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Quem é Salahuddin, que os EUA dizem ser terrorista do nível do Estado Islâmico?

Líder do grupo Hizbul Mujahideen, Syed Salahuddin (centro), durante manifestação contra a Índia, em Islamabad, no Paquistão - Anjum Naveed/AP
Líder do grupo Hizbul Mujahideen, Syed Salahuddin (centro), durante manifestação contra a Índia, em Islamabad, no Paquistão Imagem: Anjum Naveed/AP

Do UOL, em São Paulo

27/06/2017 14h19

Os EUA agora consideram Syed Salahuddin, também conhecido como Mohammad Yusuf Shah, um "terrorista global especialmente qualificado", informou o Departamento de Estado em um comunicado na segunda-feira (26). Nessa classificação de "terrorista global" estão o Estado Islâmico, o Boko Haram e Hamza Bin Laden, o filho de Osama bin Laden.

Isso significa que, para o governo americano, Salahuddin ameaça a segurança nacional ou a segurança dos cidadãos americanos.

Horas antes de os EUA classificarem o líder rebelde da Caxemira, Syed Salahuddin, como um terrorista global, ele apareceu em um vídeo convocando greves no território do Himalaia em memória a outro líder rebelde cujo assassinato pelas forças indianas gerou meses de protestos seguidos de mortes.

O anúncio na segunda-feira do Departamento de Estado dos EUA coincidiu com a visita oficial do primeiro-ministro indiano Narendra Modi em Washington. Ele afirmou na ocasião que Salahuddin "cometeu, ou representa uma possibilidade de cometer, atos de terrorismo".

Para os inúmeros seguidores de Salahuddin na Caxemira, ele é visto como um herói e sua causa de retirar a Índia da região de maioria muçulmana é justa.

Salahuddin tem o apoio no lado paquistanês de um território dividido, onde ele lidera o maior grupo rebelde da Caxemira que está lutando contra um regime indiano em uma fronteira fortemente militarizada. O grupo Hizbul Mujahideen disse que o controle da Índia sobre um pedaço da Caxemira deveria ser feito pelo Paquistão, reunindo os dois lados de um território que existia anteriormente à Índia e Paquistão e que ganhou independência em 1947.

Manifestantes protestam contra a decisão dos EUA de classificarem Syed Salahuddin como um terrorista - M.D. Mughal/AP - M.D. Mughal/AP
Manifestantes protestam contra a decisão dos EUA de classificarem Syed Salahuddin como um terrorista
Imagem: M.D. Mughal/AP

Uma disputa fermentada

O status da Caxemira tem sido chave de disputa entre Índia e Paquistão desde que os dois países se separaram após o fim do controle colonial britânico. Hoje, cada um controla uma parte da Caxemira e a disputa pelo território já causou duas guerras. Inicialmente o movimento anti-Índia na área controlada pela Índia na Caxemira era pacífico, mas após uma série de erros políticos, promessas ao vento e repressões, a Caxemira entrou em uma revolta armada em 1989.

Salahuddin é considerado uma peça fundamental para o domínio da Caxemira do ponto de vista rebelde. Ele e outros nomes ajudaram dissidentes políticos a se unirem e contestarem a disputa das eleições da assembleia indiana em manter a Caxemira. O que resultou na Frente Unida Muçulmana que se tornou em uma grande oposição contra a elite política pró-Índia, mas que perdeu as eleições em 1987.

Salahuddin correu para garantir um assento na Assembleia, e perdeu. Ele foi arrastado para fora do salão de votação e detido por meses sem acusações, o que provocou uma forte repercussão pública.

Jovens ativistas da Frente Unida Muçulmana começaram a atravessar o lado paquistanês de controle da Caxemira, onde eles foram armados e treinados pelo exército paquistanês. Os paquistaneses negam ter fornecido qualquer coisa para grupos políticos que apoiam a insurgência.

A tensão na Caxemira aumenta

Em 1989, a Caxemira estava em meio a uma grande rebelião em desenvolvimento. Vários grupos militares surgiram e mais de 20 mil rebeldes organizavam ataques sangrentos contra a segurança indiana e os políticos pró-Índia.

A Índia respondeu com uma massiva militarização nas cidades de Caxemira, sob a alegação de que estava lutando contra uma guerra patrocinada pelo Paquistão. Uma brutal campanha de contra insurgência começou e os soldados ganharam impunidade para disparar ou prender definitivamente os suspeitos.

Salahussin atravessou para o lado paquistanês em 1991 e após alguns meses retornou para o lado indiano para liderar o grupo Hizbul Mujahideen. Cinco anos depois ele voltou para o Paquistão, onde ele liderou o Conselho Unido do Jihad, um grupo que unia treze organizações rebeldes da Caxemira e que tinha ligações com o exército do Paquistão.

A rebelião permaneceu furiosa por cerca de uma década e deixou mais de 70 mil mortos. Em 2011 a militância foi em grande parte esmagada. Muito do sentimento anti-Índia é hoje expressado em ocasionais greves e protestos de rua por milhares de civis. Os protestos regularmente têm confrontos entre jovens que atiram pedras em soldados de rifles.

Na segunda-feira (26), Salahuddin convocou a população para uma semana de resistência, incluindo dois dias de greves. Com início em 8 de julho, o aniversário de um ano da morte de Burhan Wani, um jovem líder do Hizbul Mujahideen.

Herói ou suspeito de terrorismo?

Especialistas políticos na Caxemira ficaram surpresos com a decisão dos EUA de classificar Salahuddin como um terrorista global. O conflito na Caxemira tem sido discutido internacionalmente como uma disputa regional, longe de ameaçar a Europa, os EUA e outras nações.

O Departamento de Estado dos EUA disse que Salahuddin "prometeu bloquear qualquer resolução pacífica do conflito na Caxemira, ameaçou treinar mais suicidas e prometeu transformar o Vale da Caxemira em um cemitério para as forças indianas".

O momento da decisão também foi inesperado, uma vez que a militância diminuiu desde que os EUA começaram a pressionar o Paquistão para controlar os rebeldes em 2011. A Índia falhou em conseguir apoio popular e muitos na Caxemira ainda pedem por "azadi", ou liberdade.

"Eu não acho que essa é uma posição digna", e parece ser guiada pelos interesses econômicos e políticos dos EUA, disse o professor Noor Ahmed Baba, que ensina ciência política na Universidade Central da Caxemira. "Esse homem, não está se dirigindo contra a América e seus cidadãos. Suas atividades permanecem confinadas à Caxemira".

Ele alertou sobre o "perigo" de dividir o Paquistão, que "pode aumentar ainda mais o alinhamento do país com a China e a Rússia". Isso poderia também complicar os esforços dos EUA para reforçar as implantações de tropas no Afeganistão.

O especialista em Ásia do Sul disse, no entanto, que a designação deveria ter um "um impacto maior nos canais de televisão indianos do que na política americana" e não pode mudar muito.

"Essa é uma forma de jogar bem com Modi por sua visita e para enviar um sinal para o Paquistão sem fazer nada muito caro ou inconveniente", disse Staniland, que é professor de ciência política na Universidade de Chicago.

Outros questionaram o porquê dos EUA classificarem alguém como terrorista sendo que este não representa um perigo para o Ocidente.

"Isso é significante porque os EUA designaram outros como terroristas que poderiam afetar os interesses americanos o que Salahuddin não faz". Ele preocupa somente a Índia, disse no Twitter o jornalista Ahmed Ali Fayyaz, que conhece Salahuddin por décadas.

Na cidade natal de Salahuddin, Soibugh, as pessoas estão se perguntando como ele chamou a atenção dos EUA.

"Antes, Índia e Paquistão usariam a Caxemira para promover suas agendas. Mas agora parece que isso se tornou uma agenda mundial, onde a América está usando a Caxemira para explorar os mercados indianos", disse o residente Mohammed Akbar.

Índia felicita, Paquistão ataca

A Índia recebeu de maneira bem-vinda o anúncio do Departamento de Estado dos EUA, divulgado poucas horas antes de o primeiro-ministro Modi se encontrar com o presidente dos EUA, Donaldo Trump, em Washington.

"O que os EUA fizeram foi correto", disse o secretário de Interior da Índia, Rajiv Mehrishi, em Nova Déli.

Oficiais paquistaneses disseram que eles se sentiram traídos e alarmados, enquanto apoiadores de Salahuddin na Caxemira do Paquistão, gritaram frases anti-indianos e queimaram bandeiras da Índia.

Sardar Massod Khan, presidente do território paquistanês da Caxemira, negou que Salahuddin e o grupo Hizbul Mujahideen tivessem algo a ver com o terrorismo, dizendo que o grupo está envolvido "em uma luta pela liberdade da Caxemira ocupada".

O ministério estrangeiro paquistanês também criticou a designação dos EUA e a chamou de "completamente injustificada".

E por último o Conselho Unido do Jihad criticou a decisão dos EUA.

"Syed Salahuddin é o símbolo do movimento da Liberdade da Caxemira". "A luta pela liberdade do povo da Caxemira é um movimento legítimo", disse o porta-voz Syed Sadaquat Hussain em um comunicado.

*Com informações da AP