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A vez que a KKK encantou o presidente dos EUA em uma superprodução do cinema

Do UOL, em São Paulo

16/08/2017 15h36

Em 21 de março de 1915, o presidente democrata Woodrow Wilson esteve presente em uma sessão especial de "O Nascimento de uma Nação", dirigido por D.W. Griffith. Era a primeira vez que um filme era exibido na Casa Branca.

O presidente dos EUA se viu encantado após exibição do filme. Era uma superprodução do cinema americano em que heróis mascarados salvam a mocinha das garras dos vilões. Os heróis mascarados eram integrantes da Ku Klux Klan, que, mais de cem anos depois daquela exibição, voltam a ser centro de uma polêmica, agora com o atual presidente norte-americano, Donald Trump. Os vilões do filme eram negros interpretados por atores brancos com a pele pintada.

Após a sessão, Wilson comentou: "É como escrever a história com relâmpagos e meu único arrependimento é que tudo isso é tão verdadeiro".

Wilson, um homem branco e da elite americana da época, era um defensor da Ku Klux Klan. É dele a frase: "Os homens brancos foram despertados por um mero instinto de auto-preservação ... até que, finalmente, surgiu a grande Ku Klux Klan, um verdadeiro império do Sul, para proteger o país do Sul".

O filme "O Nascimento de uma Nação" é baseado no romance "The Clansman", de Thomas Dixon Jr, um ex-reverendo batista racista da Carolina do Norte, que tentou fazer um retrato da Ku Klux Klan. O que Griffith levou para as telas foi um retrato distorcido do Sul dos EUA depois da guerra civil e enaltecendo o Ku Klux Klan. No filme, os negros são vistos como pessoas que dominam os brancos sulistas e que assediam mulheres brancas.

Nos cinemas, o filme foi um sucesso e sufocou as vozes que tentavam protestar contra o evidente racismo da obra. Muitos espectadores viam o filme como representação realista da história.

O movimento dos direitos civis ainda era muito recente naquela época e a NAACP (National Association for the Advancement of Colored People, ou Associação Nacional para o Progresso de Pessoas de Cor) existia havia poucos anos.

Mas em Boston, um jornalista ativista da NAACP organizou um grande protesto com vários manifestantes, a maioria de negros, que defendia que o filme não era fiel à história. O jornalista foi preso na frente de um cinema que exibia o filme.

O filme, indiretamente, impulsionou a luta pelos direitos dos negros. A NAACP conseguiu dobrar o número de membros naquele ano da estreia do filme e encerrou 1915 com 10 mil integrantes. Em dez anos, já contava com 80 mil membros.

A Ku Klux Klan também se beneficiou do filme. Logo após a estreia, o grupo viu seu número de integrantes aumentar. Além disso, "O Nascimento de uma Nação" é usado até hoje como instrumento para recrutar novos membros.

Na época, "O Nascimento de uma Nação" foi um grande sucesso que poderia ser comparado ao que "Guerra nas Estrelas" ou "Avatar" representaram em tempos mais recentes.

"O Nascimento de uma Nação" é um clássico do cinema discutido e apreciado até hoje, independente de sua mensagem. O crítico Dick Lehr, autor de "The Birth of a Nation: How a Legendary Filmmaker and a Crusading Editor Reignited America's Civil War" ("O Nascimento de uma Nação: como um cineasta lendário e um editor combativo reiniciaram a guerra civil americana", em tradução livre), disse que um crítico afirmou que "a pior coisa sobre 'O Nascimento da Nação' é o quão bom ele é".