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Do outro lado da Baía de Guanabara, o peixe é fresco, mas polêmico

Fábio Teixeira/UOL
Imagem: Fábio Teixeira/UOL

Thomas Fischermann

27/07/2016 14h44

Na coluna desta semana, Thomas Fischermann conta como foi descobrir que na Ilha do Governador resiste uma colônia de pescadores, a mais antiga do Rio de Janeiro, ao lado do aeroporto. Apesar da poluição.

Há algumas semanas descobri, com inquietação, que na Ilha do Governador há uma colônia de pescadores ao lado do aeroporto, com seus esgotos fedorentos. A colônia Z-10 é a mais antiga no Rio de Janeiro de seu tipo. Tem um campo de futebol no meio e a sede de administração onde, em frente, os homens se aglomeram para consertarem suas redes. Bati. Um cheiro de café e cigarro encheu o espaço.

Desculpe, o senhor tem certeza que uma pessoa pode comer os peixes locais e continuar viva mesmo assim? "A poluição é pura propaganda", explica um representante da Colônia. Propaganda? Que aqui tem lixo boiando em todo lugar? Que segundo informações dos ambientalistas brasileiros são jogados 18 mil litros de esgoto não tratado por segundo no local?

Bem, descubro que é preciso diferenciar as coisas.

 

Óbvio que tem poluição aqui. Antigamente era fácil para os homens da Z-10 pegar um barco a remo em direção do oceano e voltar com 100 quilos de peixe ou camarão. Aí vieram os vazamentos de óleo gigantescos como o de 2000, vieram as grandes matanças de peixes, e uma intoxicação insidiosa através do esgoto e escoamento químico. "Quando as atividades do pré-sal pegarem embalo de verdade, o trânsito fluvial vai aumentar em 40%", descobri neste dia na Colônia Z-10. Vão querer ser indenizados. Negociar com a Petrobras. De fato, o pescador tem muito pouco poder de negociação.

"Mas os peixes são saudáveis e totalmente comestíveis", assegura Wilson Rodrigues Pereira da Silva, o presidente da associação local dos pescadores. Peixes pequenos, peixes grandes, até mesmo robalos nadavam na baía. Claro que não nadavam onde está a sujeira. "E temos que manter a tradição de pesca da baía", afirma Wilson com orgulho em seu discurso. "A pesca é um dos alicerces da alimentação da humanidade."

Também há grupos de ONGs e ambientalistas na Baía de Guanabara. Os pescadores não querem cooperar muito com eles. A princípio não entendi isso. Li sobre a participação de um chefe de uma ONG em uma passeata pela Baía de Guanabara, e que os chefes da Z-10 não queriam participar. Ouvi até mesmo sobre um projeto que pretende criar peixes com ajuda de biólogos e jogá-los na baía. Não é uma boa ideia? Não iria ajudar os pescadores também?

Dava para ouvir na rua as risadas na casinha da administração. "Esses biólogos querem criar peixe em água limpa, alimentá-los com ração e depois jogá-los na baía", explicam os homens práticos. "Isso é a maior loucura, eles morrem! Para os peixes sobreviverem na nossa Baía, tem que crescer lavados por todo tipo de água."

Thomas Fischermann é correspondente do jornal alemão Die Zeit na América do Sul. Na coluna Pé na praia, publicada às quartas-feira na DW Brasil, faz relatos sobre encontros, acontecimentos e mal-entendidos - no Rio de Janeiro e durante suas viagens pelo Brasil. Pode-se segui-lo no Twitter e Instagram: @strandreporter.