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Nunca sonhei que Osama bin Laden fosse um homem tão sem alegria, diz biógrafa do filho do terrorista

Fernanda Calgaro

Especial para o UOL Notícias<br>Em Londres

11/09/2010 07h00

Quando recebeu um e-mail no início de 2008 de uma pessoa se identificando como Omar bin Laden, filho de Osama bin Laden, a escritora americana Jean Sasson ficou intrigada. Filho do terrorista responsável pelos ataques de 11 de Setembro, ele queria contar a sua história ao lado do pai.

A reação da escritora não foi positiva e ela se recusou a escrever o livro. A mãe dele, Najwa, primeira mulher de Osama, enviou à escritora uma carta fazendo um apelo. Jean disse que aceitaria com a condição de que Najwa também falasse. "Honestamente, achei que ela fosse dizer não."

Foram 16 meses de muitas conversas, e-mails e faxes. O resultado está no livro "Sob a Sombra do Terror" (editora BestSeller, R$ 34,90, 432 páginas), lançado no Brasil há algumas semanas. Ao UOL Notícias, Jean disse considerar Omar como um fiho e que se falam quase diariamente. Confira a entrevista a seguir.

UOL Notícias: No livro, a sra. diz que a sua reação inicial à ideia de escrever um livro sobre o filho de Osama bin Laden não foi positiva. O que a fez mudar de ideia? Chegou a receber críticas sobre a sua decisão?

Jean Sasson: Depois de conversar com Omar diariamente, fazer perguntas e ouvir as respostas, percebi que Omar era um jovem com qualidades admiráveis. Eu ainda achava que não era a pessoa adequada para escrever a história dele porque sou conhecida pelos meus esforços de abordar a condição da mulher a partir da vida de mulheres extraordinárias.

Quando eu recusei escrever a história de Omar, recebi uma carta inesperada da mãe dele, Najwa, falando sobre o filho sensível que ela tinha. Depois de ler a carta de Najwa, eu disse a Omar que se a mãe dele aceitasse participar do livro eu escreveria a história da vida deles. Honestamente, achei que ela fosse dizer não, mas, para minha surpresa, ela disse sim... Portanto, eu segui adiante com o projeto.

UOL Notícias: Como vê o fato de Omar bin Laden ter pedido a uma mulher americana que escrevesse sobre a história dele?

Jean Sasson: De verdade, eu nunca parei muito para pensar que sou uma americana fazendo esse trabalho, talvez porque eu tenha muitos amigos na região. Durante o período em que vivi no Oriente Médio (12 anos) e os 20 anos em que viajei por toda aquela região, descobri que árabes e muçulmanos nunca me julgaram por ser americana ou por causa das atividades políticas do meu país.

Árabes e muçulmanos têm a qualidade mais maravilhosa que é julgar as pessoas pelas suas ações, não importa de onde quer que sejam. Eu acredito que Omar queria que eu contasse a história dele porque ele soube do livro que escrevi sobre a vida da Princesa Sultana [princesa saudita da casa real dos Al Saud] e sentiu que, se a princesa saudita havia confiado em mim, ele poderia fazer o mesmo. Eu nunca fiz essa pergunta a ele, então estou apenas especulando.

UOL Notícias: Foi feito algum tipo de exigência por parte do Omar e da mãe dele a respeito do livro?

Jean Sasson: Najwa me disse desde o começo que ela não iria discutir as ideias políticas e as ações do marido dela. Ela conta que viveu a vida pessoal com Osama e que nunca foi informada sobre as atividades políticas dele. Eu respeitei as vontades dela e não insisti nesse ponto.

UOL Notícias: Como as entrevistas foram feitas para a preparação do livro?

Jean Sasson: Entre pesquisar e escrever o livro levou cerca de 16 meses. Nesse período, trabalhei todos os dias, de 12 a 14 horas por dia, sem nenhum dia de folga. Com o Omar, eu fazia as entrevistas por telefone. Com Najwa, eu tive que usar um intérprete. Em algumas ocasiões, conversávamos pelo telefone com a ajuda do intérprete. Em outras, eu mandava as perguntas em inglês, que eram traduzidas para o árabe. As questões eram enviadas por fax para ela na Síria e de volta para mim, que depois eram traduzidas para o inglês. Somente então eu começava a escrever sobre um episódio em particular da vida dela. Depois de prontos, os capítulos eram enviados para eles revisarem.

UOL Notícias: Como a família de Omar reagiu à publicação do livro?

Jean Sasson: Como na maioria das famílias muçulmanas, eles não ficaram muito felizes porque acreditam que a vida familiar deve ser privada e mantida dentro do círculo familiar. Contudo, tiveram que aceitar porque não podiam fazer nada sobre isso uma vez que o livro estava escrito e prestes a ser publicado.

UOL Notícias: Atualmente, como é o seu relacionamento com o Omar e a mãe dele?

Jean Sasson: Sou muito próxima a Omar. Geralmente, conversamos quase todo dia pelo telefone, ou pelo menos quatro vezes por semana. Sou como uma figura maternal [a autora usa a palavra "auntie", que no livro se refere às outras mulheres de Osama] para Omar e o respeito profundamente. Ele é uma das pessoas mais adoráveis que já conheci. Ele é uma pessoa boa e nunca mente, sobre nada. Após conhecer essas qualidades de Omar, entendo por que Osama queria que ele fosse seu sucessor, mas, graças a Deus, Omar tem repulsa pela violência e nunca quis aquela vida para ele.

UOL Notícias: Depois que escreveu o livro, sua opinião sobre Osama bin Laden mudou?

Jean Sasson: Bem, minha opinião sobre ele mudou aos poucos ao longo do processo de entrevistas e ao escrever. Eu sabia que ele era um homem apaixonado pelas suas crenças, e que ele não hesitaria em atacar aqueles que considerasse inimigos. Contudo, nunca sonhei que Osama bin Laden fosse um homem tão sem alegria. A vida familiar era privada de felicidade, risadas, todas as coisas que as famílias curtem juntas. E era dessa maneira somente por causa de Osama. Ele não permitia que os seus filhos pequenos dessem risada! Quem poderia imaginar que uma pessoa assim existisse? Crianças por natureza são felizes e alegres. Acho que a pior coisa que um pai pode fazer é privar as suas crianças de alegria.

UOL Notícias: Quando conversa com Omar, sobre o que falam?

Jean Sasson: Conversamos sobre várias coisas, mas mais sobre assuntos pessoais da família dele e da vida privada dele, portanto, não estou numa posição para comentar esses temas confidenciais. Também conversamos sobre mim, sobre a minha vida, meu trabalho, a minha família aqui nos Estados Unidos. Às vezes, quando Omar liga e eu estou com meus sobrinhos e sobrinhas, ele conversa com eles também. Ele é um rapaz muito fácil de se gostar.

UOL Notícias: O Omar fala com o pai dele?

Jean Sasson: Claro que a resposta é não. A última vez que Omar falou com o pai dele foi no verão de 2001. Ele ouve falar do pai pelo noticiário, assim como todos nós.