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Universidades dos EUA estuda animais em campus para alunos com distúrbio

Drew Angerer/The New York Times
Imagem: Drew Angerer/The New York Times

Jan Hoffman

St. Mary's City (Maryland, EUA)

11/10/2015 06h00

Rachel Brill e Mary McCarthy são veteranas e colegas de quarto de longa data na Faculdade St. Mary, de Maryland. Este ano, elas dividiram seu apartamento de quatro quartos no campus com duas outras alunas. E além delas, com Theo e Carl.

Theo, simpático e tranquilo, é um pastor alemão amarelo, de 47 quilos e pelos longos. Carl, ativo e irresistível, é um coelho anão holandês, preto como carvão, de 680 gramas.

As regras da casa: Carl fica num cercado debaixo do beliche de McCarthy; Theo cochila numa caixa no quarto de Bril. Carl não pode ser solto na sala de estar, onde Theo gosta de ficar. "Ainda temos muito cuidado porque não queremos uma confusão com Theo e Carl", disse McCarthy. "Nós duas somos pessoas muito ansiosas."

E é exatamente por isso que Theo e Carl têm permissão para viver nas acomodações do campus.

Como muitas escolas em todo o país, a St. Mary, uma pequena faculdade de estudos interdisciplinares, está tentando acomodar os pedidos cada vez mais frequentes de alunos diagnosticados com problemas de saúde mental para ter animais. No ano passado, ela começou a permitir “animais de companhia” para alunos como Brill, proprietária de Theo, que tem ansiedade e depressão, e McCarthy, proprietária de Carl, quem tem crises de pânico.

A ansiedade, seguida de perto pela depressão, tornou-se um diagnóstico cada vez mais comum entre os estudantes universitários nos últimos anos. O efeito calmante de alguns animais domésticos ganhou aceitação, e muitas escolas contratam cães treinados para fins terapêuticos para brincar com alunos estressados durante o período de provas.

Mas, à medida que alunos diagnosticados com problemas psiquiátricos estão pedindo para morar com seus animais no campus, as escolas que têm a política de proibir animais nas moradias estudantis estão se esforçando para lidar com um monte de novos problemas. Como os administradores podem discernir entre um pedido legítimo de um adolescente problemático daquele de um estudante com saudades de casa que gostaria muito, muito mesmo, de ter um gatinho? Se um aluno com problemas psicológicos tem o direito de morar com um animal, como as escolas devem proteger outros estudantes que têm alergias ou fobias por causa daquele animal?

O tema está sendo muito debatido por funcionários de moradias estudantis e da área de saúde, depois que estudantes entraram com processos por discriminação após serem proibidos de ter animais para apoio emocional. No mês passado, às vésperas do julgamento de um caso acompanhado de perto pelos administradores, a Universidade de Nebraska, em Kearney, entrou num acordo com o Departamento de Justiça para pagar US$ 140 mil a dois alunos que tiveram seus pedidos para ter animais de apoio negados, deixando claros os protocolos para pedidos futuros. Recentemente, um juiz federal se recusou a descartar um caso semelhante contra a Universidade Estadual de Kent.

"Todo pessoal que trabalha com serviços para deficientes está vendo o que precisa fazer para que isso funcione", disse Jane Jarrow, consultor de educação para deficientes que oferece o curso "Who Let the Dogs In?" [“Quem Deixou o Cachorro Entrar?”, em tradução livre] – sobre o suporte emocional dos animais de apoio – pela quarta vez este ano. "Já passamos muito da fase de fingir que isso não vai acontecer."

Nos anos anteriores aos processos por causa de animais de apoio, as universidades achavam relativamente fácil recusar os pedidos para ter animais. Mas agora, disse Michael R. Masinter, especialista em direito dos deficientes na Universidade Nova Southeastern, na Flórida, "as escolas acham mais fácil dizer sim do que dizer não, porque os danos à propriedade são mais baratos do que o litígio."

A grande maioria dos pedidos para ter animais de apoio são para cães e gatos. Mas as escolas já receberam pedidos envolvendo lagartos, tarântulas, porcos, furões, ratos, porquinhos da Índia e planadores do açúcar – marsupiais noturnos australianos, que pesam em torno de 170 gramas e voam.

Claramente, muitos dos animais solicitados são os bichos de estimação dos alunos. Mas qual é a diferença entre um animal de apoio emocional e um animal de estimação que também oferece apoio? A distinção depende menos do animal e mais do aluno: se o aluno tem um transtorno psiquiátrico diagnosticado e consegue provar que o animal é necessário em termos terapêuticos.

"Se existem pessoas tentando fazer com que seu animal de estimação se passe por um animal de apoio? Claro", disse Jamie Axelrod, diretor de recursos para deficientes na Universidade do Norte do Arizona, onde os pedidos de animais de apoio aumentaram de alguns poucos, anos atrás, para cerca de 75 no ano passado. "Temos pessoas que precisam legitimamente de um animal? Sim."

"Você tem que confiar no senso ético dos terapeutas, de que eles estão fazendo o que é certo para o paciente", acrescentou Axelrod. "Mas trata-se de uma nova área controversa."

São poucas as pesquisas sobre o valor terapêutico dos animais. Alguns estudos demonstraram que eles podem proporcionar um benefício de curto prazo, particularmente na redução da ansiedade e da depressão. Um benefício terapêutico de longo prazo, no entanto, ainda não foi definitivamente estabelecido em experimentos aleatórios controlados.

Joanne Goldwater, diretora associada de alunos e diretora de moradia na Faculdade St. Mary de Maryland, não está preocupada com provas objetivas.

"Ficou claro que ter um animal ajudou a reduzir o estresse a ansiedade de alguns alunos”, disse ela, “o que os ajuda a progredir nos estudos”.

Se as escolas devem permitir animais de apoio depende, em geral, da lei federal de moradia. O processo do Nebraska foi apresentado pelo Departamento de Justiça em 2011 em nome de Brittany Hamilton, cujo pinscher miniatura de 1,8 kg, Butch, colocava as patas em seus ombros para aliviar suas crises de ansiedade. Ela queria que Butch vivesse em seu apartamento na universidade. A universidade disse não.

Mas em 2013, um juiz federal decidiu que a moradia da universidade estava vinculada à Lei da Habitação Justa, que protege os indivíduos com deficiência de qualquer discriminação. Os animais que oferecem apoio emocional estão entre as "concessões razoáveis" da lei para os moradores com problemas psicológicos.

Embora o consentimento no caso de Nebraska no mês passado não obrigue outras faculdades a fazer a mesma coisa, ele estabelece algumas orientações. A universidade pode negar um pedido, se o animal for muito grande para o local, se for agressivo, ou causar danos à propriedade.

E se a documentação de um aluno parecer insuficiente, a escola pode entrar em contato com o terapeuta do aluno – uma reação às cartas para requerer animais de apoio facilmente baixadas na internet ou produzidas em abundância por terapeutas online que, por valores de até US$ 150, atendem o aluno por Skype e emitem o documento. As universidades têm circulado uma lista de alerta contra esses profissionais.

Algumas instituições estão administrando o problema com uma atitude pragmática.

"Nós usamos nosso código de conduta para os animais, assim como para as pessoas", disse L. Scott Lissner, coordenador da Lei para os Norte-Americanos com Deficiência na Universidade Estadual de Ohio. "Nós não deixamos que nossos alunos andem pelo campus lambendo as pessoas, a menos que isso seja bem-vindo, então não permitimos que os cães façam isso. Nós não deixamos os alunos uivarem a noite inteira.” E, acrescentou: “eles não podem ir ao banheiro em qualquer lugar.”