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Como tubarões estão ajudando as Filipinas a se recuperar de um tufão

Loic Venance/AFP
Imagem: Loic Venance/AFP

Harriet Constable

15/12/2016 21h30

Há três anos, o tufão Haiyan atingia as Filipinas e causava o maior número de mortos da história do país em um único evento.

Com quase 600 quilômetros de extensão, a massa entrou pelo leste, destruindo as pitorescas ilhas do arquipélago antes de chegar ao Vietnã e o Laos.

Os ventos de mais de 300 km/h derrubaram árvores, ruíram construções e varreram carros para longe. Em 48 horas, mais de um milhão de casas foram destruídas e mais de 6 mil pessoas morreram.

A ilha de Malapascua, que ficava bem na rota do Haiyan, foi particularmente atingida. Para muitos, parecia que esse pequeno paraíso, antes tão popular entre turistas, jamais se recuperaria.

Mas Malapascua contou com aliados poderosos e acima de qualquer suspeita: seus tubarões.

Espetáculo para mergulhadores

A espécie mais abundante na ilha é o tubarão-debulhador (Alopias pelagicus), um dos membros do gênero conhecido por possuir uma cauda fina e longa que eles usam para chicotear a água e, assim, assustar e paralisar suas presas.

Um adulto pode chegar a 3 metros de comprimento, o que não é muito em se tratando de tubarões. Assim como as outras duas espécies do gênero, o debulhador é altamente migratório e pode ser encontrado tanto em águas profundas quanto no litoral.

Esse tubarão tem apenas dois filhotes por ano e só chega à maturidade sexual por volta dos 8 anos de idade, o que o coloca entre as espécies mais ameaçadas de extinção em todo o mundo.

Diariamente, os animais de Malapascua se dirigem ao banco de areia de Monad, na costa da ilha. Segundo Alessandro Ponzo, diretor-executivo da divisão filipina do Projeto de Grandes Vertebrados Marinhos, isso acontece porque eles precisam se livrar de parasitas em sua pele.

"Para isso, logo de manhã eles vêm perto da praia para deixar que pequenos peixes removam esses parasitas", explica.

Além disso, o banco de areia está cercado de águas profundas cheias de sardinhas, oferecendo aos tubarões a chance de caçar e se alimentar.

Desde 1999, mergulhadores de todo o mundo têm visitado a região para admirar essa maravilha natural. Todas as manhãs, eles aguardam pelos debulhadores a uma profundidade de 20 metros.

"Não precisamos de jaulas ou iscas para que os mergulhadores aproveitem essa atração de perto", conta Anna Oposa, cofundadora da ONG Save Philippine Seas.

Por tudo isso, os tubarões têm sido fundamentais na recuperação de Malapascua desde a passagem do Haiyan.

"Como os tubarões não foram atingidos pela tragédia, o turismo de mergulho já estava de pé duas semanas depois do tufão, e isso ajudou a trazer dinheiro para a ilha", diz.

Graças ao ecoturismo, Malapascua praticamente já reergueu suas casas, escolas e agências de mergulho.

Mudança de mentalidade

Os moradores reconhecem o papel fundamental dos tubarões na manutenção da economia local.

"Eles oferecem muitas oportunidades de trabalho para nós", diz Bryan Barcenas, dono de uma loja de souvenires que vende esculturas artesanais de tubarões.

"Depois que os turistas mergulham, eles vêm aqui e compram meus objetos. Para mim, esses tubarões são um presente para Malapascua."

O ex-pescador Renato Reuyan também refez sua vida com o negócio em torno dos tubarões. Antes do tufão, ele caçava os animais para abastecer o movimentado mercado de barbatanas da Ásia. Depois da tragédia, decidiu se dedicar à proteção deles.

"Antes, os tubarões não significavam nada para nós - em uma noite de caçada, eu conseguia pegar de cinco a dez deles", conta. "Agora me tornei um guia de mergulho. Sei que ter mais tubarões significa ter mais mergulhadores, e, assim, mais dinheiro."

Comércio ilegal

Mas apesar do entusiasmo dos habitantes de Malapascua, o turismo em torno dos tubarões-debulhadores ainda enfrenta grandes desafios nas Filipinas.

"A pesca ilegal e comercial desses animais está tirando as oportunidades do turismo em todo o país", afirma Oposa.

As barbatanas dessa espécie representam 2,3% de todas as barbatanas comercializadas anualmente em Hong Kong, o maior mercado do mundo para esse produto, segundo um estudo de 2006 publicado na revista Conservation Biology.

Isso significa que milhões de debulhadores são mortos a cada ano.

"Tubarões de todas as espécies estão enfrentando uma crise de mortalidade global, com cerca de 100 milhões mortos a cada ano", afirma Luke Warwick, diretor de preservação de tubarões na organização Pew Charitable Trust.

"O debulhador é um caso particularmente preocupante, porque podem levar mais de dez anos para amadurecerem e começarem a se reproduzir, e só têm um ou dois filhotes por ano. Com o declínio insustentável que atinge 70% de seus habitats, essa espécie está destinada à extinção."