A volta do ex

Rio elege Eduardo Paes para 3º mandato como prefeito com vitória ampla sobre Marcelo Crivella

Gabriel Sabóia, Herculano Barreto Filho e Igor Mello Do UOL, no Rio

Eduardo Paes (DEM) venceu a disputa à Prefeitura do Rio e governará o segundo maior colégio eleitoral do país pela terceira vez. Com ampla vantagem, o democrata derrotou o atual prefeito Marcelo Crivella (Republicanos), que contou com o apoio do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Paes obteve 64,07% dos votos válidos (1.629.319 votos), contra 35,89% de Crivella (913.700)—diferença superior a 715 mil votos. Votos brancos somaram 5,01% e nulos, 13,72%. O Rio teve a maior abstenção da história política da cidade em um 2º turno —1.720.154 cariocas deixaram de ir às urnas (35,45% do total de eleitores).

O democrata venceu em todas as zonas eleitorais da capital. Após a vitória, Paes afirmou que "essa eleição significa que há uma confiança na política de novo" e que "ódio e divisão não fez bem a nenhum de nós cariocas".

Hoje, vocês estão livres para voltar a confirmar essa cidade como a cidade a diversidade. É uma cidade tão ampla, que aceita todos, que abraça todos

Para sair vitorioso, ele apostou no recall de seu nome junto ao eleitor após dois mandatos como prefeito (2009 a 2017) e na comparação direta de suas gestões com o governo de Marcelo Crivella —cuja desaprovação chegou a 72% a cinco dias da eleição, segundo pesquisa do Ibope.

A alta rejeição de Crivella também beneficiou Paes à medida que levou partidos de esquerda —com histórico de oposição ao ex-prefeito— a se posicionarem contra o republicano nas urnas.

Tampouco o fato de Paes ter virado réu por suposto recebimento em 2012 de caixa dois da Odebrecht desmobilizou o "apoio crítico", também alimentado pela parceria de Crivella com Bolsonaro.

Na reta final, Crivella elevou o tom contra Paes —travando embate agressivo com o ex-prefeito— e lançou mão inclusive de fake news. O republicano que, ao longo da campanha associou Paes ao ex-aliado Sérgio Cabral, previu uma futura prisão do democrata e adotou a expressão "Eduardo Paes rouba mas faz".

Dois anos após ser derrotado por Wilson Witzel (PSC) na eleição ao governo do Rio, Paes assumirá a prefeitura com o desafio de enfrentar a pandemia do novo coronavírus e um rombo nos cofres públicos —cenário bem diverso da época dos Jogos Olímpicos (2016), quando o governo Dilma Rousseff (PT) patrocinou obras em sua gestão.

Paes liderou a campanha de ponta a ponta —sempre com uma margem segura em relação aos adversários. No 1º turno, o democrata teve 37,01% dos votos contra 21,9% de Crivella —pouco menos de 400 mil votos de vantagem.

A liderança folgada permitiu que o ex-prefeito não nacionalizasse a disputa. Enquanto Crivella colou sua imagem em Bolsonaro, a aparente neutralidade de Paes permitiu que unisse em seu palanque virtual no 2º turno ampla gama de alianças.

Paes foi apoiado formalmente pelo PT e recebeu acenos envergonhados de parte dos expoentes do PSOL ao mesmo tempo em que capitalizou o apoio do PSD de Gilberto Kassab, legenda que serviu como uma das "barrigas de aluguel" para bolsonaristas no 1º turno no Rio.

O único momento em que Paes sentiu a liderança ameaçada ocorreu em 23 de outubro, quando o Datafolha mostrou que a Delegada Martha Rocha (PDT) havia empatado numericamente com Crivella e vencia Paes nas simulações de 2º turno por 45% a 41%.

Paes abandonou o tom olímpico de sua propaganda, focada até então em destacar os feitos de seus governos, e partiu para a desconstrução da candidata do PDT.

A coligação do prefeito eleito contou com outros seis partidos (Cidadania, DC, PV, Avante, PL e PSDB). O vice de Paes é Nilton Caldeira (PL).

Os desafios de Eduardo Paes

André Horta /Fotoarena/Folhapress

De 'mauricinho' a 'sambista'

A vitória de Eduardo da Costa Paes, 51, desponta como uma espécie de "descarrego na vida política" desse carioca nascido na zona sul, conforme integrantes de sua equipe diziam na campanha.

A expressão vem acompanhada de uma dose de ironia por seu adversário ser bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus.

No auge de sua popularidade, em 2016, quando o Rio sediou a Olimpíada, Paes não conseguiu emplacar seu fiel escudeiro, Pedro Paulo (hoje no DEM, na época no MDB), para a sucessão.

Em 2018, mais um baque: depois de liderar quase toda a corrida eleitoral para o governo do Rio, Paes foi superado pelo até então desconhecido Wilson Witzel (PSC).

Por isso, o retorno à prefeitura mostra que o político ainda tem fôlego nas urnas.

Paes tem hoje a imagem mais associada ao subúrbio de Madureira, na zona norte, do que ao Jardim Botânico ou a São Conrado, bairros da zona sul onde nasceu, foi criado e mora.

Por alguns anos, o político que hoje surfa no estereótipo de "sambista carioca" carregou a pecha de "mauricinho", como foi definido em debates eleitorais, pelo fato de ter iniciado sua trajetória política como subprefeito da Barra da Tijuca entre 1993 e 1996.

À época no PFL (atual DEM), ele chegou ao cargo sob a batuta do ex-prefeito e vereador reeleito Cesar Maia (DEM). O sucesso na administração regional o fez ser eleito vereador.

Dois anos depois, em 1998, Paes se elegeu deputado federal pela primeira vez. Menos de um ano depois, em 1999, trocou de partido e foi para o PTB, onde permaneceu até 2001. Essa foi a primeira de uma série de migrações partidárias. No mesmo ano, ele voltou para o PFL e se tornou secretário de Meio Ambiente do segundo mandato de Cesar Maia.

A nova aliança duraria pouco tempo: após romper com Maia, Paes foi para o PSDB, partido pelo qual concorreu pela primeira vez ao governo do estado, em 2002. Na ocasião, perdeu para Sérgio Cabral, que lhe ofereceu a Secretaria de Esportes e Lazer por apoio no 2º turno. O novo cargo o fez migrar para o antigo PMDB.

A essa altura, ele cumpria o segundo mandato como deputado federal. Em 2008, Paes foi eleito prefeito pelo PMDB e se reelegeu em 2012, pela mesma sigla, concorrendo contra Rodrigo Maia, que hoje o apoia ao lado do pai, Cesar Maia.

Erbs Jr./Agência Frame/Agência O Globo

Réu por caixa 2 da Odebrecht e ex-aliado de Sérgio Cabral

Paes tem na ponta da língua a resposta sobre o porquê perdeu a eleição para o ex-juiz Wilson Witzel (PSC) em 2018.

Além da onda conservadora liderada por Jair Bolsonaro —à qual o governador afastado do Rio declarou afinidade, também pesou a associação imediata de Paes à imagem de Sérgio Cabral (MDB), preso desde 2016 e condenado a mais de 300 anos de prisão por atos de corrupção.

A associação a Cabral —já em 2018, Paes trocou o MDB pelo DEM para se descolar do ex-governador— também veio à tona nesta campanha. Contudo, mais do que nunca os problemas do próprio Paes com a Justiça foram explorados por adversários.

Em setembro, Paes virou réu por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica eleitoral. O processo é um desmembramento da Lava Jato, na qual executivos da Odebrecht admitiram em delações repasse de R$ 10,8 milhões para a campanha de Paes à reeleição, em 2012.

O ex-prefeito negou a acusação e falou em tentativa de interferência no processo eleitoral.

A relação com a empreiteira rendeu, inclusive, um apelido: na planilha mantida pelo Setor de Operações Estruturadas da companhia, ele era conhecido pelo codinome "Nervosinho", pelo qual é chamado desde então por adversários políticos.

Paes também surfou na onda das obras para os Jogos Olímpicos do Rio, em 2016. Porém, diversas delas foram alvo de denúncias de corrupção, assim como a própria escolha da cidade como sede.

ANDRE MELO ANDRADE/ESTADÃO CONTEÚDO

Paes trabalha por base sólida na Câmara

Considerado um "político habilidoso nos bastidores" por aliados e adversários, Paes sabe como arregimentar apoios de partidos de centro e até a simpatia de opositores.

Nos seus dois mandatos à frente da prefeitura, Paes contou com o apoio de uma base constituída na Câmara Municipal.

A coligação a qual encabeça elegeu agora 15 dos 51 vereadores da Casa. A campanha trabalha com a perspectiva de que Paes conte com uma base sólida de 30 vereadores, o que garantiria a ele apoios em importantes votações sobre orçamento, projetos de lei e medidas administrativas.

Nos bastidores, tem quem aposte que até mesmo parte dos sete vereadores eleitos pelo Republicanos apoie o mandato de Paes.

De certo, apenas a oposição de dez vereadores: os sete eleitos pelo PSOL e os três do PT.

Câmara do Rio no governo Eduardo Paes

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As propostas de Paes para o Rio

Arte/UOL

Saúde

Recontratação de mil médicos e 5.000 profissionais de saúde no 1º ano de mandato. Também projeta reformar UPAs e Clínicas da Família até 2023, implantar clínicas de especialidades e retomar o Programa de Atendimento Domiciliar ao Idoso.

Arte/UOL

Transporte

Ar-condicionado em 80% dos ônibus até 2023. Reabertura de estações do BRT e reforço de segurança. Reintrodução de linhas de ônibus e auditoria sobre a operação das concessionárias. Instalação de ao menos mil câmeras no transporte público.

Arte/UOL

Educação

Até 2022, contratar 3.000 professores e garantir internet móvel com acesso ao ensino remoto de alunos da rede municipal. Recuperar o aprendizado após a defasagem devido à pandemia. Ensino integral para 100 mil alunos e 30 mil vagas em creches.

Arte/UOL

Pandemia

Preparar clínicas da família para a vacinação contra a covid-19. Ações voltadas à saúde mental para reduzir casos de depressão. Com fundo de crédito e redução de impostos municipais, pretende evitar o fechamento de pequenas empresas.

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