Falhas de Romney acabam encobrindo gestão ineficiente de Obama
Imagine, por um momento, que a eleição presidencial de 2012 nos Estados Unidos realmente fosse o verdadeiro referendo que os estrategistas da campanha de Mitt Romney aparentemente esperam que ela seja. Imagine que tanto o candidato republicano desafiante quanto seu partido ficassem totalmente invisíveis durante a campanha, que a imprensa só tivesse permissão para cobrir o atual ocupante da presidência, e que, em 6 de novembro, a escolha se resumiria em votar "sim" ou "não" para o desempenho do presidente Barack Obama. Como será que as três últimas semanas afetariam o atual presidente?
O efeito desse período não seria necessariamente tão bom assim. Essas três semanas começaram com o discurso apagado de Obama durante a convenção democrata, que pareceu restringir o avanço que o restante da Convenção Nacional dos Democratas havia trabalhado para criar para ele. E o período se seguiu com mais um relatório medíocre sobre o nível de emprego nos EUA, acompanhado pelo anúncio do Federal Reserve (Fed, Banco Central norte-americano) de que fará a terceira tentativa para estimular a ainda estagnada economia por meio de compras maciças de bônus da dívida - decisão que elevou os preços das ações e a confiança dos consumidores, mas que também serviu de acusação implícita para o modo de administrar a economia do governo Obama.
Em seguida, veio uma semana de más notícias no Oriente Médio e no norte da África, durante a qual a Casa Branca - cuja política para a Líbia tem sido divulgada por meio de evasivas e de afirmações desonestas desde o início - decidiu, em vez de adotar a mesma postura da Líbia, não fazer nenhuma declaração e desmontar as teses sobre o que realmente aconteceu na embaixada norte-americana em Benghazi. Esses conflitos no mundo árabe coincidiram com o final oficial do aumento das forças norte-americanas comandadas por Obama no Afeganistão, que atraíram pouca exposição na mídia - mas que, provavelmente, mereciam mais publicidade: esse aumento foi uma das maiores apostas da política externa do presidente, e produziu poucos benefícios óbvios a um alto custo de vidas.
Finalmente, o presidente deu duas entrevistas - à Univision e ao programa "60 Minutos", da CBS -, que incluíram alguns momentos desastrados: uma estranha tentativa de se distanciar de seus próprios dados negativos, uma sugestão ainda mais estranha de que ele aprendeu, como presidente da república, que "não é possível mudar Washington a partir de dentro", além de ter adotado uma postura casual demais ao considerar desimportantes os conflitos no Oriente Médio e as mortes de norte-americanos, descritas como meros "acidentes de percurso".
Em outras palavras: havia material mais do que suficiente para contar a história de um presidente à deriva: eclipsado em casa pelo ex-presidente Bill Clinton e pelo presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke, sem saber direito como reagir às falhas estratégicas no exterior e, obviamente, sem nenhuma visão sobre o que um segundo mandato pode oferecer ao país além de uma continuação do atual e duro período de déficit avantajado e crescimento lento. ("Esse não é o momento", disse David Axelrod no programa "Morning Joe", da MSNBC, quando perguntado sobre os planos da Casa Branca para lidar com os déficits que pairam no horizonte.)
Mas, em vez disso, a história das últimas semanas só girou em torno de Romney: as lutas internas travadas em sua campanha, o enfraquecimento de seu desempenho nos Estados-chave para a eleição, suas mensagens confusas, seu desprezo por 47% dos norte-americanos, caracterizados como coadjuvantes patéticos dos melodramas de Ayn Rand.
Será que esse tipo de enfoque é apenas um caso de imprensa tendenciosa, como muitos conservadores alegaram? A resposta é sim, no sentido de que a Casa Branca tem recebido passe mais do que livre para sua política doméstica ausente e para suas inconstantes ações relacionadas à política externa.
Como Howard Fineman, do jornal Huffington Post, observou esta semana, Obama está em campanha por sua reeleição "sem ter que explicar de modo sério e substancial as promessas que não cumpriu e seus fracassos, e sem ter que dizer muito, na verdade, sobre o que ele pode fazer de diferente caso tenha a sorte de vencer as eleições novamente". E a resposta também é sim no sentido de que a cobertura da corrida eleitoral ajudou, por vezes, a ratificar o sentimento de que uma taxa de desemprego de 8% e déficits de trilhões de dólares são, atualmente, uma nova forma de normalidade pela qual o atual presidente realmente não tem muita responsabilidade.
Mas a resposta é não no sentido de que Romney poderia ter evitado quase todas as dificuldades que vem enfrentando atualmente - sendo a mídia tendenciosa ou não - se ele simplesmente utilizasse o simples expediente de apresentar uma campanha um pouco mais competente e criativa.
Mas, em vez disso, o candidato republicano parece ter pressa para provar dois pontos de vista relacionados à ciência política e à presidência. Primeiro, que todas as campanhas presidenciais são, na realidade, um referendo entre o detentor do cargo e seu desafiante e, segundo, que é inteiramente possível os eleitores rejeitarem um desafiante mesmo que eles acreditem que o atual presidente deve ser derrotado.
Nesse segundo ponto de vista, no entanto, paira a única esperança que resta para o concorrente republicano: apesar de não gostarem de Romney, os eleitores ainda estão realmente abertos à possibilidade de Obama não merecer a reeleição. É por esse motivo que 2012 ainda se parece mais com 1976 ou 2004 - quando o país quase se dividiu ao meio para decidir se o ocupante da presidência deveria ser reeleito - do que com as reeleições facílimas de Clinton, Ronald Reagan, Richard Nixon, Lyndon Johnson e Dwight Eisenhower.
Romney está atrás de Obama - mas a desvantagem é de apenas alguns pontos. Obama lidera - mas com uma aprovação e números de "reeleição" que estão apenas arranhando os necessários 50%. O país tem se inclinado na direção dos democratas - mas apenas por algumas poucas semanas.
Ainda faltam seis semanas para a eleição. Em 2004, John Kerry ganhou 4% pontos nas pesquisas entre o final de setembro e o dia da eleição. Em 2000, George W. Bush obteve uma margem semelhante no período entre as convenções e o mês de novembro. Sean Trende, da RealClearPolitics, ressalta que, desde 1968, nas corridas eleitorais que contaram com a presença do ocupante da presidência, as pesquisas mostraram um crescimento médio de 3,7 pontos do oponente entre a convenção do detentor do cargo e o dia do pleito.
Atualmente, falta quase isso para Romney alcançar Obama - ou seja, 3,8 pontos -, de acordo com a média das pesquisas realizadas pela RealClearPolitics. Romney desperdiçou quase duas temporadas de oportunidades e permitiu que suas falhas como candidato eclipsassem as falhas de seu oponente como presidente. Mas, enquanto ele se prepara para os debates - que lhe oferecerão a última boa chance de virar o jogo - ele tem um motivo para se sentir esperançoso: a tese que ele precisa defender ainda pode ser defendida.
* Ross Douthat é colunista do The New York Times.
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