Brasileiros presenciam funeral do papa Francisco: 'Ele representava união'

Roma acordou cedo hoje. Eram seis e meia da manhã e o metrô já estava lotado. Andava em ritmo lento, quase antecipando os passos que seriam dados, algumas horas depois, no cortejo do funeral do papa Francisco. A multidão tomou conta das ruas, vielas e avenidas. Roma tinha se preparado para receber 200 mil pessoas, mas esse número cresceu e, ao final da missa, já batia a casa dos 250 mil, segundo a Sala de Imprensa do Vaticano.

Os fiéis caminhavam em direção à Praça São Pedro para chegar cedo e garantir o melhor lugar para acompanhar o adeus ao papa dos pobres, dizer arrivederci àquele que foi inspiração para tantas pessoas, humanizou a Igreja, recusou o luxo e deu voz e escuta aos excluídos que geralmente a sociedade não enxerga.

A praça foi se enchendo aos poucos. Como nos dias anteriores, filas se formavam para o rígido controle de raio-x. Entre os milhares de fiéis estava João, de 27 anos, vindo de Lisboa. "Francisco foi o pastor que a Igreja precisava, alguém que tentou reconciliar o povo de Deus e se entregou totalmente", disse, com a voz embargada. "Nos últimos anos, era possível notar suas fragilidades, mas, mesmo assim, ele conseguia superar tudo. A maneira como suportou suas dores foi, para a Igreja, um sinal de esperança."

João, ao centro, veio de Portugal para o Jubileu dos Adolescentes
João, ao centro, veio de Portugal para o Jubileu dos Adolescentes Imagem: Janaina Cesar

João integra um grupo de 130 pessoas, entre elas cerca de 100 adolescentes, que estavam em Roma para o Jubileu dos Adolescentes. Inicialmente, o grupo havia se organizado para acompanhar a canonização de Carlo Acutis. No entanto, com a morte do papa Francisco na última segunda-feira, decidiram permanecer na cidade para prestar a última homenagem ao pontífice.

Cinco telões foram instalados na Praça São Pedro: dois sob o pórtico, dois em cada lado da colunata e um antes da Via della Conciliazione, para possibilitar que todos assistissem à missa um pouco mais de perto.

Luciana, de 33 anos, e Paulo, de 36, de Rio Grande, em Araruama, Rio de Janeiro, estão viajando pelo país e chegaram a Roma nesta manhã, por volta das 9h30.

"Foi uma emoção enorme vivenciar esse momento, o Ano do Jubileu e o funeral do papa ao mesmo tempo", contou Luciana, visivelmente emocionada. Para o casal, Francisco representava valores fundamentais em tempos difíceis. "Ele simbolizava união e simplicidade em um mundo tão preconceituoso e desigual. Veio para mostrar que a mensagem de Jesus Cristo não é o preconceito nem a desigualdade", disse Paulo.

A italiana Laura Riccio, 48, com a filha Lucia, de 11
A italiana Laura Riccio, 48, com a filha Lucia, de 11 Imagem: Janaina Cesar
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A italiana Laura Riccio, de 48 anos, geômetra, contou que estava em Roma com a filha Lucia, de 11 anos. A viagem, segundo ela, havia sido programada há algum tempo, e por coincidência as duas se encontraram na cidade neste momento histórico.

"Viemos naturalmente à Praça São Pedro, primeiro para saudar o Papa e hoje para dar o último adeus e, sobretudo, agradecer", disse. Para Laura, o Papa Francisco representou "uma revolução e uma mudança, principalmente pela abertura às diversidades", algo que ela considera muito importante. Ela mora em Turim, no norte da Itália.

Rosafina Pigna, de 49 anos, cuidadora de Santo Domingo, República Dominicana, mora na Itália há cinco anos
Rosafina Pigna, de 49 anos, cuidadora de Santo Domingo, República Dominicana, mora na Itália há cinco anos Imagem: Janaina Cesar

Rosafina Pigna, de 49 anos, cuidadora originária de Santo Domingo e moradora de Roma há cinco anos, disse que foi até a Praça São Pedro para rezar pelo Papa Francisco. Ela afirmou que viu o Papa como "uma vitória no mundo católico conturbado de hoje", destacando que ele "optou pela paz e pela união". Rosafina acrescentou que Francisco fará muita falta e garantiu: "Não encontraremos outro como ele".

Como foi a cerimônia

Por volta das 8h20 da manhã, os cantos começaram a preencher o ar diante da Basílica de São Pedro, e os cardeais entraram no espaço. Do lado oposto, estavam os chefes de Estado e de governo. Na primeira fila, lado a lado, estavam Volodymyr Zelensky, Emmanuel Macron e Donald Trump, separados por poucos outros convidados. O presidente Lula também esteva presente.

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O Cardeal Giovanni Battista Re, decano do Colégio dos Cardeais, presidiu a celebração. Diante do altar, sobre um tapete vermelho estendido no pátio da basílica, repousava o caixão de Francisco. A cerimônia teve início com a antífona: "Concedei-lhe, Senhor, o descanso eterno, e que a luz perpétua brilhe sobre ele." Vieram leituras, orações em vários idiomas e, em seguida, a homilia. Os hinos, todos em latim.

Vestidos com paramentos vermelhos, cor dos mártires e do Espírito Santo, os concelebrantes carregavam nas roupas o símbolo do sacrifício e da esperança. Foi também de vermelho que Francisco foi vestido após sua morte.

Na homilia, o Cardeal Re falou com ternura sobre o papa: "Apesar da sua fragilidade nesta reta final e do seu sofrimento, o Papa Francisco escolheu percorrer este caminho de entrega até o último dia da sua vida terrena." O cardeal lembrou a todos o calor humano que emanava de Francisco. "Entre seus maiores gestos, estavam as incansáveis exortações em favor dos refugiados, dos deslocados, dos marginalizados."

Lembrou também que "papa Francisco levantou incessantemente sua voz implorando pela paz", disse o cardeal, citando uma das frases mais emblemáticas do pontífice: "A guerra deixa sempre o mundo pior do que estava: é sempre uma derrota dolorosa e trágica para todos."

Ao final, ecoou a súplica que o próprio papa costumava fazer: "Não vos esqueçais de rezar por mim." Mas agora era a voz do povo que se erguia em uníssono: "Querido papa Francisco, agora pedimos-vos que rezeis por nós e que, do céu, abençoeis a Igreja, abençoeis Roma, abençoeis o mundo inteiro."

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