Grupo que escolhe novo papa tem cardeais envolvidos em escândalos de abuso
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O Colégio de Cardeais, composto por religiosos que conduzem a Igreja Católica e votam, dentre eles mesmos, no próximo papa, tem entre seus membros acusados por abuso sexual ou negligência durante investigações de casos deste tipo. Reveja casos proeminentes:
Jean-Pierre Ricard

Arcebispo Emérito de Bordeaux, na França, não é mais um cardeal eleitor por ter mais de 80 anos. Tecnicamente, no entanto, ainda poderia ser eleito papa.
O próprio religioso confessou, em novembro de 2022, ter abusado de uma garota de 14 anos. "35 anos atrás, quando eu era pároco, comportei-me de uma maneira repreensível com uma garota jovem de 14 anos. Meu comportamento levou inevitavelmente a graves e duradouras consequências para esta pessoa", admitiu em comunicado.
Desde então, ele renunciou às suas funções públicas e afirmou que conversou com sua vítima a respeito do abuso. "Eu renovo aqui meu pedido de perdão e também peço à família inteira dela por perdão", disse Ricard.
Vincent Nichols

O Arcebispo de Westminster, na Inglaterra, é cardeal eleitor até novembro de 2025, quando completa 80 anos. Além disso, ele também pode se escolhido papa.
Nichols admitiu em 2019 que "falhou" com uma mulher que relatou um abuso em sua arquidiocese. Ela teria denunciado que foi abusada por um membro da Ordem dos Servitas e ele não respondeu aos emails dela.
O arcebispo confessou que seu comportamento efetivamente "calou" a vítima, segundo a agência de notícias católica CNA. A mulher não buscava compensação financeira, segundo o processo, mas queria que sua queixa fosse reconhecida pela arquidiocese.
Juan Luis Cipriani

Arcebispo Emérito de Lima, no Peru, Cipriani não é mais um cardeal eleitor, mas segue no colégio. Membro da Opus Dei, organização da Igreja composta por leigos e religiosos dedicados à evangelização, foi acusado de abuso sexual na década de 1980 e de ter sido omisso em relação a denúncias contra outros religiosos de sua diocese. Em carta escrita ao jornal El País, ele chamou as acusações de "totalmente falsas".
Cipriani renunciou às suas funções em 2019, um mês depois de ter atingido a idade mínima para a "aposentadoria" de bispos. Isso ocorreu após ele ter recebido uma série de sanções da Congregação da Doutrina da Fé, órgão do Vaticano que processa os casos de abuso sexual dentro da Igreja. Estas sanções limitavam o seu ministério religioso. Além disso, a Igreja pediu que ele tivesse residência fixa fora do Peru.
O cardeal hoje vive entre Madri e Roma e declarou à publicação que manteve até agora o silêncio pedido pelo Vaticano, mas garantiu não ser culpado. Nos últimos anos, o Papa Francisco dissolveu o movimento Sodalitium Christianae Vitae, envolvido em diversos escândalos de abuso no Peru na época em que Cipriani comandava a Igreja no país. Segundo o arcebispo, o Francisco permitiu em 2020 que ele retomasse pregações em retiros espirituais e administrasse sacramentos.
Philippe Barbarin

O Arcebispo Emérito de Lyon, na França, segue como cardeal eleitor até 2030. Em 2019, ele chegou a ser condenado pela Justiça da França a seis meses de prisão por omissão diante dos abusos sexuais contra menores de 15 anos de idade por parte do padre Bernard Preynat.
As vítimas denunciaram não só o padre, mas o arcebispo à Justiça em 2015 por ter conhecimento dos casos desde, pelo menos, 2010. Barbarin afirmou que só tomou conhecimento em 2014, após conversar com uma vítima.
O processo ainda cabia recurso, mas Barbarin resolveu renunciar de sua posição na Igreja, mas o papa Francisco não aceitou. O pontífice alegou a presunção de inocência, já que os trâmites civis ainda não tinham acabado.
Em janeiro de 2020, Barbarin foi absolvido durante o recurso. Dois meses depois, ele voltou a fazer o pedido de renúncia à Santa Sé e Francisco aceitou.
Rainer Maria Woelki

O Arcebispo de Colônia, na Alemanha, é cardeal eleitor até 2036, quando chega aos 80 anos. Ele foi investigado pela polícia alemã nos últimos anos sob suspeita de ter mentido sobre se tinha ou não conhecimento dos casos de abuso sexual por parte do clero que aconteciam em sua diocese. Às autoridades, ele garantiu que só soube em 2022, de acordo com o jornal britânico The Guardian.
Revisão de casos ocorridos 1975 e 2018, encomendada pelo próprio arcebispo, concluiu que mais de 200 abusos sexuais de crianças aconteceram em Colônia. Foram mais de 300 vítimas, a maioria menor de 14 anos. No entanto, Woelki se recusou a divulgar ao público o relatório em 2020, citando problemas com sua metodologia.
Policiais realizaram busca em quatro propriedades da Igreja ligadas à arquidiocese em busca de documentos e emails ligados aos casos em 2023. Woelki já havia pedido sua renúncia a Francisco duas vezes até ali, uma em 2021 e outra em 2022, ambas negadas. Ele segue hoje à frente da Arquidiocese.
Timothy Dolan

Arcebispo de Nova York, nos EUA, Dolan é cardeal eleitor até 2030. Em 2017, a rede de TV americana ABC obteve uma transcrição de uma teleconferência confidencial em que Kenneth Feinberg, advogado apontado pelo arcebispo para administrar o programa independente de reconciliação e compensação das vítimas de casos de abuso da diocese, afirmou que o religioso estava "preocupado" com a aprovação do Ato de Vítimas Infantis.
A legislação proposta tornaria possível pedir indenizações em casos de abuso sexual infantil, mesmo depois que os casos prescreveram criminalmente. Isto é, quando seus responsáveis não podem ser mais presos pelo crime. Este tipo de recurso poderia levar à falência diversas dioceses no estado de NY. As afirmações de Feinberg colocaram em xeque se o cardeal tinha mesmo o intuito de fazer reparações às vítimas.
Em 2007, quando era Arcebispo de Milwaukee, Dolan já havia movido US$ 57 milhões dos cofres da Igreja para um fundo fiduciário de um cemitério, com o intuito de proteger o dinheiro das indenizações devidas às vítimas de abuso sexual. Ele descreveu sua intenção em carta ao Vaticano na época, segundo o jornal The New York Times.
O americano Chris O'Leary acusa o padre LeRoy Valentine de tê-lo estuprado entre o fim dos anos 70 e início dos anos 80 — e de Dolan ter presenciado, ao menos em parte, os abusos. Na carta, publicada pela SNAP (Rede de Sobreviventes de Abusados por Padres, em inglês), em 2021, ele narra uma série de tentativas de levar o processo legal adiante, mas que teriam sido ignoradas por políticos e autoridades judiciais.
Em novembro de 2024, Dolan escreveu uma carta aos fiéis em que anunciou a demissão de 18 funcionários da arquidiocese. Os cortes de gastos teriam o intuito de pagar reparações às vítimas de abuso sexual, segundo o The New York Post. No mês anterior, ele anunciou que a arquidiocese estava processando sua seguradora para obrigá-la a cobrir os gastos de indenizações que estavam saindo dos bolsos da Igreja.
Francisco Javier Errázuriz Ossa

Arcebispo Emérito de Santiago, no Chile, Errázuriz não é mais cardeal eleitor, mas segue no colégio. Em 2019, ele foi réu em uma ação que o acusava de acobertar pelo menos 10 casos de abuso sexual infantil realizados por padres na década de 1990.
Em dezembro de 2018, o papa Francisco já havia removido o cardeal de seu grupo de conselheiros. No entanto, a razão alegada pela Santa Sé teria sido a idade avançada de alguns membros do grupo. Outro cardeal acusado de abuso, George Pell (já falecido), também foi removido junto com Errázuriz.
Apesar de oficialmente ser membro do corpo de cardeais, é improvável que a imagem de Errázuriz possa se reabilitar. Atualmente, ele tem 92 anos, o que também limita sua ação na Igreja.
"Lista dos Doze"

Ao longo dos anos, a SNAP já divulgou listas de religiosos da alta cúpula da Igreja, especialmente perto do conclave que elegeu Francisco. A organização, cuja legitimidade já foi questionada e a atuação criticada por religiosos como Dolan, tinha o intuito de expor nomes e evitar uma possível ascensão dos mais coniventes com abusos ao posto de Sumo Pontífice.
Entre os nomes citados que ainda são cardeais eleitores estão Daniel DiNardo (até 2029), Arcebispo Emérito de Galveston-Houston, e Peter Turkson (até 2028), de Gana. O africano, em especial, foi muito cotado como possível papa após a renúncia de Bento 16.
O papa Francisco aceitou a renúncia de DiNardo em janeiro; ele teria se aposentado por idade. Em 2019, ele foi acusado de ser omisso em relação a um caso de abuso que teria sido cometido pelo monsenhor Frank Rossi, seu antigo "número 2" na hierarquia da Igreja. Rossi teria se aproveitado de seu papel de confessor de uma mulher casada para manipulá-la emocionalmente e iniciar uma relação sexual com ela e pedir doações, de acordo com a agência Associated Press.

Já Turkson afirmou que abusos sexuais não são tão comuns em igrejas na África porque a cultura condena a homossexualidade. Sua declaração à Christiane Amanpour, da rede americana CNN, em 2013, gerou revolta em vítimas, grupos de defesa de direitos LGBT e desagradou até pares dentro da Igreja Católica, de acordo com os jornais da época.
Outros dez nomes foram implicados em escândalos de abusos sexuais que teriam sido acobertados. São eles os cardeais Roger Mahony, Sean O'Malley e Donald Wuerl, dos EUA; Leonardo Sandri, da Argentina; Marc Ouellet, do Canadá; Dominik Duka, da República Tcheca; Oscar Maradiaga, de Honduras; Tarcisio Bertone e Angelo Scola, da Itália; e Norberto Carrera, do México.
Todos eles não são mais eleitores. Mahony foi afastado em 2013, após documentos revelarem que pagou pelo silêncio de vítimas; O'Malley foi criticado por divulgar os nomes de 159 clérigos acusados de abuso, mas não revelar outros 91. Sandri teria oferecido apoio a um abusador, o fundador dos Legionários de Cristo Marcial Maciel, segundo a SNAP. Ouellet teria se negado a se encontrar com vítimas e, em 2023, também foi acusado de abuso em um caso ainda em andamento.
Duka alegou que apenas 10% das denúncias contra padres se provam verdadeiras. Anos depois, ele mesmo entrou na Justiça contra abusadores de dentro da Igreja. Maradiaga se recusou a colaborar com a Justiça em acusações, mas depois foi determinado que um bispo sob seu comando abusava seminaristas. Bertone culpou os abusos pela homossexualidade no clero e criticou o clamor por confessores denunciarem seus pares. Scola e Carrera minimizaram as acusações, com o mexicano dizendo que não ocorria abuso no México.
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