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Coreia do Sul entra em um período de incerteza com impeachment da presidente

Park Geun-hye faz discurso após entregar seus poderes ao primeiro-ministro, em Seul, Coreia do Sul - Baek Sung-ryul/Yonhap via AP
Park Geun-hye faz discurso após entregar seus poderes ao primeiro-ministro, em Seul, Coreia do Sul Imagem: Baek Sung-ryul/Yonhap via AP

Choe Sang Hun

Em Seul (Coreia do Sul)

09/12/2016 19h49

O impeachment da presidente Park Geun-hye pelos legisladores sul-coreanos, na sexta-feira (9), coloca o país em um período de incerteza enquanto lida com uma economia em desaceleração, a crescente ameaça nuclear da Coreia do Norte e uma China mais assertiva.

Park, uma conservadora, adotou uma posição dura em relação à Coreia do Norte, se concentrando em sanções mais fortes. O governo dela também concordou com a implantação de um sistema avançado de defesa antimísseis americano que enfureceu os chineses.

O primeiro-ministro Hwang Kyo-ahn, que servirá como presidente em exercício, convocou uma reunião de importantes autoridades de segurança na sexta-feira, prometendo "retaliação resoluta caso a Coreia do Norte julgue mal a situação e tente uma provocação".

Hwang disse que a Coreia do Sul persistirá em aplicar "sanções fortes e pressão" como parte dos esforços internacionais para forçar a Coreia do Norte a desistir do desenvolvimento de armas nucleares.

Mas a profunda impopularidade de Park, resultado de um escândalo de tráfico de influência que estourou em outubro, pode aumentar as chances de um candidato liberal vencer a próxima eleição, possivelmente mudando a abordagem dela em relação à Coreia do Norte.

Isso poderia representar um desafio para o futuro governo de Donald Trump, enquanto ele delibera sobre um ajuste ou não da posição de Washington a respeito do programa de mísseis nucleares da Coreia do Norte.

Domesticamente, o impeachment dela fornece o exemplo mais recente de quanto a corrupção continua entranhada nos altos escalões da vida política e empresarial da Coreia do Sul.

A moção de impeachment acusou Park, a primeira mulher a liderar o país, de "violações extensas e sérias da Constituição e da lei". Ela ocorreu após semanas de revelações danosas que praticamente paralisaram o governo e produziram os maiores protestos de rua da história do país.

Os poderes dela estão suspensos enquanto o Tribunal Constitucional decide sobre seu afastamento permanente ou não. Se votar pelo afastamento, a Coreia do Sul realizará uma nova eleição presidencial em 60 dias.

Park sugeriu que pretende lutar contra seu impeachment, dizendo horas depois aos membros do Gabinete que se prepararia "calmamente" para o julgamento e não dando indício de que renunciaria.

"Eu aceito com gravidade as vozes das pessoas e da Assembleia Nacional, e espero sinceramente que a confusão chegue a um fim satisfatório", ela disse em comentários transmitidos em rede nacional de televisão.

7.dez.2016 - Kim Hee-Geun (esq) e Kim Seong-Yong seguram cartazes pedindo pela renúncia da presidente sul-coreana, Park Geun-hye, em Daegu, na Coreia do Sul - Woohae Cho/The New York Times - Woohae Cho/The New York Times
Imagem: Woohae Cho/The New York Times


Park é acusada de permitir que uma confidente obscura, a filha de um líder de seita religiosa, exercesse influência considerável em assuntos que variavam da escolha de pessoas para altos cargos do governo até o guarda-roupa dela, além de ajudar a extorquir dezenas de milhões de dólares de empresas sul-coreanas.

Milhares de pessoas reunidas do lado de fora do prédio do Parlamento, em uma frígida sexta-feira, vibraram quando a notícia foi anunciada.

"Meu coração está batendo acelerado", disse Han Joo-young, 47 anos, que veio de Paju, ao norte da capital. "Me emociona saber que pessoas que costumam ser impotentes podem ter tamanho poder quando se unem."

Um total de 234 legisladores votou pelo impeachment, muito além dos dois terços necessários das 300 cadeiras da Assembleia Nacional, a única casa do Parlamento na Coreia do Sul. O voto foi secreto, mas os resultados indicaram que quase metade dos 128 legisladores do partido de Park, o Saenuri, se juntou à oposição para removê-la do cargo.

Park, 64 anos, chegou ao poder no início de 2013, apoiada principalmente pelos coreanos mais velhos, que esperavam que ela fosse uma versão contemporânea de seu pai, o ditador militar Park Chung-hee, visto com frequência como o modernizador da Coreia do Sul.

Em vez disso, ela se tornou a líder menos popular desde o início da democratização do país no final dos anos 80, segundo recentes pesquisas. Os críticos a acusavam de ser autoritária e de usar o poder do Estado para amordaçar os críticos, ao mesmo tempo protegida por um círculo de conselheiros.

Da última vez que os sul-coreanos foram às ruas para derrubar um líder impopular, em 1960, eles tiveram que travar batalhas sangrentas contra policiais armados com fuzis.

Desta vez, em um sinal do quanto a democracia da Coreia do Sul amadureceu, multidões pacíficas atingiram sua meta sem nenhuma prisão. Números cada vez maiores de manifestantes se reuniam na capital, incluindo 1,7 milhão de pessoas no sábado, o maior protesto na história sul-coreana.

Parlamento aprova impeachment da presidente da Coreia do Sul

AFP

Park se tornou a primeira presidente sul-coreana a ser derrotada em uma votação de impeachment desde 2004, quando a Assembleia Nacional tentou o impeachment de Roh Moo-hyun por violação da lei eleitoral.

 

Dois meses depois, o Tribunal Constitucional decidiu que a violação de Roh era pequena demais para justificar um impeachment e o devolveu ao cargo. Mas Park enfrenta acusações muito mais sérias.

Mesmo assim, é difícil prever quando e como o Tribunal Constitucional decidirá o destino de Park.

A remoção dela exigiria os votos de pelo menos seis dos nove juízes do Tribunal Constitucional. Entre os atuais juízes, seis foram nomeados por Park ou por seu antecessor conservador, ou são vistos como estreitamente ligados ao partido dela.

O processo, que pode incluir audiências, permitirá que o partido sitiado de Park ganhe tempo para se recuperar do escândalo e se preparar para a próxima eleição presidencial, caso o tribunal decida por afastá-la formalmente.