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Análise: Trump é a linha divisória de um país que sai das urnas ainda mais polarizado

31.out.2018 - O presidente americano, Donald Trump, fala durante um evento de campanha em Estero, na Flórida - Doug Mills/The New York Times
31.out.2018 - O presidente americano, Donald Trump, fala durante um evento de campanha em Estero, na Flórida Imagem: Doug Mills/The New York Times

Julie Pace

Da AP, em Washington (EUA)

07/11/2018 11h58

Uma nação polarizada está mais profundamente dividida hoje. Em um único dia de eleições, na terça-feira (6), os democratas tomaram o controle da Câmara de Deputados. Os republicanos mantiveram o domínio do Senado. E a brecha que divide os americanos, urbanos de rurais, brancos de negros, conservadores de liberais, se ampliou.

Os resultados da eleição de meio de mandato salientam uma separação política nos EUA que se acelerou durante a presidência de Donald Trump. Raça, classe e geografia dividem os partidos tanto quanto a ideologia, sendo o presidente a linha divisória.

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Os democratas conseguiram a nova maioria na Câmara visando assentos de distritos suburbanos mais ricos e instruídos. Os eleitores dos subúrbios se inclinaram para os democratas por uma margem de quase 10 pontos percentuais, segundo a pesquisa nacional do eleitorado AP VoteCast.

As mulheres com educação superior, em particular, ajudaram a eleger os candidatos democratas, motivadas em parte por uma profunda oposição à agenda nacionalista e à retórica de tom racista do presidente.

"Essa brecha de gênero tem aumentado ciclo após ciclo", disse Stephanie Schriock, presidente da Emily's List, grupo que apoia candidatas democratas mulheres. "Especialmente sob este governo Trump, isso vai continuar avançando."

Os democratas tomaram o controle da Câmara, mudando significativamente o equilíbrio de forças em Washington. No entanto, o forte desempenho de republicanos em algumas corridas para o Senado significa que a noite esteve longe de ser vitoriosa para os democratas.

Os ganhos democratas se limitaram à Câmara. O Senado tem outra paisagem, de um segmento do país que parece muito diferente.

Os republicanos aumentaram sua maioria no Senado com apoio da mesma coalizão de eleitores que levou Trump à Presidência dois anos atrás: brancos sem diploma superior, especialmente homens, em estados rurais, mais conservadores. Os candidatos republicanos derrotaram os senadores democratas nos estados de Dakota do Norte, Indiana e Missouri.

As vitórias republicanas pareceram reforçar a política por trás da mensagem final de Trump, uma mistura de advertência obscura e imprecisa sobre uma "invasão" de imigrantes cruzando a fronteira dos EUA. O medo motiva os republicanos, ao que parece. E poucas pessoas conseguem representar essa ansiedade como Trump.

"Ele é absolutamente o único republicano que poderia gerar o tipo de entusiasmo na base que era necessário para competir em uma eleição intermediária realmente difícil", disse Josh Holmes, antigo assessor político do líder da maioria no Senado, Mitch McConnell.

Com cada partido controlando uma câmara do Congresso, e outra eleição se aproximando depressa, essas divisões serão uma característica definidora da política americana até 2020. Cada partido hoje tem um modelo de sucesso na era Trump e passará os próximos dois anos tentando segui-lo.

Os resultados de meio de mandato encerram alguma promessa duradoura para os democratas, partido que foi banido para regiões remotas da política em 2016.

Alguns estados de inclinação democrata que escolheram Trump dois anos atrás, Michigan, Wisconsin e Pensilvânia, voltaram à esquerda na terça, elegendo democratas em importantes disputas para o Senado e governos estaduais. Isso sugere que as vitórias de Trump nos campos de batalha do meio-oeste podem ter sido uma anomalia, e não um realinhamento permanente.

6.nov.2018 - Norte-americanos votam nas eleições de meio de mandato na praia de Venice, na Califórnia, na região de Los Angeles - Mark RALSTON / AFP - Mark RALSTON / AFP
Eleitores votam na praia de Venice, na região de Los Angeles, Califórnia
Imagem: Mark RALSTON / AFP

O presidente pode se aliviar, porém, com o fato de que os republicanos saíram vitoriosos em Ohio e na Flórida, dois dos principais campos de batalha políticos. Na Flórida, o acólito de Trump, Ron DeSantis, derrotou o democrata Andrew Gillum, o jovem prefeito negro de Tallahassee que parecia destinado a ser um astro nacional do partido.

Os dados demográficos continuam sendo um problema para os republicanos em um país que segue aumentando sua diversidade. A menos que o Partido Republicano consiga reforçar seu apelo entre as minorias, assim como com os americanos mais jovens, o partido poderá simplesmente ficar sem eleitores para levar seus candidatos à vitória.

Mas o que é bom para o Partido Republicano em longo prazo não é necessariamente o foco de Trump.

O presidente passou pouco tempo durante este ano eleitoral tentando conquistar seus críticos ou trazer eleitores de nível educacional superior de volta às fileiras republicanas. Ele dobrou a aposta nas questões que o ajudaram a vencer em 2016, particularmente as políticas linha-dura de imigração.

Mas essas mesmas manobras políticas custaram caro aos republicanos na Câmara, cuja luta pelo controle se desenrolou em distritos suburbanos mais moderados onde Trump perdeu em 2016. Uma economia forte e um plano fiscal favorável às empresas, que os republicanos acreditavam que atrairiam os eleitores mais ricos e educados nessas áreas, foram obscurecidos pela virulência do presidente.

Hoje Trump enfrenta uma opção enquanto mergulha em sua própria campanha à reeleição. Ele pode moderar suas políticas e suas táticas e tentar atrair os eleitores que abandonaram o Partido Republicano neste ano. Ou pode concluir que a mesma coalizão de eleitores que o levou à Casa Branca dois anos atrás aparecerá em número suficiente quando seu nome estiver nas cédulas.