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Quem é o cardeal que está peitando o Vaticano para poder votar no conclave?

O cardeal Angelo Becciu na Praça de São Pedro, no Vaticano Imagem: Tiziana FABI / AFP

Colaboração para o UOL

24/04/2025 09h32

O cardeal Angelo Becciu, que já foi condenado à prisão por um tribunal do Vaticano, agora desafia as decisões tomadas pelo papa Francisco para votar no seu sucessor.

Quem é Becciu?

Cardeal italiano tem 76 anos e chegou a ser o "número 3" do Vaticano. Ele foi ordenado padre aos 24 anos em Ozieri, na Sardenha, sua terra natal. O bispo local, Corrado Melis, é um apoiador veemente de Becciu e já escreveu uma carta em sua defesa à respectiva diocese.

Becciu também é experiente diplomata. Formado em direito canônico, ele entrou para o serviço diplomático da Santa Sé em 1984, com 12 anos de vida religiosa. Ele serviu como representante do pontífice na República Centro-Africana, no Sudão, na Nova Zelândia, na Libéria, no Reino Unido, na França e nos EUA.

Em outubro de 2001, o papa João Paulo 2º o promoveu a núncio apostólico em Angola. O cargo diplomático permanente é equivalente ao de um Embaixador e, por isso, ele tinha o mesmo status dentro da Igreja de um arcebispo. No mês seguinte, ele foi movido para São Tomé e Príncipe e, apenas duas semanas depois, recebeu sua consagração episcopal, que o transformou oficialmente em bispo.

Ele seguiu crescendo dentro do Vaticano, mesmo à distância. Em 2009, Bento 16 o tornou núncio apostólico em Cuba, posição que ocupou até 2011. Foi então que ele voltou a ser promovido, como Substituto para Assuntos Gerais da Secretaria de Estado do Vaticano, órgão que coordena as relações exteriores da Santa Sé. No mesmo ano, ele também se tornou consultor da Congregação para a Doutrina da Fé, a sucessora da Inquisição que supervisiona questões relacionadas à fé e à moral da Igreja.

Durante o papado de Francisco, em 2018, ele foi proclamado cardeal. Meses antes, ele já havia recebido o posto de prefeito da Congregação para as Causas dos Santos, que supervisiona os processos de canonização. Ele também atuava como um chefe de gabinete de Francisco. Foi então que ele se envolveu em um escândalo de corrupção que custou seus direitos de cardeal - e pode tirar sua liberdade.

Como a relação com Francisco 'azedou'?

Em 2020, Becciu se viu envolvido no centro de um escândalo de corrupção. Em 2014, o Vaticano gastou mais de 200 milhões de euros (R$ 1,29 bilhão) em uma participação de um edifício de um antigo armazém da loja de departamento Harrods em Londres, que seria convertido em apartamentos de luxo. Em 2018, segundo uma investigação da BBC News, a Secretaria de Estado do Vaticano comprou o restante da propriedade por 150 milhões de euros (R$ 969 milhões). O negócio foi assinado por Becciu.

Parte do dinheiro usado era destinada a obras de caridade. Mas ele foi pago a um fundo britânico gerido pelo financista italiano Raffaele Mincione, que intermediou a compra. Quando a Secretaria procurou posteriormente a ajuda financeira do banco do Vaticano, as movimentações levantaram suspeitas que levaram a acusações contra Becciu, Mincione e outros oito envolvidos na compra.

O cardeal também foi acusado de desviar grandes quantias para a sua diocese natal, na Sardenha. Um dos beneficiários de 125 mil euros (R$ 807,5 mil), segundo a Catholic News Agency, teria sido uma organização beneficente administrada pelo seu irmão. Há ainda uma acusação de que ele pagou cerca de 600 mil euros (R$ 3,87 milhões) a outra investigada, Cecilia Marogna, para auxiliar no processo de libertação de uma freira sequestrada em Mali.

Os desvios financeiros foram julgados por tribunais no Vaticano e no Reino Unido e ambos condenaram Becciu. O tribunal da Igreja o impôs, em 2023, uma pena de cinco anos e meio de prisão por desvios de verbas públicas, corrupção e lavagem de dinheiro, mas ele segue em liberdade porque ainda recorre da decisão. De acordo com a sentença, ele também foi permanentemente barrado de ocupar cargos públicos e deve pagar uma multa de 8.000 euros (R$ 51,7 mil).

Ainda durante a investigação, em setembro de 2020, Becciu já havia se demitido do cargo de prefeito da Congregação para as Causas dos Santos e aberto mão de seus direitos cardinalícios. Francisco aceitou a decisão e até, em 2022, chegou a convidá-lo para um consistório sobre reformas do Vaticano - o que ele usa atualmente para justificar seu reestabelecimento como eleitor do Colégio de Cardeais.

Mas, em 2023, meses antes do julgamento, Becciu tentou persuadir o papa a assinar uma declaração de que teria autorizado a compra do imóvel londrino. Francisco se recusou. Segundo a Catholic News Agency, diante da negativa, Becciu ligou para o pontífice e disse que a resposta teria sido muito formal, em estilo "judicial", que não se assemelhava a um pai espiritual.

Ele secretamente gravou a ligação com o papa, de acordo com a agência, na esperança de usar a resposta em sua defesa. Mas Francisco apenas respondeu que o enviasse anotações sobre quais seriam suas justificativas para o que ele gostaria que o papa escrevesse. Dias depois de uma nova carta de Becciu, Francisco rebateu que ele o havia compreendido mal, que não retiraria sua posição e que sentia informá-lo, mas não poderia "concordar com o seu pedido de declarar formalmente 'nada' e, portanto, 'descartar' a carta que já escrevi para você".

Agora, Becciu diz que Francisco perdeu a fé nele, mas defende sua inocência. Pouco antes da Páscoa, ele escreveu ao decano do Colégio dos Cardeais, o cardeal Giovanni Battista Re, e aos demais integrantes reforçando seus argumentos. Com a morte do papa, ele diz que Francisco nunca o excluiu, explicitamente, de um conclave.

Em 2018, o arcebispo Carlo Maria Viganò já havia acusado Becciu de saber "com detalhes" das acusações de abuso sexual de padres e seminaristas pelo cardeal Theodore McCarrick. Ele ainda teria auxiliado a orquestrar uma reunião de McCarrick com o papa Francisco em 2016. Viganò pediu que Francisco, Becciu e outros altos membros da cúpula da Igreja se afastassem de seus cargos, pois acredita que teriam acobertado o caso.

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