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Análise: O que a Coreia do Norte ainda deve desenvolver após teste bem-sucedido de míssil

Qual o tamanho da ameaça nuclear da Coreia do Norte?

UOL Notícias

Eric Talmadge

Da Associated Press, em Tóquio (Japão)

29/11/2017 10h59

Os especialistas podem discutir trajetórias, pesos de carga e escudos para a reentrada [do míssil na atmosfera], mas a afirmação da Coreia do Norte de que os EUA inteiros estão ao alcance de seus mísseis é cada vez mais verossímil. Eles vêm se desenvolvendo rapidamente. 

O lançamento na quarta-feira (29) do que a Coreia do Norte chamou de míssil balístico intercontinental Hwasong-15 demonstrou um alcance maior do que os outros mísseis que o país já testou, e demonstrou várias capacidades que o Norte deverá dominar se um dia realmente tentar dispará-los contra os EUA. 

Eis uma visão rápida dos avanços feitos, os desenvolvimentos que ainda virão e as implicações para os EUA e seus aliados asiáticos:

O míssil 

Segundo os anúncios feitos pela Coreia do Norte sobre o lançamento, o Hwasong-15 pode ser armado com uma "ogiva de guerra supergrande e pesada" e é capaz de atingir qualquer lugar no território continental dos EUA. A Coreia do Norte afirma que ele atingiu a altitude de 4.475 km e percorreu 950 km desde seu local de lançamento, perto de Pyongyang, a capital norte-coreana. Ele voou durante 53 minutos antes de cair no mar do Japão. 

Os dados do lançamento batem com os observados por especialistas ocidentais. O cientista americano David Wright, um físico que acompanha de perto os programas de mísseis e nuclear da Coreia do Norte, calcula que o Hwasong-15 tem um alcance estimado de mais de 13 mil km se voar em uma trajetória padrão --o que o coloca ao alcance de Washington, capital dos EUA. 

Pyongyang afirma que o míssil tem aperfeiçoamentos táticos e técnicos significativos em relação ao nº 14, testado em julho, e é o "mais poderoso" da Coreia do Norte até agora. A Agência Central de Notícias da Coreia (KCNA) também disse que Kim Jong-un "declarou com orgulho que agora finalmente realizamos a grande causa histórica de completar a força nuclear do Estado".

A afirmação repetida no anúncio de que a Coreia do Norte hoje completou o "desenvolvimento de seu sistema de armas foguetes" é nova e importante. Pode ser um blefe, mas também pode sugerir uma mudança da fase de testes --pelo menos desse tipo de míssil-- para sua produção e desenvolvimento. 

O arsenal da Coreia do Norte ainda está muito longe da qualidade e da quantidade que os EUA podem utilizar. O desenvolvimento pela Força Aérea americana do míssil balístico intercontinental Minuteman remonta ao final dos anos 1950. Hoje ela tem cerca de 400 da última versão, o Minuteman III, que também tem um alcance máximo de aproximadamente 13 mil km. 

Como ele foi lançado

O momento e a localização são importantes. Ele foi lançado na calada da noite, muito provavelmente de um lançador móvel, perto da capital. Isso indica que a Coreia do Norte está tentando mostrar que pode lançar quando e onde quiser --capacidade que torna mais difícil tomar medidas preventivas. É impossível explodir um míssil norte-coreano na plataforma de lançamento se o míssil puder ser deslocado e não houver plataforma. 

É interessante, porém, que a mídia japonesa relatou na terça-feira (28) que seu governo interceptou sinais de rádio da Coreia do Norte sugerindo um lançamento iminente. Não está claro se foi a primeira vez, já que detalhes dessas informações normalmente não são divulgadas ao público. Mas sugere que os vizinhos do Norte estão tendo algum sucesso nas iniciativas de vigilância. 

A trajetória do lançamento também é importante. O míssil foi disparado em um ângulo extremamente vertical e alcançou a altitude de mais que o dobro dos satélites em órbita baixa da Terra.

A Coreia do Norte precisa lançar na direção do Pacífico, porque senão estaria disparando seus mísseis para a Rússia ou a China --uma proposta nada recomendável. O arco elevado evita voar sobre o Japão, o que poderia levar Tóquio ou os sistemas de mísseis americanos baseados no Japão a tentar interceptá-lo, e o míssil cai no mar, e não em outros países.

Mas o ângulo aberto não se aproxima das condições reais de um lançamento. Especialistas podem avaliar grosseiramente o alcance do míssil por seu desempenho nesse arco, mas um míssil em uma trajetória de ataque voaria em um padrão mais baixo e plano, que apresenta alguns desafios diferentes, especialmente na fase crucial de reentrada da carga nuclear na atmosfera.

E agora?

A Coreia do Norte afirmou como sempre que o teste faz parte de sua estratégia geral de se defender contra a "chantagem nuclear" de Washington, e que seu desenvolvimento de mísseis e armas nucleares não representa ameaça a nenhum país, "desde que os interesses da República Democrática Popular da Coreia não sejam infringidos". 

De maneira igualmente conhecida, a medida foi imediatamente condenada em termos fortes por Tóquio e por Seul. O presidente Donald Trump disse que Washington "vai cuidar disso", mas não deu indícios de como ou o que realmente quis dizer.

Claramente, porém, o problema não vai desaparecer.

O lançamento rompeu uma calmaria de dois meses no que tinha sido um ritmo recorde de testes da Coreia do Norte. Enquanto alguns afirmavam que foi consequência da pressão dos EUA e seus aliados, é comum que o Norte reenfoque suas energias em atividades agrícolas durante a temporada de colheita e que seus militares adotem um perfil mais discreto no ciclo de treinamento de inverno.

A Coreia do Norte ainda precisa realizar novos testes de mísseis, especialmente de sistemas de mísseis lançados por submarino, para melhorar seu arsenal como um todo. Mas, tendo demonstrado agora o que afirma ser o míssil básico de que precisa para dissuadir um ataque dos EUA, Pyongyang pode se voltar para mais testes de suas armas nucleares.

Até agora, cinco de seus seis testes nucleares foram conduzidos em uma série de túneis sob o monte Mantap, um pico de granito de 2.205 metros na região nordeste do país. Mas Pyongyang sugeriu um teste atmosférico sobre o oceano Pacífico, e poderia tentá-lo. 

Essa seria uma medida muito mais provocativa do que o teste de quarta-feira e poderia provocar uma reação militar.