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'Só é provocação quando desenhamos Maomé', disse diretor do 'Charlie Hebdo'

Foto de 2011 mostra o diretor da revista, Stéphane Charbonnier, conhecido como Charb - Alexander Klein/AFP
Foto de 2011 mostra o diretor da revista, Stéphane Charbonnier, conhecido como Charb Imagem: Alexander Klein/AFP

Do UOL, em São Paulo

08/01/2015 13h55

O diretor do semanário francês "Charlie Hebdo", Stéphane Charbonnier, o Charb, um dos 12 mortos no atentado terrorista ocorrido na sede da revista, em Paris, na quarta-feira (7), declarou ao jornal espanhol "El País", em setembro de 2012, que o veículo "não fez nada de extraordinário" ao publicar uma ilustração satírica com a imagem do profeta Maomé.

Na ocasião, o jornalista --que já vivia sob escolta policial-- defendeu a liberdade de imprensa e rechaçou a possibilidade de uma autocensura. "Fazemos caricaturas de todo mundo e só quando sai o Maomé é uma provocação", disse.

“Se nos fizermos a pergunta: temos direito de desenhar ou não Maomé, é perigoso ou não publicar, a questão que virá depois será se podemos representar os muçulmanos no jornal, e depois nos perguntaremos se podemos mostrar seres humanos... E no final, não publicaremos mais nada, e o punhado de extremistas que se agitam no mundo e na França terão ganhado", declarou Charb ao "El País".

Em 2012, o diretor de "Charlie Hebdo" criticou o então primeiro-ministro francês, Jean-Marc Ayrault, ao afirmar que ele "deveria defender a liberdade de imprensa e a República em vez de ficar impressionado pelos palhaços que se manifestam”. Na ocasião, o semanário recebeu críticas de setores do governo por conta das capas polêmicas.

“É a mesma provocação de todas as semanas. Tivemos 14 disputas com a extrema direita católica e só uma com o Islã. Qual é o problema na França, o Islã ou a extrema direita católica? Estamos de acordo com apelar para a calma. Se alguém tem problemas conosco, que faça o que é feito na República. Apresentem uma denúncia, vamos ao tribunal e depois jogamos a partida tranquilamente, no marco da lei", argumentou Charb.

O jornalista também ironizou o fato de que, por conta das ameaças recebidas, vivia sob escolta policial. “Se esta é a condição para se expressar livremente na França, seremos protegidos pela polícia. Prefiro ter dois agentes ao meu lado durante um tempo, assim não se dedicam a expulsar ciganos”, brincou.

Oito anos sob ameaças

Com uma linha ousada e irreverente, a "Charlie Hebdo" começou a ser publicada em 1970. Ao longo de sua história, choveram julgamentos por difamação. Os processos da igreja, de empresários, ministros ou famosos que eram alvo permanente de suas sátiras acabaram derrubando a revista em 1981. A "Charlie Hebdo" voltou a ser publicada onze anos depois, em 1992.
 
A revista era alvo constante de ameaças desde que publicou em 2006 uma série de charges de Maomé, inicialmente divulgadas pela revista dinamarquesa Jyllands-Posten, que indignaram o mundo islâmico.
 
"Havia ameaças permanentes desde a publicação das caricaturas de Maomé", declarou o advogado da revista, Richard Malka. "Vivíamos há oito anos sob ameaças, estávamos protegidos, mas não há nada que possa ser feito contra bárbaros que invadem com [armas] kalachnikovs", acrescentou o advogado. "É uma revista que apenas defendeu a liberdade de expressão, ou simplesmente a liberdade", disse.
 
A sede da publicação chegou a ser incendiada em novembro de 2011. Quando voltou às ruas, insistiu na linha editorial com uma capa em que um muçulmano e um desenhista se beijavam sob o título "O amor é mais forte que o ódio".
 
Após esse atentado, Charb e outros membros da redação viviam sob proteção policial, e sua sede era alvo de custódia pela polícia francesa.
 
Em 3 janeiro de 2013, o site da revista sofreu ataques de hackers, motivados pela publicação no dia anterior de um suplemento especial com uma biografia de Maomé em forma de história em quadrinhos.
 
A edição mais recente da publicação, lançada nesta quarta-feira, inclui na capa uma caricatura do escritor Michel Houllebecq, autor do polêmico livro "Submissão" publicado neste mesmo dia e que imagina uma França islamizada. "Em 2015 perco meus dentes, em 2023 faço o Ramadã", afirma a caricatura do escritor na capa da "Charlie Hebdo". (Com agências internacionais)

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