A confusão reina em Bruxelas desde a divulgação dos planos de rotular o gás - e agora também a energia nuclear - como "energia verde". Em jogo está a credibilidade da União Europeia (UE) como autoproclamada líder climática. O campo de batalha são as negociações sobre o que pode ou não ser considerado atividades econômicas sustentáveis para fins de investimento - a chamada Taxonomia Verde. Desde o final de 2021, quando foi vazada a informação de que a taxonomia europeia incluiria o gás como investimento verde, cientistas, especialistas em finanças e ativistas reagem com indignação. O tema cria uma divisão política na Europa. De um lado a Alemanha, altamente dependente do gás, e a França, com seus pés acorrentados às usinas nucleares, querem desbloquear bilhões de euros para esses setores. Já Espanha, Áustria, Dinamarca e Luxemburgo escreveram à Comissão Europeia clamando-a para não prejudicar a credibilidade do bloco e a transição energética global. "Eu aceito plenamente que o gás é um combustível fóssil - não somos cegos a isto", disse ao Político a Comissária de Serviços Financeiros da UE Mairead McGuinness. Ainda assim, segundo ela, tanto o gás como a energia nuclear são melhores do que o carvão. A estratégia de investir no mal-lavado para evitar o sujo não tem base científica. O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC) e a Agência Internacional de Energia recomendam não investir em projetos de qualquer forma de combustíveis fósseis a fim de manter o aquecimento global limitado a 1,5°C. Instituições financeiras afirmam que a inclusão do gás na taxonomia da UE é uma lavagem verde (greenwash) do sistema financeiro, que engana os investidores. E pior: alertam que o investimento em novas infraestruturas de gás - que podem se tornar obsoletas ainda nesta década - desvia os recursos que deveriam ir para projetos de energias realmente renováveis e que já estão disponíveis. "A taxonomia da UE foi concebida como uma ferramenta vital para alinhar os fluxos financeiros com o Acordo de Paris. Em vez disso, a Europa está minando sua liderança climática e baixando os padrões na UE e fora dela", diz Laurence Tubiana, CEO da Fundação Europeia do Clima e principal idealizadora do Acordo de Paris. "Quando um padrão-ouro emergir em outro lugar, esta taxonomia será deixada para trás." Seul e Tóquio observam de longe a confusão aguardando o momento certo para brilhar. Dois ex-primeiros ministros japoneses - Junichiro Koizumi e Naoto Kan - pediram em carta que o bloco europeu reveja a classificação "verde" para a energia nuclear. E até a China, maior poluidor do mundo, excluiu os combustíveis fósseis da sua taxonomia de títulos verdes. A proposta de inclusão do gás e da energia nuclear na taxonomia verde da EU terá agora que passar pelo escrutínio do Parlamento Europeu e do Conselho, que têm um prazo de quatro a seis meses para aprovar ou vetar. |