita e violenta. Já um passageiro que salta de forma controlada, "embora corra sério risco de fraturas ou traumas, tem chance de sobrevivência maior — principalmente em alturas entre 10 e 20 metros", diz.

A gravidade das lesões depende de fatores como altura, velocidade de queda, tipo de solo e postura corporal. "Queda descontrolada de costas ou de cabeça, por exemplo, é quase sempre fatal", alerta Murakami. Acima de 20 metros, as chances de sobrevivência são muito pequenas. "Entre 10 e 15 metros, há relatos de sobreviventes com lesões graves, e abaixo de 5 metros a probabilidade de escapar com vida é significativa", afirma.

O peso do balão também é determinante na força do impacto. A segunda lei de Newton, expressa pela fórmula "F = m × a", indica que quanto maior a massa, maior será a força ao atingir o solo. "O impacto do balão inteiro com o cesto, passageiros e equipamentos gera uma força muito maior do que o impacto de uma única pessoa caindo da mesma altura", explica. Para reduzir o risco em uma queda livre, algumas técnicas usadas por paraquedistas incluem cair com os pés primeiro, joelhos e quadris flexionados e proteger a cabeça com os braços.

Além da questão do impacto, Murakami destaca a ausência de extintores de incêndio como um fator crítico. Segundo ele, a inclusão de extintores deveria ser considerada uma medida de segurança essencial, mesmo com o impacto que isso possa ter no peso e na operação do balão.

Falha na legislação

A ausência de equipamentos de emergência, como o extintor citado pelo professor, reflete a falta de regras claras para o turismo de aventura no Brasil. A avaliação é do advogado Marco Antônio Araújo Júnior, presidente da Comissão Especial de Direito do Turismo, Mídia e Entretenimento do Conselho Federal da OAB.

Atividades como balonismo, voo livre, rapel e mergulho ainda não têm legislação federal que estabeleça regras claras e obrigatórias para a operação turística. "Embora existam normas gerais, como o Código de Defesa do Consumidor e algumas normas técnicas da ABNT, falta uma regulação detalhada que discipline essas práticas de aventura", afirma.

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O balonismo turístico segue hoje regras voltadas à navegação aérea, não ao turismo. "A prática costuma ser enquadrada como esporte, sendo parcialmente regida por normas da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), que tratam mais da segurança da navegação aérea do que da atividade turística em si", explica Araújo Júnior.

A falta de regulamentação compromete tanto a segurança dos turistas quanto a segurança jurídica dos operadores. "Do ponto de vista do consumidor, faltam exigências claras sobre capacitação dos operadores, manutenção dos equipamentos, planos de contingência e seguros obrigatórios", alerta o advogado.

Para as empresas, o cenário é de insegurança jurídica. "A ausência de normas aumenta a vulnerabilidade dos operadores, que ficam sujeitos a interpretações diversas quanto à responsabilidade civil e, em casos mais graves, até criminal. Em caso de acidente, isso gera disputas complexas sobre culpa, negligência ou imperícia", afirma.

Criação de regras

Após o acidente, o Ministério do Turismo abriu diálogo com representantes do setor para discutir a criação de regras específicas para o turismo de aventura. Segundo Araújo Júnior, a reunião, que deve ocorrer ainda esta semana, deve abordar a elaboração de uma minuta de regulamentação voltada para atividades de maior risco, como balonismo, voo livre e mergulho.

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Atualmente, as regras existentes são definidas pela Anac por meio de dois regulamentos principais:

  • RBAC 103, que trata da aviação ultraleve, incluindo os balões de ar quente, com foco nas regras gerais de operação e segurança da navegação aérea.
  • RBAC 61, que define os critérios de formação, habilitação e certificação de pilotos civis, incluindo a exigência do CHT (Certificado de Habilitação Técnica) de Piloto de Balão Livre.

Para operar legalmente, o piloto precisa ter o CHT, e o balão deve estar matriculado na Anac. No entanto, não há uma norma nacional que discipline os passeios turísticos, o que deixa pontos como briefing de segurança, equipamentos de emergência e protocolos de evacuação a critério de cada operador.

A Confederação Brasileira de Balonismo (CBB) tem atuação restrita ao âmbito esportivo. Ela é responsável por organizar campeonatos, manter o registro de pilotos e aeronaves e promover a prática do balonismo como esporte, mas não possui poder legal para fiscalizar empresas que oferecem passeios turísticos comerciais.

O UOL entrou em contato com a CBB, em busca de mais informações, mas até a publicação desta reportagem não houve resposta aos questionamentos.

Errata:

o conteúdo foi alterado

  • Diferentemente do informado em versão anterior, quatro pessoas saltaram do balão depois que ele baixou e voltou a subir, não antes do pouso feito pelo piloto. O texto foi corrigido.

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