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Sogra resgatada: Em 7º dia de medo, Tetiana e brasileiros chegam a Portugal

Tetiana Sukhoparova, 52, chegou a Portugal depois de quase 7 dias tentando deixar a Ucrânia - Arquivo pessoal
Tetiana Sukhoparova, 52, chegou a Portugal depois de quase 7 dias tentando deixar a Ucrânia Imagem: Arquivo pessoal

Maurício Businari

Colaboração para o UOL

01/03/2022 21h49Atualizada em 01/03/2022 21h58

A saga de Tetiana Sukhoparova, 52, e do jogador de futebol Lucas Rangel e outros cinco colegas de profissão, está chegando ao desfecho. Eles zarparam de um aeroporto na Polônia na manhã de hoje (1º) e chegaram a Portugal por volta das 15h (horário de Brasília), após fugirem da Ucrânia, invadida por forças russas há umas semana, graças a um plano de resgate iniciado pelo influencer do ramo do turismo Anderson Dias, genro de Tetiana, e do especialista em imigração global Leonardo Freitas.

Além de Tetiana e Lucas Rangel, desembarcaram no Aeroporto Francisco Sá Carneiro, na cidade do Porto, os jogadores Derek Freitas, Lucas Gonçalves, Fábio Alexander de Almeida, Mairson Conceição Oliveira e João William Alves Jesus. Outros brasileiros e uma família de ucranianos, que também seriam resgatados com o grupo, não conseguiram chegar ao aeroporto.Os jogadores passarão a noite em um hotel e embarcam para o Brasil na manhã desta quarta-feira (2).

'Me senti como num filme', diz Tetiana

Em depoimento exclusivo ao UOL, traduzido do russo por Valeria Fomina, diretora do Instituto Rússia-Brasil, Tetiana Sukhoparova contou que foi muito difícil tomar a decisão de deixar sua casa e o seu país para fugir da guerra.

"Você vive sua vida tranquila e de repente começa a guerra e você tem que abandonar tudo e sair correndo. Eu tive que deixar meu gatinho e meu namorado, pois nenhum homem consegue sair da Ucrânia agora", diz, referindo-se a uma decisão do governo de impedir que ucranianos de 18 a 60 anos deixem o país.

Ela declarou que, enquanto seguia pela estrada em direção à fronteira, sentiu muito medo. "Era como estar dentro de um filme. Não entendia o que estava acontecendo comigo. Parecia que fazia tudo que precisava igual um robô. Era muito difícil pensar e analisar o que estava acontecendo".

Na opinião de Tetiana, o momento mais difícil da viagem foi quando estavam próximos à fronteira e lá foram informados por soldados ucranianos que ninguém podia mais seguir de carro.

Tivemos que pegar nossas coisas, sair e andar por muitos quilômetros a pé. Quando chegamos na fronteira, era uma bagunça, tinha um monte de gente, não sabíamos qual fila pegar. Pelo menos o governo deu comida e lenha para fazermos uma fogueira, porque estava muito frio. Mas quando a lenha acabou, à 1 hora da manhã, começamos a ficar com muito frio, tremendo e sem saber o que fazer. Esse foi o momento mais difícil.
Tetiana Sukhoparova

Feliz por ter atravessado a fronteira com a Polônia, na manhã de ontem, e mais feliz ainda por ter chegado hoje em Portugal, Tetiana diz que não vê a hora de poder dormir numa cama de verdade.

"Nesse momento, já estou tranquila, mas ainda preocupada com as pessoas que não conseguiram sair e que não podem dormir tranquilamente, tendo que se esconder nos porões e estações de metrô. Isso é terrível. Minha única esperança é de que essa guerra vai parar e poderei, enfim, retornar para casa".

Angústia e espera

Tetiana foi recebida no aeroporto pelos pais de Anderson, que moram na cidade do Porto, e ficará hospedada na casa deles até que a papelada necessária para seu embarque para Nova York (EUA), onde mora a filha, Alesya, fique pronta.

"Acompanhar a fuga da mãe da Alesya foi muito angustiante, a gente ficava muito, mas muito preocupada com ela", contou ao UOL a empresária Maria Dias do Vale, 55, mãe de Anderson. "Quando eu via as imagens da guerra na TV, dava uma dor no coração; parecia que essa mulher nunca ia chegar aqui, perto da gente".

Orgulhosa da atitude do filho, que desde o início dos conflitos passou a pedir ajuda por meio das redes sociais e a mobilizar pessoas e organizações interessadas em ajudar no resgate, Maria disse que o vê como um "verdadeiro guerreiro".

"Quando ele entra numa batalha, ele ganha ou perde. Só que todas ele está vencendo. Ele é muito forte. Fico preocupada com ele, que ele tenha um treco no coração, mas no fim dá tudo certo. Quanto a quem ficou, quem não pôde ainda escapar, eu digo que tenha fé. Você, que está aí do outro lado do mundo, tenha fé, porque na última hora Deus chega com o socorro".

Operação durou quase 7 dias

A operação de resgate de Tetiana e do grupo de jogadores brasileiros da Ucrânia começou há uma semana, logo após o início dos conflitos gerados pela invasão russa. Tetiana é mãe de Alesya Sukhoparova, 28, namorada do influencer Anderson Dias. Graças à ajuda de Anderson, que está passando uma temporada com ela nos EUA, conseguiu a façanha de coordenar a saída da mãe durante a invasão russa.

A primeira etapa da operação teve início na última quinta-feira (24), quando o jogador de futebol Lucas Rangel e alguns colegas de profissão foram buscar Tetiana na cidade de Kremenchuk, região central da Ucrânia. Os jogadores haviam aderido à "operação de resgate" divulgada pelas redes sociais.

elaborada pelo influencer Anderson Dias e Leonardo Freitas, CEO da Hayman-Woodward, escritório de advocacia imigratória global, com sede em Washington (EUA).

O avião de pequeno porte que trouxe os refugiados da Polônia até Portugal pertence ao escritório de advocacia Hayman-Woodward, especializado em advocacia imigratória global e foi disponibilizado após o CEO da empresa, Leonardo Freitas, decidir também aderir à ação. Os custos da operação foram estimados em mais de 200 mil euros (cerca de R$ 1,5 milhão) — só para abastecer a aeronave, foram investidos 25 mil euros (R$ 144,6 mil).

"Por conta das restrições de espaço aéreo por causa da guerra, tivemos que obter uma série de autorizações especiais", explica Freitas. Desde o pouso na Polônia, que teve que ser realizado no aeroporto de Katoweice, a 30 minutos da cidade de Cracóvia, até o pouso no aeroporto da cidade do Porto, em Portugal".

Para Freitas, que desde o dia 22 tem dormido apenas três horas por noite, os momentos mais críticos da operação foram aqueles vividos por Tetiana e os jogadores antes de atravessar a fronteira com a Polônia. Além das muitas horas de viagem, com estradas congestionadas e tomadas por soldados, veículos militares e tanques de guerra, o grupo ainda teve que abandonar os carros e caminhar por quase 3 horas sob um frio de -11?°C.

"É preciso registrar que o jogador Lucas Rangel foi um verdadeiro herói. Sem qualquer ajuda da embaixada brasileira, ele conseguiu dar todo o suporte à operação, acompanhando e cuidando da Tetiana como um guardião. Se não fosse por ele, ela não teria conseguido".