Como estrangeiras encontram apoio quando estão presas em cadeia em SP
A.*, 37 anos, nasceu em Portugal, mas morava no Rio de Janeiro já há alguns meses quando resolveu conhecer São Paulo ao lado do companheiro e dos dois filhos pequenos. Era um dia comum de 2014 quando a família fez uma parada e A. foi surpreendida pela polícia. "Eu vinha a passeio a São Paulo e não tinha conhecimento de que, por dentro da chapa do carro em que minha família estava, existia droga", diz.
No ano seguinte, M.*, 33 anos, chegava ao aeroporto de Guarulhos para pegar o voo de volta para sua terra natal, Cabo Verde, depois de dois meses passados em terras brasileiras. No embarque, policiais se aproximaram dela alegando que havia uma denúncia de transporte de substâncias ilícitas. "Eles começaram a mexer na minha mala, foram cortar o notebook que estava comigo e encontraram drogas lá dentro".
A. e M. passaram pela mesma Penitenciária Feminina da Capital, em São Paulo, mas não chegaram a se conhecer em meio às mais de 350 estrangeiras que, atualmente, cumprem pena no local. Histórias como as delas se repetem no Brasil e, a cada nova situação, mais estrangeiras ingressam no sistema prisional sem ao menos entenderem por completo as palavras ditas por quem dá a voz de prisão.
Passar pelas burocracias do aprisionamento pode ser complicado em seu próprio país, mas enfrentar os muros de uma penitenciária em terras estrangeiras pode ganhar graus ainda mais profundos de dificuldade.
Me lembro que, a primeira vez que eu escutei uma menina falando espanhol, comecei a chorar porque eu não entendia ninguém até então... Não sabia o que era o 'bandeco', que horas tinha água para tomar banho, não entendia nada" Rocio Montoya, espanhola de 35 anos, presa desde 2012
Foi depois de encontrar uma boliviana com quem conseguia se comunicar que Rocio soube da existência de um projeto que promovia o contato de internas vindas de fora do Brasil com grupos de visitantes que ofereciam apoio jurídico, emocional e quais outros mais fossem necessários e possíveis para tornar a vida destas imigrantes menos complicada atrás das grades.
"Eu fui convidada para uma reunião em que me pediram para preencher um formulário com informações sobre toda a minha vida... Se eu tinha filhos, era divorciada, casada, se tinha pais vivos etc. E foi assim que eu conheci o grupo", diz Martha Rosa, 34 anos, presa desde 2012.
Promovido pelo ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania), o programa Estrangeiras atua em São Paulo desde 2001. Trata-se de um projeto permanente que promove assistência a estrangeiras em situação de prisão e egressas do sistema prisional para facilitar a interação delas com equipes das unidades prisionais, defensoria pública, consulados, embaixadas etc.
"A gente também tenta prestar um serviço social por meio de facilitação de contato com a família, atendimentos jurídicos nos quais esclarecemos pontos relacionados aos processos em que elas estão inseridas, acompanhamento de problemas de saúde para facilitar os atendimentos e, quando elas saem da penitenciária, auxiliamos na busca por lugares para morar, trabalho, entre outras coisas", diz Isabela Cunha, advogada e integrante do projeto.
Se eu preciso de uma calcinha, eu peço para elas falarem com a minha mãe" A., que não tem parentes no Brasil e depende de sua mãe idosa, que mora em Portugal
O Estrangeiras chega a realizar 2.000 atendimentos individuais por ano com suas seis integrantes fixas (duas profissionais efetivas e quatro estudantes em estágio híbrido para a Defensoria Pública da União e o ITTC). As visitas acontecem, semanalmente, à Penitenciária Feminina da Capital e, mensalmente, ao Centro de Progressão Penitenciária do Butantã, ambos em São Paulo. "O projeto só existe porque nós temos um protocolo de intenções com a SAP (Secretaria de Administração Penitenciária), que permite o nosso acesso às unidades prisionais para atender estas mulheres estrangeiras", diz Isabela.
Entre mulheres ainda presas e egressas do sistema prisional, há consenso sobre a importância do programa. "Elas me ajudam a seguir em frente... O que me deixa realmente emocionada", diz Filomene Tewele, 24 anos, presa desde 2013.
"Enquanto outras estão sem saber de suas famílias, raramente conseguem fazer contato, nós conseguimos com mais frequência graças ao projeto", afirma M., 26 anos, presa desde 2014.
*Entrevistadas pediram para não terem os nomes revelados
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