O modelo de produção mais usado no Brasil optou pela importação de fertilizantes solúveis - principalmente Nitrogênio, Fósforo e Potássio, o chamado NPK - como forma de expandir a agricultura no país desde os anos 1970. Soja, milho, cana-de-açúcar e algodão, as estrelas do agronegócio exportador, são as culturas que mais usam esses insumos, mas a indisponibilidade desses produtos no exterior em função da guerra da Rússia na Ucrânia deve impactar todos os setores agrícolas. Não precisava ser assim. A geóloga Suzi Huff Theodoro faz parte de um movimento científico que defende a rochagem, um processo que extrai minerais úteis para a agricultura do pó de pedras abundantes por todo o território nacional, como o basalto. A grande geodiversidade do Brasil seria um trunfo, explica a estudiosa, porque permite que qualquer área rural não esteja mais do que 500 km distante de reservas com este potencial. Entre as vantagens da remineralização do solo, está o baixo custo e o fato de que o processo transforma as culturas em sumidouros de CO2 - veja matéria completa do UOL. A desvantagem é que o uso desse pó de rocha implica em um processo mais lento de absorção de nutrientes. Os fertilizantes solúveis, por sua vez, geram contaminação do solo e da água, já que as plantas não conseguem absorver os excedentes, contribuindo, inclusive, para aumentar as emissões de gases de efeito estufa. "Remineralizar é uma técnica que visa o solo. Em um solo equilibrado, o desenvolvimento das raízes é muito maior em qualquer tipo de cultura - soja ou florestas inteiras. O modelo convencional só quer que a planta cresça rapidamente, destruindo o solo no longo prazo e induzindo a busca por mais terras", explica a pesquisadora, que contribuiu com os debates que geraram a Lei 12890 de 2013 e a instrução normativa que regulamenta a atividade. Um dos pioneiros do tema, Othon Leonardos chegou a ser chamado de louco quando propôs esta abordagem no final do século 20. Estudos internacionais recentes, apontando inclusive o Brasil como um dos maiores hotspots para a técnica, têm silenciado às críticas e ajudado a expandir o modelo. Em 2018, três empresas estavam aptas para este tipo de produção no país. Agora são quase 30. Em 2019, 650 mil toneladas de fertilizantes (diferentes substâncias) foram produzidas por meio da rochagem. Este patamar subiu para 1 milhão de toneladas em 2020, 1,5 milhão de toneladas em 2021 e a estimativa é de 3 milhões de toneladas para este ano, com projeções apontando para até 75 milhões de toneladas ao final desta década, segundo Theodoro e em linha com o Plano Nacional de Mineração. "As empresas que já têm o registro para fazer esta atividade não estão conseguindo atender a demanda", informa Theodoro. Ela lamenta que apesar do crescimento vertiginoso, ainda há muita resistência a fazer esta opção mais sustentável em termos ambientais e econômicos. "Não se pode ignorar a geopolítica por trás deste modelo, que determina as autonomias e as dependências globais por insumos. Há uma elite brasileira, incluindo cientista e legisladores, que quer manter esta dependência como forma de garantir vantagens econômicas para setores específicos, mesmo sabendo que no futuro haverá um fim para este modelo." No curto prazo, o preço a pagar por esta escolha será alto. O engenheiro agrônomo Lisandro Inakake de Souza, do Imaflora, alerta que a baixa oferta de potássio no mercado externo será pior para países do Hemisfério Sul, que iniciam o planejamento do ano agrícola entre maio e junho, enquanto o Norte já fez as aquisições necessárias para garantir sua safra anual. "A crise que se avizinha também reflete um modelo de agronegócio que tenta se vender como uma indústria sofisticada, mas ignora as vantagens de sua geografia tropical e não investe em infraestrutura", afirma o pesquisador. Ela explica que o Plano Nacional de Fertilizantes, que será apresentado nos próximos dias e terá como base este documento, seguirá ignorando as fontes alternativas. PUBLICIDADE | | |