Papa Francisco pode virar santo? Todos são canonizados, como João Paulo 2º?
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Em 2014, o papa Francisco proclamou a santidade dos papas João 23 e João Paulo 2º. Agora, com a morte do pontífice argentino hoje aos 88 anos, ele poderia virar santo também?
A resposta, na verdade, é que só o tempo dirá. Chamar um papa de Sua Santidade pode dar a impressão de que, ao morrer, ele automaticamente vira santo, mas não é bem assim. O processo de canonização é geralmente demorado, com várias etapas.
Embora Francisco tivesse elementos em vida que indicariam uma possível santificação, somente a investigação pós-morte, caso seja pedida, concluirá se ele será proclamado santo ou não.
O que levaria papa Francisco a santo?
Jorge Mario Bergoglio tem virtudes consideradas heroicas. Para o teólogo Dayvid da Silva, professor na PUC-SP, o papado de Francisco é marcado pela misericórdia, algo relevante para a fé. "É o movimento do próprio Deus, e ele, nesses anos de pontificado, tem buscado demonstrar essa misericórdia na prática", diz.
Alguns exemplos são: tornar próximas as pessoas, principalmente aqueles colocados à margem da sociedade, como pobres, mulheres, crianças, os que sofrem com as migrações compulsórias, e suas falas firmes contra a deportação nos EUA. "O elemento fundamental está exatamente no jeito misericordioso do papa de atuar na Igreja e no mundo."
Mas nada disso garante a canonização. "Não podemos dizer com certeza que a Igreja vai realizar todo o processo, porque não há milagres comprovados, até onde sabemos, realizados ainda em vida", diz da Silva.
Como uma pessoa vira santa?
O processo de canonização é rigoroso e, na maioria dos casos, demorado. A normativa para a canonização é de 1983, decretada por João Paulo 2º. Entre os critérios, ela exige a comprovação de dois milagres para que alguém seja reconhecido oficialmente como santo. Os candidatos podem ser padres, bispos, papas ou fiéis leigos com fama de santidade.
O pedido de santificação só pode ocorrer após a morte do indicado. Qualquer pessoa, confraria, associação, diocese ou comunidade pode pedir a abertura do processo, mas é preciso nomear um postulador para reunir e organizar as evidências que comprovem a fama de santidade, se a pessoa era, de fato, virtuosa do ponto de vista religioso.
Geralmente, é alguém nomeado pelo bispo local, com equipe que o auxilia, recolhendo documentos e fazendo entrevistas, principalmente de pessoas que conviviam com o candidato à canonização.
Dayvid da Silva
Se a santidade for atestada na primeira etapa, a pessoa recebe o título de servo de Deus. Em seguida, todos os documentos são enviados para o Dicastério para as Causas dos Santos, órgão do Vaticano responsável pelo processo de canonização, que vai investigar ainda mais o provável santo.
Três requisitos são necessários para a homologação da candidatura: a fama de santidade, o exercício das virtudes cristãs e a ausência de obstáculos insuperáveis contra a canonização. Se nada contrário se apresentar à pessoa, ela recebe título de venerável. Nesse ponto, ela pode ser considerada como modelo de cristão e vivência de fé, mas do ponto de vista litúrgico, não pode ser cultuada.
Se julgarem que o caso merece seguir adiante, o processo é encaminhado a Roma com o pedido de beatificação. Dois religiosos —que juram segredo e não se conhecem entre si— são nomeados para ler todo o dossiê e darem seu parecer. Se suas conclusões forem discrepantes, um terceiro leitor é nomeado. O processo ou é arquivado ou segue adiante.
Nessa etapa, investigam-se milagres que teriam acontecido por intercessão do candidato. "A investigação é feita de maneira muito rígida, em pelo menos duas etapas: uma mais científica e outra mais teológica", diz Silva. Obras que a pessoa tenha escrito também são analisadas.
Na primeira, numa questão de cura, por exemplo, uma junta médica avalia o caso. Se os especialistas disserem ser impossível explicá-la por meios naturais ou científicos, vai para a segunda etapa, com análise de uma comissão teológica. "Havendo comprovação do primeiro milagre, a pessoa é chamada de beata. Aqui, os fiéis católicos têm autorização para cultuá-la, de forma mais local ou regional."
O último passo para a canonização é a comprovação de um segundo milagre. Os trâmites ocorrem da mesma forma que no processo de beatificação, com análise científica e teológica. Confirmado milagre, a declaração solene de canonização é feita pelo papa na Basílica de São Pedro -mas pode ocorrer em outros locais, como foi com Frei Galvão, primeiro santo brasileiro e o primeiro a ser declarado fora do Vaticano.
São diversas comissões e relatórios que podem passar de 2.000 páginas. Geralmente, há certo apelo popular logo após a morte do cristão para que ele seja declarado santo, mas o processo não começa tão cedo. "Primeiro, tem de deixar baixar as emoções para ver se não é um pedido motivado pela emoção", diz o teólogo.
*Com informações de reportagem publicada em 18/05/2019
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