Denúncia aponta 796 bebês enterrados sob casa; buscas podem levar dois anos

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Até pouco tempo atrás, era comum que mulheres solteiras na Irlanda fossem forçadas a esconder suas gestações da sociedade. Muitas delas procuravam os chamados "lares para mães e bebês", onde davam à luz longe dos olhos da comunidade e muitas vezes, também, dos registros oficiais.
Um desses locais, em Tuam, no condado de Galway, tornou-se símbolo desse passado sombrio. Lá, uma pesquisa revelou a morte de 796 crianças entre 1925 e 1961.
Agora, 11 anos após a descoberta, uma escavação vai começar para recuperar os restos mortais, possivelmente enterrados em uma antiga vala comum. A escavação é resultado de uma batalha liderada pela historiadora local Catherine Corless e acontece no terreno onde funcionou o Bon Secours Mother and Baby Home, uma instituição católica que abrigava mães solos à época. As informações foram publicadas pelo The Irish Times.
O que aconteceu
A pesquisa começou em 2014 e apontou a morte de 796 crianças. Catherine Corless revelou, após investigar registros oficiais, que quase 800 bebês e crianças haviam morrido na instituição religiosa — e apenas dois tinham sido enterrados oficialmente em cemitérios locais.

A escavação será realizada no local do antigo lar para mães e bebês. O terreno está localizado em Tuam, no condado de Galway, e atualmente abriga uma área de recreação. A investigação inicial, feita em 2017, já havia encontrado restos humanos em um antigo tanque de esgoto desativado.
Testes realizados nos restos indicaram que as vítimas tinham entre 35 semanas de gestação e três anos de vida. A maioria morreu entre 1925 e 1961, período de funcionamento da instituição.

A exumação será longa e complexa. Segundo Daniel MacSweeney, diretor da intervenção autorizada, a escavação deve levar cerca de dois anos. "Será uma escavação única e incrivelmente complexa", disse ao The Irish Times.
Igreja pediu desculpas e vai contribuir com indenizações. As Irmãs de Bon Secours pediram desculpas públicas em 2021 e anunciaram que vão destinar 12,97 milhões de euros (cerca de R$ 75,2 milhões) ao programa de reparações do governo para sobreviventes das instituições.
Objetivo é dar identidade e dignidade às vítimas. "Quero dar dignidade e, se possível, identidade aos 796 bebês enterrados em Tuam.", afirmou Catherine Corless ao The Irish Times.

Comunidade resiste e ataca historiadora
Catherine Corless foi atacada por moradores locais. "Me disseram que eu estava envergonhando Tuam". "Meus parentes também foram abordados, pedindo para eu parar, dizendo que era errado o que eu estava fazendo", contou Corless ao The Irish Times.
Pesquisadora foi chamada de "desgraça" por email. Recentemente, ela recebeu uma mensagem de um homem nos EUA: "Você é tão confiável quanto o Papai Noel. É uma desgraça. Espero que as freiras te processem."

Moradores se dividem entre o silêncio e o apoio. Enquanto alguns evitam comentar, outros dizem que o momento era necessário. "Já era hora", disse um homem que não quis ser identificado à reportagem do The Irish Times. "Os pobres bebês", exclamou ele. Em 2017, a pesquisadora foi premiada pela Ordem dos Advogados da Irlanda pelo seu trabalho.
Famílias esperam por justiça e reconhecimento. Anna Corrigan, ouvida pelo site irlandês, acredita que seus dois irmãos, John e William Dolan, estejam entre os mortos, disse que o início das escavações foi "muito emocionante". "Sinto que há uma luz no fim do túnel. Pelo menos agora estão sendo reconhecidos".
Instituição foi símbolo do estigma contra mães solos. "Essas crianças não importavam em vida, e não importavam na morte", resumiu Catherine Corless, explicando como o preconceito social varreu as vítimas para o esquecimento.
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