Para marcar território? Por que botos urinam no ar uns para os outros
Ler resumo da notícia
Um estudo analisou a potencial finalidade da micção aérea observada em golfinhos. Segundo os especialistas, a prática, que é um comportamento raro entre os cetáceos, sugere uma função social entre os animais da espécie.
O que aconteceu
Estudo se dedicou a um hábito inusitado verificado em golfinhos: ao nadar de barriga para cima, os animais urinam em direção ao ar. A pesquisa, publicada na edição de fevereiro do periódico Behavioural Processes, foi conduzida por cientistas do Grupo de Pesquisa CetAsia e da Universidade Trent, ambos do Canadá, e da Universidade Estadual do Oregon, dos Estados Unidos.
Para a realização da pesquisa, os especialistas passaram quase 220 horas no rio Tocantins. O comportamento foi observado pelo grupo de estudiosos, que registrou "a sequência, a duração e o contexto social da micção aérea". Ao longo deste período, foram registrados 36 eventos de jatos de urina direcionados para o ar.
A interação foi vista entre espécimes de Inia geoffrensis, conhecidos popularmente como boto-cor-de-rosa. Segundo o estudo, a micção aérea ocorre em "contextos sociais" envolvendo botos machos. Ainda de acordo com a pesquisa, 67% dos eventos observados ocorreram com a presença de golfinhos receptores —o animal que fica próximo àquele que está urinando.
A micção aérea começa com um boto posicionando-se lentamente de cabeça para baixo, expondo seu pênis acima da água e ejetando um jato de urina no ar. Quando um macho 'receptor' está presente, ele se aproxima do jato de urina com seu focinho (às vezes perseguindo-o) ou permanece onde o jato entra em contato com a água. Trecho do estudo
O flagra surpreendeu até mesmo os especialistas envolvidos na pesquisa. "Observamos esse comportamento pela primeira vez em 2014, durante nosso trabalho de campo regular. [...] Ficamos realmente chocados porque era algo que nunca tínhamos visto antes ou ouvido falar de outros pesquisadores", explicou Claryana Araújo-Wang, uma das líderes do estudo, ao portal IFLScience.
Urina pode conter detalhes sobre hierarquia social e atributos físicos
Componentes químicos presentes na urina podem transmitir informações sobre o estado do golfinho. A urina pode indicar, por exemplo, a condição hormonal, de saúde física e fisiológica, disponibilidade reprodutiva e até mesmo o domínio social exercido pelo dono do xixi.
A prática de "marcar território" é comum entre mamíferos terrestres. Segundo o estudo, a marcação de cheiros feita por esses animais por meio da pulverização de urina é conhecida também por ajudar na seleção de parceiros e na comunicação química entre a espécie. Nos mamíferos aquáticos, porém, o comportamento não é comum.
Apesar de ter algumas habilidades sensoriais limitadas, os golfinhos são capazes de detectar odores e secreções no ar e na água. Os cientistas explicam que, ao combinar suas capacidades olfativa e degustativa, os botos "receptores" conseguem identificar sabores complexos na urina de membros da mesma espécie.
Segundo os cientistas, o comportamento observado na espécie exige mais pesquisas. Apesar de rara, a prática entre os golfinhos pode indicar uma interação até então desconhecida pelos especialistas. Como os botos não têm um forte sentido de olfato e de paladar, os cientistas buscam entender, agora, como os golfinhos interpretam as eventuais informações químicas transmitidas pela urina.
Nossa hipótese é que as cerdas no rosto dos botos podem desempenhar um papel sensorial químico na detecção de jatos de urina e que a micção aérea, muitas vezes ocorrendo na presença de outros machos, desempenha funções sociais ou comunicativas além da necessidade fisiológica de eliminação de resíduos. Trecho do estudo
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.