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Eleições municipais de 2020: Vitória de Covas favorece Doria? O que dizem os especialistas

Influência de Doria não deve ser encarada como uma grande vitória de um dos maiores rivais de Bolsonaro, dizem analistas - Reuters
Influência de Doria não deve ser encarada como uma grande vitória de um dos maiores rivais de Bolsonaro, dizem analistas Imagem: Reuters

Leandro Machado e André Shalders

Da BBC News Brasil em São Paulo e Brasília

30/11/2020 06h11

Neste domingo (29), o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), fez o sucessor no comando da capital do estado: Bruno Covas, também do PSDB, foi eleito com quase 60% dos votos válidos.

O resultado pode ter impacto importante na política nacional, influenciando as eleições de 2022, quando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tentará continuar no cargo.

Essa influência não deve ser encarada como uma grande vitória de João Doria, que foi o avalista de Covas e é um possível postulante na próxima disputa presidencial. O diagnóstico é de analistas e cientistas políticos ouvidos pela BBC News Brasil na noite de ontem.

Nos últimos meses, os tucanos vêm se contrapondo fortemente ao presidente — embora o atual governador de São Paulo tenha utilizado o slogan "BolsoDoria" para conquistar o voto da direita conservadora dois atrás, em 2018.

Durante a campanha, Bruno Covas evitou se associar ao governador, por causa da alta rejeição de Doria na capital paulista. Assim, para os analistas, por mais que o candidato do governador tenha se saído bem, Doria não conseguiu recuperar a popularidade alta que tinha há dois anos.

"A eleição de Covas é uma vitória importante para o PSDB porque a eleição de São Paulo tem impacto na política nacional", diz Camila Rocha, pesquisadora do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento).

"O padrão eleitoral é extremamente similar ao de eleições passadas, em que o PSDB disputava com o PT no segundo turno, o que aponta ao mesmo tempo para um desgaste do PT e uma resiliência do PSDB, mesmo em meio a uma avaliação negativa da gestão Doria, considerando que a maioria do eleitorado afirmou em pesquisas que não votaria em um candidato indicado pelo governador", disse.

Para Rafael Cortez, doutor em ciência política e sócio da Tendências Consultoria, a vitória de Covas é um legado "positivo para o potencial projeto político de Doria, ainda que não tenha sido motivado pelo apoio do eleitorado ao desempenho dele como governador."

Mas ele pondera: "A associação entre Doria e Covas resultou em constrangimentos para o prefeito. Na campanha, os adversários usaram a ligação entre os dois para criticar Covas", diz Cortez.

Para o analista, Doria está tentando reposicionar sua imagem diante do eleitorado brasileiro.

"Quando foi eleito para a prefeitura de São Paulo, em 2016, ele utilizou a imagem de um candidato que não era político, um outsider. Mas, logo depois, a população percebeu que ele era um político como os outros. Depois, Doria se associou ao bolsonarismo para ganhar o governo do Estado, mas também se distanciou desse discurso. Hoje, ele está tentando reformular sua imagem com a gestão da pandemia e de uma possível vacina desenvolvida em São Paulo", diz Cortez.

Bruno Carazza: vitória de Covas não credencia Doria para 2022

O cientista político Carlos Melo, professor do Insper, acredita que a vitória de Bruno Covas não pode ser creditada a Doria.

"O governador foi explicitamente escondido. Para mim, esse é o fato mais relevante pensando em 2022. Claro que, para ele, é muito melhor ganhar do que perder. Mas é só um pequeno favorecimento dele. João Doria foi eleito governador na onda do bolsonarismo, mas esse espírito de 2018 foi brutalmente derrotado nessas eleições, por isso que ele foi escondido", diz.

Já o cientista político Bruno Carazza concorda que o resultado das eleições municipais não é muito animador para o governador tucano — não o credencia como o nome preferencial da centro-direita para 2022.

"Se você olhar para os resultados do Brasil como um todo, no primeiro e no segundo turnos, não dá para dizer que o PSDB se sagrou como o 'o grande vencedor'. Quando você olha a distribuição nos Estados, o PSDB foi bem nos Estados de São Paulo e de Mato Grosso do Sul. Então, no país como um todo, o que a gente viu foi a continuidade de um encolhimento que vem de mais tempo", disse Carazza, que é professor do Ibmec e da Fundação Dom Cabral.

"Claro, o PSDB vai continuar sendo o partido que mais vai governar brasileiros, a nível de prefeitura. Mas isso se deve muito ao peso que São Paulo tem nessa conta", disse ele.

"Para o João Doria, isso mostra que o PSDB tem grandes dificuldades de ampliar seu poderio para além dos locais onde já está bem estabelecido, como São Paulo."

"O que se vê, por outro lado, é que partidos de centro-direita que correm na mesma raia que o PSDB se deram muito bem: DEM, PSD, PP e outros tiveram crescimento nestas eleições e com uma votação dispersa no país todo. PP e PSD se saíram muito bem no Sul e no Nordeste; e o DEM se consolidou no chamado 'cinturão da soja', no Centro Oeste e no Norte", disse o analista à BBC News Brasil.

"Sem dúvida que a centro-direita foi a grande vencedora destas eleições, mas agora começam as articulações para 2022. E a primeira batalha desta guerra é a disputa pelo comando da Câmara e do Senado. É um indicativo de como os partidos vão se arranjar", diz Carazza.