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'Feita no Paint' ou 'moderna'? BH se divide sobre voto em nova bandeira

Bandeira atual de Belo Horizonte (à esquerda) e proposta de nova bandeira (à direita) Imagem: Divulgação

Sofia Pilagallo

Colaboração para o UOL

04/10/2024 05h30

"Gera mais pertencimento e identificação."
"O voto mais importante nas eleições em BH é o NÃO à bandeira do Paint."
"Ainda sem entender como alguém pode preferir a antiga bandeira de BH."
"Bandeira mais feia da história."

No próximo domingo, os belorizontinos vão às urnas não só para para decidir quem será o prefeito e os vereadores. Eles também terão a missão de escolher se mudam ou não a bandeira da cidade.

Hoje, a bandeira de Belo Horizonte tem um fundo branco e um brasão no centro. A nova proposta é de uma bandeira com um sol em meio às cores verde e azul.

Bandeira atual da cidade de Belo Horizonte Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons
Nova proposta de bandeira para BH Imagem: Divulgação/Gabriel Figueiredo

Os comentários acima, de pessoas na rede social Bluesky, dão uma pista de que a cidade está longe de um consenso sobre o estandarte. Aliás, tem muita gente que nem sabe que existe uma nova proposta de bandeira para Belo Horizonte.

O UOL conversou com 14 pessoas, entre eleitores, vereadores e candidatos a vereador para saber o que acham da ideia.

Entre os que dizem não à troca da bandeira atual pela nova, os argumentos são que a mudança de bandeira não é uma prioridade, retira a simbologia da história mineira e é esteticamente feia.

Já quem vai votar sim à nova bandeira na urna defende que ela é mais moderna. E tem os principais elementos da atual bandeira, mas de forma mais simplificada.

Na briga da bandeira —que rola mais nas redes do que na muvuca da Praça 7— já teve campanha, fake news, fact-checking, meme e... piada: há quem defenda, de brincadeira, é claro, que a nova proposta de bandeira é bonita porque tem o azul do Cruzeiro. E quem peça seus "ajustes": "Tem que botar o escudo o Galo".

De onde veio a ideia?

Gabriel Figueiredo, idealizador da proposta da nova bandeira de Belo Horizonte Imagem: Arquivo pessoal

O novo desenho de bandeira surgiu por iniciativa do designer Gabriel Figueiredo. O projeto começou a ser desenvolvido após uma visita à exposição Gráfico Grafia, no Museu Histórico Abílio Barreto, em novembro de 2021.

Lá, uma versão antiga, diferente da atual, chamou a atenção de Figueiredo. Ele, então, entrou em contato com o museu e começou a pesquisar os modelos anteriores. Descobriu que a atual bandeira foi criada em 1995, sem consulta à população.

"O que temos hoje em dia é um brasão", afirma.

O brasão é ótimo, e vai continuar, qualquer que seja o resultado do referendo. A ideia do projeto é que os símbolos municipais (brasão e bandeira) sejam tão bem resolvidos quanto os estaduais e federais, para que a população possa usá-los na defesa de seus interesses.
Gabriel Figueiredo

O design, explica ele, se baseia no elemento central do brasão —o nascer do sol no pico Belo Horizonte— e foi adaptado para funcionar "em linguagem de bandeira".

Para Figueiredo, discutir os símbolos usados para representar a cidade não é urgente, mas essencial. Ele defende que a representação simbólica de uma cidade é uma "ferramenta importantíssima" em sua própria construção e transformação.

A Câmara Municipal aprovou, em 31 de julho de 2023, uma lei instituindo a nova bandeira (lei 11.559), mas a adesão a ela ainda depende de consulta popular, conforme prevê a Constituição Federal.

Por isso, o tema foi colocado em votação neste domingo (6), junto com a eleição municipal.

Comparação entre a bandeira atual de Belo Horizonte e a proposta a ser votada no domingo Imagem: Divulgação/Gabriel Figueiredo

'Falta de sentido'

Os argumentos não convencem uma parte da população, que não entende por que mudar isso agora.

"Tem tantas outras coisas que precisavam de um esforço para serem melhoradas. Vejo uma falta de sentido", afirma o dentista Antônio Henrique Rodrigues, de 67 anos.

"A bandeira atual contém uma simbologia significativa da história mineira, notadamente da Inconfidência. Sou contra", diz Bruno, que não quis revelar o nome completo porque conhece pessoas envolvidas no projeto e não quer se indispor.

Outros evocam a necessidade de que mais desenhos fossem feitos, de forma coletiva, para que a população pudesse decidir sobre mais de uma proposta. E falam nos custos da troca —argumento rebatido pelos idealizadores.

Entre os críticos da nova proposta de bandeira, outro aspecto mencionado é uma suposta "retirada" da serra.

Na bandeira atual, ela aparece de forma mais explícita, com curvas. Na proposta, é mais abstrata e alguns acreditam que isso seria o equivalente a compactuar com a mineração ilegal no local, uma vez que o problema seria menos lembrado pela população.

Defensores da nova bandeira dizem que ela mantém referências à serra Imagem: Divulgação/Gabriel Figueiredo

"Estão dizendo que o verde significa a serra, mas não é algo tão nítido. A partir do momento que se faz esse apagamento, a população passa a achar que aquilo não é tão importante", diz o candidato a vereador João Feijão (PT).

Argumentos estéticos também justificam o não. "Acho interessante fazer esse tipo de plebiscito, mas achei a bandeira feia e vou votar contra", afirma o estudante de engenharia Victor Machado, de 26 anos.

'Bem mais moderna'

Do outro lado, os que vão votar "sim" acreditam que o desenho sugerido contempla o céu, em azul, o sol, em amarelo, e a Serra do Curral, em verde.

"Ela [a nova bandeira] é bem mais moderna. Aquele brasão acho que ninguém conhece. Eu não reconheceria e moro aqui há mais de 40 anos", afirma a professora de inglês Doris Alessi, de 62 anos.

Belo Horizonte atualmente não tem uma bandeira. Tem um brasão estampado numa bandeira num pedaço de pano branco. Sou a favor da proposta. É jovem, bonita e contém elementos que representam nosso povo.
Rafael Otati, publicitário de 29 anos

"A nova bandeira realmente não faz alusão ao pico de Belo Horizonte [na Serra do Curral], mas, na minha avaliação, é uma questão mais simbólica. Isso não quer dizer que apoiamos a mineração", afirma o candidato a vereador Helton Junior (PSD).

Defensores da nova proposta dizem que serra não foi apagada Imagem: Divulgação/Gabriel Figueiredo

"Muita gente fala que ela [a bandeira] apaga a Serra do Curral. Na verdade, enfatiza. Mas acho que a proposta vai acabar não sendo aprovada mesmo, porque as pessoas conhecem pouco sobre o projeto e não buscam saber mais", diz a jornalista Fernanda Tiemi, de 23 anos.

Figueiredo rebate as críticas de que o novo desenho estaria promovendo um "apagamento" da Serra do Curral. Segundo ele, o projeto coloca a serra em primeiro plano, ocupando metade da bandeira.

Sobre o dinheiro para trocar as bandeiras caso a nova proposta seja aprovada, argumenta que isso ocorreria de forma gradual e representaria um custo baixo aos cofres públicos (entre R$ 10 e R$ 15 mil).

Quem tá sabendo?

Ainda que não seja oficial, a nova proposta de bandeira já virou estampa de roupas e acessórios, que são comercializados no Mercado Novo e outros pontos frequentados por jovens de Belo Horizonte. Também virou adereço do Carnaval de BH, que a cada ano atrai mais turistas.

Mas, aparentemente, o assunto ainda não está na boca do povo. Os entrevistados afirmaram que ficaram sabendo da proposta por alto e que não se aprofundaram. Um deles disse que nem tinha conhecimento sobre o referendo.

Para o candidato a vereador Alexandre Boaventura (PSD), o simbolismo envolvido nessa questão é uma discussão muito distante da maioria das pessoas, sobretudo do eleitor pobre e periférico, que precisa lidar com os problemas reais do dia a dia.

"O que eu mais ouço nas ruas é: 'Tanta coisa importante para votar, e aí o pessoal vai ficar votando em bandeira'. A população, como um todo, não se importa com isso", afirma Boaventura, que é morador da periferia de Belo Horizonte.

Não tenho como julgar um morador de baixa renda que diz que o projeto é perda de tempo. Realmente, se olhar para as necessidades e prioridades dele, é perda de tempo. Para quem tem ensino superior, uma profissão e é um pouco mais politizado, pode até ser uma questão importante. Para a galera, para o povão, não.
Alexandre Boaventura

Entre a direita, há sentimentos parecidos: a vereadora Fernanda Altoé (Novo), candidata à reeleição, que votou contra o projeto de lei, afirmou ao UOL que a pauta tem pouca relevância e que está mais preocupada com as demandas urgentes da sociedade. A opinião é consenso entre os colegas de partido.

Fake news para todo lado

Segundo Figueiredo, há muita desinformação e fake news circulando sobre a nova bandeira de ambos os lados.

Na página da "campanha" da bandeira no Instagram, há checagem de informações e desmentidos de notícias falsas: "Ninguém é obrigado a gostar da bandeira, mas dá para discordar sem falar besteira", diz um post com o título "Viaja errado não, sô".

Figueiredo explica que o projeto é uma iniciativa independente e que "o referendo está acontecendo sem nenhuma verba do fundo eleitoral" e "sem nenhum segundo do horário eleitoral gratuito".

Mesmo que a nova bandeira não seja aprovada, o designer torce para que o referendo sirva de exemplo para a sociedade e leve a população a ter outras experiências de participação direta em assuntos públicos no futuro.

Para ele, o referendo é um instrumento político que fortalece a democracia e que deveria ser adotado com mais frequência.

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