Por que Equador anunciou tarifa de 27% sobre produtos mexicanos?

O governo do Equador anunciou uma tarifa de 27% sobre produtos do México. Na avaliação de especialistas ouvidos pelo UOL, a taxação tem fundamentos econômicos "frágeis" e se apresenta majoritariamente como uma retaliação política.

O que aconteceu

Argumento oficial é a necessidade de garantir tratamento justo às empresas equatorianas no comércio com o México. Entretanto, analistas veem a medida como uma resposta direta à crise diplomática desencadeada pelo incidente em Quito.

Medida ocorre menos de um ano após a invasão da embaixada mexicana em Quito. Em abril de 2024, o presidente do Equador, Daniel Noboa, ordenou a invasão da embaixada para capturar o ex-vice-presidente equatoriano Jorge Glas, que buscava asilo político. "Essa decisão rompeu completamente a diplomacia tradicional entre os dois países e colocou o Equador em uma posição delicada internacionalmente", afirmou Talita Dal Lago Fermanian, advogada internacionalista com doutorado em relações internacionais pela Universidade de Lisboa.

Tarifa pode ser uma tentativa de pressão política disfarçada de ajuste econômico. Segundo Flávia Carolina de Resende Fagundes, professora de relações internacionais da Faculdade da Serra Gaúcha e vice-presidente do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia, os fundamentos econômicos para essa medida são fracos, já que os dados oficiais mostram que o déficit comercial do Equador com o México não é significativo.

Apesar do saldo negativo de US$ 218 milhões entre janeiro e novembro de 2024, as exportações equatorianas para o México estavam em crescimento antes da imposição da tarifa. "O Equador pode argumentar que a medida visa equilibrar as relações comerciais, mas a verdade é que se trata de uma retaliação política clara", avaliou Fermanian. Fagundes reforça que "a medida tem um forte viés populista, lembrando a estratégia de Donald Trump de usar tarifas para angariar apoio interno em momentos políticos críticos".

A decisão ocorre em um momento de forte militarização no Equador. Noboa tem reforçado a presença militar nas fronteiras e nos portos, justificando as medidas como parte do combate ao narcotráfico. "Há uma relação entre essa militarização interna e a postura firme contra o México. Noboa quer projetar uma imagem de liderança forte", avaliou Fermanian. Segundo Fagundes, "políticos em situações internas conturbadas frequentemente criam conflitos externos para desviar o foco e fortalecer sua imagem".

Política protecionista

A decisão equatoriana se assemelha à política protecionista de Donald Trump. O presidente dos Estados Unidos usou tarifas para pressionar parceiros comerciais, como China e México, e Noboa pode estar aplicando uma estratégia semelhante. "Se essa tática funcionar, abre precedente para que outros países da América Latina adotem medidas protecionistas similares em futuras disputas", explicou Marcelo Censoni, especialista em direito tributário. Por outro lado, Fagundes alerta que "o uso desse tipo de estratégia pode 'azedar' negociações comerciais futuras, prejudicando o Equador".

O Brasil pode ser impactado direta ou indiretamente pela disputa. Censoni diz que "o Brasil tem a oportunidade de atuar como mediador dessa disputa, consolidando sua posição como um líder diplomático na América Latina". Fagundes destaca ainda que o Brasil pode ganhar espaço no mercado equatoriano e substituir fornecedores mexicanos, especialmente no setor agroindustrial e de produtos industrializados.

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No entanto, também pode haver efeitos negativos. A crise entre Equador e México pode gerar uma instabilidade na região que complique as relações comerciais brasileiras com ambos os países.

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