Brasileiro retido no aeroporto do Qatar: 'Alertaram que tinha bomba'

Um empresário brasileiro vive dias de medo e incerteza em Doha, no Qatar, após ter o voo de volta ao Brasil suspenso devido ao fechamento do espaço aéreo. A medida foi adotada após o Irã ser alvo de ataques perto da cidade de Isfahan no último domingo (22), ampliando a tensão militar no Oriente Médio e afetando as operações aéreas no país.

O que aconteceu

O empresário Audrey Bernardo, 40, teve o voo suspenso após o fechamento do espaço aéreo em Doha, no Qatar. Bernardo, que mora em Santos, no litoral de São Paulo, deveria voltar ao Brasil nesta semana, mas a companhia aérea adiou a viagem por tempo indeterminado.

Enquanto espera um novo voo para o Brasil, Bernardo descreve o clima de tensão vivido na cidade. O empresário santista está hospedado no apartamento de um amigo no bairro de Lusail. Ele viajou ao Qatar a passeio, com chegada no dia 17 de junho, e tinha retorno previsto para o próximo dia 28. "A gente fica apreensivo, fica com medo", disse ao UOL.

O empresário contou que presenciou cenas de tensão logo após os ataques iranianos. "Estávamos voltando do deserto, de um passeio que começou às 15h (horário local), e por volta das 18h começaram os bombardeios. A gente viu alguns árabes descendo, correndo, algumas pessoas, até mulheres chorando. Uma delas gesticulou, tentando alertar que estava tendo bomba", afirmou.

Ele relatou dificuldades para conseguir informações sobre a situação dos voos. "O aeroporto parece que abriu, depois voltou a fechar, e agora parece que voltou a abrir novamente, porque a gente chegou a ver uma ou duas aeronaves da Qatar sobrevoando", afirmou. "Mas não consigo adiantar meu voo, marcado para o dia 28. A companhia diz que estão todos lotados", relatou.

Passageiros no Aeroporto Internacional de Hamad
Passageiros no Aeroporto Internacional de Hamad Imagem: Reuters

Ataque ao Irã

O fechamento do espaço aéreo foi uma resposta ao ataque de Israel ao Irã, especificamente a alvos perto de Isfahan. No domingo (22), o Irã lançou mísseis contra alvos na região do Golfo Pérsico, atingindo bases militares e provocando reações em países próximos, como o Qatar. Esse ataque gerou reação de diversos países da região.

O governo do Qatar suspendeu temporariamente as operações aéreas como medida de segurança. Segundo relatos de passageiros, o Aeroporto Internacional de Doha ficou lotado, com voos cancelados ou remarcados.

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Bernardo descreveu o impacto emocional de vivenciar um conflito de perto. "Ao sentir isso tudo na unha, na pele mesmo, a gente percebe o quanto isso é complicado e difícil de lidar emocionalmente", disse.

Por enquanto, ele consegue se manter financeiramente com o uso do cartão de crédito e com a ajuda de amigos. O empresário afirmou que, além do suporte do amigo que o hospeda, também conta com a possibilidade de apoio de familiares no Brasil.

Ele ainda não procurou a embaixada ou o consulado brasileiro. "Estamos aguardando o que vai acontecer nessas primeiras 12 horas", afirmou.

Bernardo também disse reconhecer o privilégio de viver em um país longe de zonas de guerra. "Somos um país muito abençoado por não termos essa situação. O Qatar é um país maravilhoso, a cidade de Doha também, mas infelizmente essa questão do conflito deixa a gente muito preocupado", disse.

Temos um país muito bom, onde a gente tem os nossos conflitos internos, que são a criminalidade e tudo mais, mas fora isso a gente não precisa se preocupar com outras coisas como uma guerra.
Audrey Bernardo

Captura de tela de uma filmagem da AFPTV mostra os restos de um míssil iraniano interceptado sobre o Catar
Captura de tela de uma filmagem da AFPTV mostra os restos de um míssil iraniano interceptado sobre o Catar Imagem: AFPTV / AFP
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Direitos no exterior

Mesmo em casos de guerra, as companhias aéreas têm obrigação de prestar assistência aos passageiros. A advogada Renata Abalém, Diretora Jurídica do IDC (Instituto de Defesa do Consumidor e do Contribuinte) e membro da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/SP, explica que o fechamento do espaço aéreo por risco de conflito é considerado caso de força maior. Isso isenta as empresas de pagar indenização por atrasos ou danos morais, mas não as desobriga de oferecer suporte imediato.

Mesmo com o reconhecimento de força maior, as empresas devem garantir comunicação, alimentação e hospedagem. O fechamento do espaço aéreo não desobriga as empresas de oferecer suporte imediato aos passageiros. Segundo a advogada, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) estabelece prazos: após uma hora de espera, a companhia deve oferecer meios de comunicação; a partir de duas horas, alimentação; e, se o atraso passar de quatro horas ou houver cancelamento, hospedagem e transporte.

Passageiros com voos marcados para o Qatar ou com conexões na região também têm direito a reembolso, remarcação ou reacomodação. Mesmo sem cancelamento formal, quem desistir da viagem pode escolher entre o reembolso integral da passagem, a remarcação gratuita para outra data ou a reacomodação por outra companhia aérea.

Renata orienta os consumidores a documentar todos os contatos com a empresa, guardar comprovantes de gastos extras e formalizar as reclamações nos órgãos de defesa do consumidor. "Documente tudo: guarde bilhetes, comprovantes de despesas, prints de e-mails, protocolos, fotos e tudo que comprove os transtornos", recomenda.

A advogada recomenda cautela para quem planeja viajar ao Oriente Médio nos próximos dias. Renata Abalém chama atenção para a instabilidade política e religiosa na região, citando episódios recentes de ataques contra comunidades cristãs e monumentos religiosos. "Penso que a instabilidade se tornou não só política, mas também religiosa", afirma.

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Até o fechamento desta reportagem, o Itamaraty não havia se pronunciado sobre a situação dos brasileiros no Qatar.

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