Universidade da Coreia do Norte tem vaga para professor. Quer se candidatar?
A Universidade de Ciência e Tecnologia de Pyongyang (PUST, na sigla em inglês) teve dois de seus professores presos pelo regime norte-coreano nos últimos 20 dias, ambos norte-americanos. Por outro lado, em meio a este novo capítulo de tensão, a universidade na capital da Coreia do Norte chegou a anunciar que está com vagas abertas para profissionais estrangeiros.
Dirigida pelo sul-coreano James Chin-kyung Kim, que também tem cidadania norte-americana, a instituição é a única universidade privada da Coreia do Norte e, em tese, detém certa autonomia em relação ao regime de Kim Jong-un. Ela é financiada por entidades do Ocidente, que fornecem doações, e tem parceria com a chinesa Universidade de Ciência e Tecnologia de Yanbian (YUST), também dirigida por Chin-kyung.
Desde sua abertura, em 2010, a PUST abrigou então professores de vários países, como Estados Unidos, Coreia do Sul, Reino Unido, Dinamarca e Alemanha. Até segunda-feira (8), havia vagas abertas para professores de Ciências da Vida e Agricultura, Inglês e Chinês, além de assistentes administrativos, no site da entidade (https://pust.co/). No dia seguinte, na esteira da confirmação da prisão dos professores norte-americanos, o site chegou a ser retirado do ar, retornando apenas na quinta-feira.
Veja algumas requisições para quem quer trabalhar na universidade norte-coreana:
Obedecer as autoridades: Um requisito básico para todos os cargos é que o candidato aceite se 'submeter às autoridades', uma sugestão habitual no país, um dos mais repressores do mundo. Mas a instituição também diz que ele precisa estar disposto a trabalhar em equipe, ser flexível, perseverante e sensível às diferenças culturais.
Esquecer o salário: Todos os trabalhos na PUST são voluntários e, portanto, sem remuneração. É possível ter ajuda financeira caso o candidato consiga alguma bolsa de entidades ocidentais que apoiam a universidade. Os voluntários dormem no campus da faculdade, que possuem acomodações consideradas confortáveis para os padrões norte-coreanos e até internet, proibida na maior parte do país. O acesso, no entanto, é censurado e monitorado.
Falar inglês fluente: Todo a comunicação é feita na língua inglesa, para estudantes norte-coreanos que já conheçam um pouco da língua. Por isso, a fluência na língua é necessária. Dependendo do cargo, o candidato precisa conhecer outras línguas: para ser assistente administrativo, por exemplo, é necessário ser fluente também em coreano, além de inglês.
Disposição para ficar alguns anos conta a favor: Para as vagas abertas de professores de inglês e chinês, a PUST pede que os candidatos tenham disposição de ficar na faculdade por alguns anos para que a consistência seja um componente da educação no local. Mas a requisição é que os profissionais fiquem no mínimo um semestre.
"Multitarefa, flexível e paciente": Os requerimentos para a vaga de assistente administrativo não diferem muito de empresas de países ocidentais. "O candidato ideal deve ter motivação pessoal e ser um indivíduo dedicado que trabalhe bem de forma independente, mostrando disposição para aprender. Ele deve ser multitarefa e ao mesmo tempo mostrar vontade de aprender", diz a descrição da vaga
Brasileiros podem se candidatar: Não há impedimento de contratação do voluntário por nacionalidade, o que significa que as vagas estão abertas também para brasileiros. No caso dos professores, a universidade em geral pede que o candidato tenha mestrado; dependendo do cargo, um doutorado é exigido. As áreas para voluntariado são Ciências da Vida e Agricultura, Engenharia Elétrica e de Computação, Gerência Financeira Internacional, Línguas Estrangeiras, Ciências Médicas e Pesquisa, e o candidato também pode se inscrever na Conferência Internacional bienal da entidade.
Porta de abertura com o Ocidente
A concepção da PUST, originalmente imaginada como uma porta de abertura da Coreia do Norte com a Coreia do Sul e o Ocidente, é fornecer educação de qualidade internacional para estudantes norte-coreanos, que têm a experiência inédita de conviver com aspectos culturais e sócio-econômicos do resto do mundo. Segundo a PUST, esse trabalho busca colocar a Coreia do Norte em um contexto de "globalização pacífica", facilitando parcerias do país com outros mercados e solidificando sua economia.
De acordo com a própria faculdade, o status investigativo que a comunidade internacional coloca sobre o país causa "algumas dificuldades operacionais", mas não impede o trabalho, que é feito "sob os limites impostos pelas sanções internacionais". "A PUST tem uma política estrita de promover desenvolvimento educacional pacífico e intercâmbio internacional, buscando construir pontes e relações melhores", diz o texto no site da instituição.
O sul-coreano James Chin-kyung Kim, fundador da PUST, emigrou para os Estados Unidos no fim da década de 1970 e viajou constantemente a Pyongyang em busca de atingir a meta de construção da primeira universidade internacional da Coreia do Norte. Segundo um perfil do empresário escrito pela revista "Fortune" em 2009, pouco antes da abertura da PUST, Chin-kyung chegou a ser preso em 1998 pelo regime do então líder Kim Jong-il, acusado de ser um espião, enquanto participava de ações de ajuda aos norte-coreanos, atingidos por uma crise econômica que deixou muitos sofrendo de fome.
A insistência do empresário, no entanto, convenceu Kim Jong-il que a ideia da faculdade, utilizando a base da chinesa YUST, poderia render frutos para o país. Chin-kyung, evangélico, recebeu ajuda de comunidades cristãs dos Estados Unidos e de outros países do Ocidente e foi autorizado a construir o complexo em 2001. No entanto, o primeiro teste nuclear norte-coreano, em 2006, e a saúde em declínio de Kim Jong-il atrapalharam o projeto, que só foi finalizado em 2010.
A criação da universidade foi aprovada pelo governo dos Estados Unidos, então presidido por Barack Obama, segundo reportagem do "New York Times" da época que entrevistou o sul-coreano Park Chan-mo, um dos fundadores da PUST.
De acordo com Chan-mo, a instituição enviou ao Departamento de Estado dos EUA o currículo dos cursos para evitar problemas relacionados às sanções vigentes. O governo Obama pediu que o nome do curso de Biotecnologia fosse alterado, prevenindo qualquer associação da matéria ao desenvolvimento de armas biológicas. A PUST mudou o nome para Ciências da Vida e Agricultura.
Em visita ao local, em 2014, a BBC relatou que os estudantes se mostram afáveis com os cidadãos norte-americanos, apesar da hostilidade em relação ao governo dos Estados Unidos. Segundo a emissora, que foi monitorada durante todo o tempo da visita, os alunos mostram devoção a Kim Jong-un e exaltam o patriotismo típico do país. A BBC relatou que a internet não permite acesso a e-mails, redes sociais ou sites internacionais de notícia.
Hoje, a instituição conta com 500 estudantes em graduação e outros 60 pós-graduando, todos eles norte-coreanos. Alguns deles, segundo a PUST, são enviados para intercâmbio em outros países. São 200 funcionários locais e 100 voluntários estrangeiros morando no campus.
Um dia depois da prisão dos americanos Kim Hak-song e Kim Sang-duk, funcionários da PUST acusados de "atos hostis" contra o regime de Kim Jong-un, o site da instituição foi tirado do ar, lançando dúvidas sobre a continuidade do trabalho da PUST com colaboradores internacionais.
Doações de norte-americanos
O UOL questionou, via e-mail, a YUST PUST Foundation, que financia a instituição e tem sede no Estado norte-americano de Illinois. A entidade diz ter como missão "melhorar os esforços humanitários e educacionais da YUST e da PUST", além de ajudar crianças norte-coreanas, por meio de "recursos acadêmicos e financeiros, baseados no espírito cristão, da América do Norte". "Procuramos levar esses projetos para organizações norte-americanas e indivíduos que compartilhem a paixão por essa missão."
A fundação disse que não poderia conceder entrevistas ou fazer comentários no momento, mas ressaltou que os dois americanos foram presos por atividades específicas, "não relacionados ao trabalho na PUST ou a outros moradores do campus". "Entendemos que o ensino e a vida no campus continuam normais."
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