Com Trump, próximo G20 deve ter dificuldades para alcançar consenso

O consenso obtido pelo Brasil na reunião do G20 de 2024 deve ser difícil de ser alcançado em 2025 pela África do Sul, país que assume a presidência do grupo. A avaliação de diplomatas e de especialistas em relações internacionais é que, com Donald Trump na presidência dos Estados Unidos, as negociações em torno de um texto sem ressalvas podem ser difíceis.

O que aconteceu

Vitória de Trump às vésperas do G20 no Rio soou como alerta sobre possíveis quebras de compromissos. O presidente americano é contra o fortalecimento das instituições multilaterais, contra a taxação dos super-ricos e cético quanto ao aquecimento global. Esses são alguns pontos defendidos pelo Brasil durante o G20.

Enquanto presidente, Trump atrapalhou reuniões do G20. Nas quatro reuniões em que foi como presidente dos Estados Unidos, ele criou situações que dificultaram o diálogo do grupo e terminaram sem consenso.

Trump se diz "antiglobalista". O termo é usado por alguns líderes para criticar organizações multilaterais e a ordem global definida após a Segunda Guerra Mundial. Para eles, a globalização destrói a característica nacional do país e limita a ação do Estado.

A extrema direita, de forma geral, costuma ser muito refratária ao multilateralismo porque ele pressupõe a tomada de decisões coletivas, nas quais, muitas vezes, os países precisam assumir compromissos e abrir mão de determinadas coisas.Marianna Albuquerque, professora do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da UFRJ (IRID-UFRJ)

Argentina foi "prévia" de EUA no G20. A postura do presidente argentino Javier Milei, que criou dissensos ao longo das reuniões do grupo, foi vista como uma espécie de "prévia" de como serão os trabalhos do grupo ao longo do próximo ano. Milei travou as negociações em três pontos ao longo das discussões: questões de gênero, taxação de super-ricos e Agenda 2030 da ONU — uma espécie de guia para a comunidade internacional com metas para o desenvolvimento sustentável.

A vitória de Trump nas eleições presidenciais deu energia para o Milei na agenda global. Ele sente que não está sozinho, e, longe disso: que vai ter um aliado, alguém com quem pode contar.Maurício Santoro, cientista político e colaborador do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha do Brasil

Trump, assim como Milei, se diz conservador e apoia pautas que vão na contramão das de Lula. "Muito do que o Lula está propondo no G20 é uma agenda progressista: combate à fome e aumentar impostos dos mais ricos", diz Santoro.

Financiamento do clima sob risco

G20 trata da necessidade de mais financiamento do clima, mas Milei e Trump podem atrapalhar. O documento do G20 deste ano trata de forma genérica a necessidade de financiamento para iniciativas que combatam o aquecimento global. O G20 não estipula valores nem prazos.

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Pagamentos para questões climáticas podem ser suspensos por Trump. Os acordos de financiamento para mitigar catástrofes climáticas envolvem pagamentos ao longo de meses e anos. O risco, segundo Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, é que Trump suspenda as verbas destinadas a esses temas, seja em negociações fechadas no G20 ou em outros fóruns. Ele cita como exemplo o financiamento do Fundo Amazônia: os EUA se comprometeram com o Brasil a destinar US$ 500 milhões para a floresta, dos quais pagaram 10% até agora. Para ele, existe o risco de que o fluxo de remessa seja interrompido.

Agenda de Trump é a favor de mais uso de combustível fóssil. Astrini diz que o segundo principal ponto de debate sobre o clima é justamente a redução do uso desse tipo de combustível, como petróleo, e que Trump defende maior exploração e comércio do produto.

G20 em 2026 vai ser nos EUA. O Brasil vai passar a presidência do G20 para a África do Sul. Em 2026, a presidência é dos Estados Unidos.

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