'Agressivo e rígido': o que influenciadores de geopolítica esperam de Trump

Donald Trump toma posse nesta segunda (20) e inicia seu segundo e último mandato como presidente dos Estados Unidos. A volta do empresário ao poder já toma conta das redes sociais e é analisada por influenciadores de política internacional que são fenômenos na internet.

Pedro Daher, por exemplo, que coleciona mais de 4 milhões de seguidores no TikTok e 240 mil no Instagram, avalia que o novo mandato deve ser "agressivo e rígido". "Ele virá com tudo, pois, além de ser seu último mandato, será um governo com maioria no Congresso — os republicanos lideram a Câmara e o Senado. Isso fará com que ele assuma uma versão 'tudo ou nada', enrijecendo as leis anti-imigração, criando projetos protecionistas e favorecendo grandes corporações."

O UOL ouviu, além de Daher, quatro influenciadores de geopolítica para entender o que pensam da nova fase de Trump comandando o governo dos Estados Unidos.

Questões bélicas

Trump assume a presidência dos Estados Unidos em um cenário marcado por situações bélicas importantes: Ucrânia e Rússia seguem em guerra, e mesmo com o anúncio de cessar-fogo temporário, o conflito entre Israel e Palestina ainda não terminou.

Estudante de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo e criadora de conteúdo, Martina Giovanetti é seguida por mais de 1 milhão de pessoas no TikTok. Ao UOL, ela diz acreditar que Trump influenciará em ambos os conflitos.

"Antes da eleição, Trump encontrou Volodymyr Zelensky [presidente da Ucrânia] e prometeu resolver a questão com a Rússia ao virar presidente. Ele de fato tem uma boa relação com o Vladimir Putin. Provavelmente, será um momento de flexibilidade para essas guerras", diz Giovanetti.

Marcelo Vitorino, especialista em marketing político e criador de conteúdo com mais de 73 mil seguidores no Instagram, faz o adendo de que essa flexibilidade pode significar uma vitória da Rússia, já que Trump deve parar de aportar dinheiro na Ucrânia.

Pedro Daher concorda: "Não faz sentido para o Trump que esse conflito continue. Ele já havia anunciado que pararia de financiar a Ucrânia. Tanto que na reta final do governo, Joe Biden intensificou o aporte a Zelensky, para que a Ucrânia tenha um respiro caso Trump realmente desista de colocar dinheiro no país".

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Em relação aos conflitos envolvendo países do Oriente Médio, como Israel x Palestina, o movimento deve ser contrário. Daher e Martina afirmam que Trump, assim como Biden, não tem interesse em resolver as tensões na região. Com a China, a situação também pode ficar menos amigável.

Na mesma medida que Trump quer tirar dinheiro de outros países, inclusive pedindo maior contribuição financeira aos membros da Otan, ele quer intensificar os conflitos no Oriente Médio. Provavelmente, vai fortalecer Israel e ter uma postura rígida com o Irã. Pedro Daher

Deportação em massa

Bandeira da campanha de Trump, a responsabilização dos imigrantes deve ser também ponto central do mandato. Segundo Martina, o discurso contra imigrantes agora dará espaço à prática: "Vamos ver uma deportação em massa nesse novo mandato".

Uma pesquisa feita pelo instituto Ipsos em parceria com o Jornal "The New York Times" revelou que 41% dos americanos acreditam que os imigrantes são um problema porque roubam empregos.

Daher diz que o republicano se apoiou em informações falsas sobre imigrantes para gerar pânico moral na sociedade. "Ele insiste que imigrantes são responsáveis por crimes, que comem pets, e isso não é verdade. As pesquisas mostram que não, mas não adianta. As pessoas compram esse discurso", afirma.

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Projeto imperialista

Trump deu declarações polêmicas como a de anexar o Canadá ao território americano, tomar para si a Groenlândia e retomar o controle do Canal do Panamá. Thiago Torres, sociólogo que coleciona 385 mil seguidores no Instagram e conhecido como "Chavoso da USP", acredita que Trump vive um "surto imperialista".

Daher concorda: "Existe uma coisa de doutrina Monroe em cima do Trump, essa coisa de América para americanos. E não falo de Estados Unidos para estadunidenses, mas de um controle de todo o continente para os Estados Unidos. Ele já falou de invadir o México para acabar com o cartel, mas a gente sabe que não é pelo cartel que ele quer fazer isso. Quer invadir o Médico porque os mexicanos nacionalizaram muitas indústrias que antes pertenciam aos EUA".

Ainda segundo Daher, vai haver agressividade em cima de países latinoamericanos e, quem for contra ele, levará sanções.

Trump vai impor o expansionismo, seja por soft power, seja por hard power. Pedro Daher

Uma das metas de Trump em relação aos países da América Latina será fazer com que Cuba volte a ser considerada aliada de terroristas — o país foi retirado da lista durante a gestão Biden.

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Seguido por 26 mil pessoas no Instagram, o cientista político Guilherme Casarões traz à tona possíveis conflitos também na Venezuela. "Trump será abertamente hostil a Nicolás Maduro, podendo, inclusive, retomar a perigosa perspectiva de uma ação militar na Venezuela", afirma.

Apoio das redes sociais

O presidente governará com barões das mídias sociais ao lado. Depois de fechar com Elon Musk, que será ostensivamente atuante neste mandato, agora Trump recebeu apoio de Mark Zuckerberg.

O dono da Meta declarou que flexibilizará o filtro do que pode ou não ser postado no Instagram e no Facebook, seguindo o passo de Musk no X. "Para a direita extrema, que se mune de notícias falsas e usa muito bem as redes sociais, não ter esse filtro é excelente", diz Martina.

Numa troca não oficial, Trump prometeu reduzir o imposto corporativo de 21% para 15%, e isso beneficia diretamente as grandes corporações. "Está claro que ele fará isso para ajudar os grandes empresários que estão financiando e apoiando seu novo mandato", completa Daher. "Mas engana-se quem pensa que essa redução também vai facilitar a vida do pequeno empreendedor. Só se beneficiará dela o grande empresário."

Respinga no Brasil?

Marcelo Vitorino acredita que toda essa guinada à direita nos Estados Unidos é um prenúncio do que virá em 2026 para o Brasil. Segundo ele, o terceiro mandato de Lula deve ser substituído pela posse de um presidente à direita.

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Thiago Torres concorda. Ele levanta, ainda, a possibilidade de Lula não chegar ao final do mandato. "Acredito que, se Trump estivesse na presidência dos EUA naquele 8 de janeiro de 2023, o golpe no Brasil teria se concretizado. Por isso, não duvido nada de que Lula não chegue até o fim do mandato", diz.

Casarões tem outro ponto de vista: apesar de bolsonaristas verem Trump como um possível articulador para anular a inelegibilidade de Jair Bolsonaro, o professor acredita que o presidente americano vai esbarrar em desígnios da Justiça brasileira. "Apesar disso, Trump poderá ser um embaraço para o Brasil. A política externa dele, da maneira como vem sendo anunciada, representará importantes desafios ao governo Lula", afirma.

Casarões explica que, ao se tratar da parte econômica, Trump já prometeu elevar tarifas sobre produtos importados de maneira indiscriminada. "Os potenciais prejuízos à indústria brasileira são enormes, já que três quartos de nossas exportações para os EUA são de manufaturas. Caso uma renovada guerra comercial com a China reduza a atividade econômica chinesa, nosso agronegócio também poderá ser afetado", diz.

Há outro risco indireto, segundo o analista, que diz respeito aos investimentos estrangeiros no Brasil. A política econômica de Trump traz um componente inflacionário que poderá levar os EUA a aumentar os juros sobre o dólar. "Isso dificultará a atração de novos recursos e a delicada gestão fiscal por parte do governo brasileiro", explica Casarões.

Guinada à direita, um fenômeno mundial

Com Trump, os cinco analistas e influenciadores convergem quando citam a perspectiva do avanço da extrema direita no mundo. A eleição de Trump abre portas para que outras lideranças cheguem ao poder.

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"Com as redes sociais aliadas, fugindo de checagem de notícias falsas, essa guinada vai se intensificar. O futuro é perigoso e arriscado", diz Thiago Torres.

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