Empresas do Vale do Silício testam helicópteros sem piloto que podem servir até de ambulância
Na semana passada, em um pequeno aeroporto nas planícies empoeiradas a leste de São Francisco, nos Estados Unidos, um helicóptero vermelho e branco decolou suavemente e pairou alguns metros acima da pista. Parecia um helicóptero qualquer, exceto pelo pequeno cubo preto preso na parte dianteira.
As autoridades locais passaram a semana testando essa aeronave para um novo serviço de emergência, que deve ser lançado em janeiro e responderá a ligações de emergência.
Enquanto esse helicóptero se desloca sobre policiais e profissionais de saúde no Vale de San Joaquin, ele alimenta um projeto mais ambicioso. Aquele cubo preto faz parte de um esforço crescente de fabricar pequenas aeronaves de passageiros capazes de voar por conta própria.
Hoje o helicóptero é conduzido por pilotos experientes. Mas o novo serviço de emergência será operado pela SkyRyse, uma empresa startup do Vale do Silício que pretende equipar pequenos helicópteros e outras aeronaves de passageiros com hardware e software que permitem voos autônomos, contando com as mesmas tecnologias que movem os carros sem motorista. Estas incluem câmeras de 360 graus e sensores de radar embutidos no nariz da aeronave.
"Muitas coisas devem ser realizadas antes que as aeronaves autônomas comecem a transportar pessoas", disse Mark Groden, um dos fundadores e o executivo-chefe da SkyRyse. "Mas estamos desenvolvendo a tecnologia capaz de nos levar até lá."
A Sikorsky, uma subsidiária da companhia de defesa Lockheed Martin, e a Xwing, outra startup do Vale do Silício, estão criando tecnologias semelhantes. Outras ainda, como a Aurora, companhia que hoje pertence à Boeing, estão explorando o voo autônomo enquanto constroem um novo tipo de aeronave elétrica para "serviços de táxi voador". O plano de negócios inicial do serviço de táxi aéreo Uber, que ela espera pôr em funcionamento dentro de cinco a dez anos, prevê a futura remoção dos pilotos das aeronaves.
O motivo é óbvio: os pilotos são caros e precisam descansar entre voos. O voo autônomo pode atender a novos tipos de serviços de passageiros ou mesmo mudar a economia das companhias aéreas de hoje. Enquanto companhias como a Aurora constroem aeronaves para voos autônomos, empresários como Groden acreditam que é mais realista adaptar as aeronaves existentes. Mas qualquer caminho vai demorar um bocado, por motivos técnicos e culturais.
"Não se trata apenas de construir algo que pode voar sozinho", disse Dan Patt, executivo-chefe da empresa de robótica Vecna, que antes trabalhou em voos autônomos na Sikorsky e em outras companhias enquanto estava no Darpa, o braço de pesquisa do Departamento de Defesa dos EUA. "Trata-se de construir um corpo de evidências de que é uma maneira segura de voar."
Governo e indústria há muito trabalham para automatizar partes do voo de passageiros –o termo "piloto automático" faz parte do vernáculo americano--, e de algumas maneiras construir uma aeronave autônoma é mais fácil que construir carros sem motorista, que há muito tempo são testados em ruas públicas. As aeronaves operam em espaços abertos, em oposição às ruas estreitas, cheias de pedestres e outros veículos. E pilotar um avião ou helicóptero é o tipo de tarefa altamente processual em que os computadores geralmente são bons.
Pequenos teleguiados (drones) já mostraram as possibilidades do voo autônomo. A Skydio, uma startup do Vale do Silício fundada por ex-engenheiros da Google, vende um drone por US$ 2.500 (cerca de R$ 10.300) que pode acompanhar uma pessoa por uma floresta enquanto ela caminha entre árvores. Adam Bry, o executivo-chefe da companhia, que também trabalhou na Google em seu projeto de drones para entregas, disse que a mesma tecnologia geral, baseada em câmeras digitais e sistemas matemáticos que analisam imagens em tempo real, é adequada a aeronaves de passageiros.
"O desafio técnico é mais simples de muitas maneiras", disse Bry. "Ninguém quer que essas coisas voem pela floresta o mais rápido possível. Queremos que elas voem com segurança, transportando pessoas do ponto A ao ponto B, e cuidem da decolagem e do pouso."
Mas lidar com a incerteza que ocorre durante a decolagem e o pouso, para não falar nos eventos raros e aleatórios que causam choques no meio de um voo, pode ser extremamente difícil.
O voo de passageiros também é altamente regulamentado. Mesmo que as empresas construam sistemas que voem confiavelmente, poderão ter dificuldade para movimentar a tecnologia pelo espaço aéreo público.
É por isso que a SkyRyse, apoiada por US$ 25 milhões em verbas que incluem investimentos de firmas do Vale do Silício como Venrock e Eclipse, está trabalhando com a cidade de Tracy. O serviço de emergência de Tracy vai operar sob as regras federais atuais, e só precisa de um passo para a autonomia.
O helicóptero inclui sensores necessários para a navegação autônoma. O radar, por exemplo, é semelhante aos sensores a laser dos carros sem motorista, fornecendo uma visão detalhada dos arredores mesmo em clima fechado. Mas neste momento esses sensores operam em conjunto com pilotos. Patt chama isso de "uma forma de aumentar a confiança" dos reguladores.
Ao mesmo tempo, os sensores captam enormes quantidades de dados que descrevem o que o helicóptero encontra da decolagem até o pouso e como o piloto reage.
Usando esses dados, os engenheiros da SkyRyse estão recriando condições de voo em uma espécie de realidade virtual, e organizando sistemas que podem navegar essas simulações. Os fabricantes de carros sem motorista contam com técnicas semelhantes.
"Podemos simular rajadas de vento, falhas do motor, até pássaros que entram no rotor da cauda", disse Groden.
Mas aplicar esse trabalho a serviços de emergência como o de Tracy levará anos. Passar aos serviços de táxi voador poderá demorar ainda mais.
Os helicópteros usados pela SkyRyse, do modelo Robinson R44 de quatro lugares, são pequenos e silenciosos pelos padrões atuais, e são relativamente muito usados (foram construídos cerca de 6.000). Mas se usados em grande número eles poderão não se adequar a áreas densamente povoadas. É por isso que companhias como a Aurora e a startup Kitty Hawk, também do Vale do Silício, estão construindo um novo tipo de aeronave.
O maior obstáculo ainda poderá ser convencer os reguladores e o público de que o voo autônomo é seguro.
"Há muitas startups fazendo isso", disse Igor Cherepinsky, diretor de programas de autonomia na Sikorsky. "Algumas delas são ingênuas sobre o que será preciso."
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