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A plantação de algodão que fez mar de Aral virar deserto

Rustam Qobilov

Da BBC Uzbequistão

26/02/2015 15h17

O desaparecimento do Mar de Aral, na Ásia Central, é uma das maiores catástrofes provocadas pelo homem do mundo. Para estimular o cultivo de algodão, políticas de irrigação agressivas implementadas pelos soviéticos transformaram 90% do que costumava ser o quarto maior lago do mundo em um deserto.

O repórter da BBC uzbeque Rustam Qobilov analisa as tentativas de salvar o Mar de Aral e suas probabilidades de sucesso.

Foram necessários apenas 40 anos para que o quarto maior lago do mundo, o Mar de Aral, na Ásia Central, secasse.

O que antes eram 60 mil quilômetros quadrados de água, com profundidade de 40m em alguns locais, evaporou. Agora, resta apenas 10% do lago.

Seu desaparecimento é considerado uma das alterações mais dramáticas feitas na superfície da Terra em séculos.

Os dois maiores rios da Ásia Central costumavam desaguar no Mar de Aral: um - o Syr Darya - a partir do norte; outro - o Amu Darya - a partir do sul.

Mas os dois rios também foram a fonte óbvia de irrigação para a indústria de algodão soviética.

Os soviéticos queriam transformar a Ásia Central na maior região produtora de algodão do mundo - por um período na década de 1980, o Uzbequistão cresceu mais do que qualquer outro país.

Como o mar encolheu, os enormes volumes de pesticidas e inseticidas jogados no rio ao longo dos anos tornaram-se gradualmente mais concentrados, até que os peixes começaram a morrer.

Em outras palavras, para construir a indústria de algodão, os soviéticos acabaram com um mar e seus peixes.

O clima também começou a mudar. A chuva parou. A grama secou, e os pequenos lagos de água doce que existiam perto da costa desapareceram, bem como os rebanhos de antílopes que costumavam vagar pela área.

Ao diminuir, o Mar de Aral ficou com o formato de um boneco de neve, com um corpo grande e gordo e uma cabeça pequena.

A cabeça é conhecida como o Pequeno Aral, com uma barragem localizada na "garganta" do boneco.

Foi essa barreira, a represa Kokaral, que permitiu que a água do lago subisse três metros a partir do seu ponto mais baixo desde 2005, enchendo o fundo do mar vazio e trazendo-o de volta à vida.

Mas o pequeno Aral sempre foi apenas 5% do tamanho total do antigo mar. Por isso, as grandes fábricas de processamento de peixe que agora estão ociosas nunca mais serão tão produtivas quanto antes.

Ainda assim, é a fonte de alguma esperança.

Marjan, um mulher de 67 anos que vive na antiga cidade portuária de Aral, no Cazaquistão, tem saudades dos dias antes do mar se transformar em um deserto.

Embora possa ser tarde demais para ela, diz desejar que seus netos possam ver a água batendo nos muros do porto outra vez.

A meta do governo cazaque é fazer com que o pequeno Aral se expanda até atingir sua antiga costa. Com o Banco Mundial, o governo pagou US$ 85 milhões pela barragem Kokaral.

No entanto, o que pode salvar o Pequeno Aral é visto no Uzbequistão como uma sentença de morte para o que resta do Grande Aral.

No lado uzbeque da barragem para o sul, as pessoas estão com raiva porque dizem que a barragem fechou a única fonte de água que estava entrando em seu mar.

No entanto, alguns acreditam que as autoridades uzbeques não estão muito preocupadas em salvar o Mar de Aral.

Depósitos de petróleo e gás foram identificados sob o fundo do mar. É mais fácil extrai-los em condições secas.

Empresas de energia russas e coreanas já começaram a trabalhar.