Um novo estudo mostra que as vazões da bacia dos rios Araguaia e Tocantins estão diminuindo gradativamente. A análise observou os registros históricos de 27 estações de medição até o ano de 2019 e constatou vazões abaixo da média em 19 delas, com especial atenção para os períodos secos. Os resultados são um alerta para os projetos de irrigação, hidrelétricas e hidrovias propostos na região. A pesquisa publicada na segunda-feira (9) descreve o comportamento não estacionário da bacia do Araguaia-Tocantins, ou seja, suscetível a grandes variações de disponibilidade hídrica. Os pesquisadores empregaram um modelo estatístico diferente do tradicional, que em vez de observar apenas a vazão média, também leva em conta alterações sazonais. Segundo os autores, os projetos pensados para a região podem estar contando com uma água que já está cada vez menos disponível. "Uma das premissas para fazer irrigação e hidrelétricas nessa região tem sido a de que o regime da bacia é estacionário, ou seja, que a vazão é constante. Como isso não é verdade, a sustentabilidade econômica desses investimentos é questionável", explica o biólogo Dilermando Pereira Lima Junior, professor da Universidade Federal do Mato Grosso e um dos autores da pesquisa. A descoberta dos pesquisadores brasileiros está em linha com as previsões feitas pelo IPCC (Painel Intergovernamental da ONU sobre Mudanças Climáticas) em seu último relatório sobre impactos das mudanças climáticas. O documento indica que o Cerrado brasileiro está perdendo disponibilidade hídrica, com estiagens severas sendo prováveis no futuro no Planalto Central e no Nordeste. "É certo que esta baixa na vazão reflete o impacto previsto em função da mudança climática. E também é correto que a mudança do uso do solo, com as drenagens das áreas úmidas, agrava essa tendência. Estamos estudando agora em que medida as ações locais e a mudança do clima contribuem para o problema", explica Lima Júnior. Uma das maiores preocupações do biólogo é com a drenagem das planícies de inundação da bacia, praticada em larga escala e com pouca fiscalização, sobretudo nos estados do Pará e Mato Grosso. Essas áreas úmidas são vitais para a sobrevivência dos rios e são protegidas por lei — inclusive internacional, por meio da Convenção de Ramsar. "Nós deveríamos estar criando medidas de adaptação para os impactos que já estão previstos para essa bacia, em vez de continuar propondo formas de agravar o estresse hídrico local. Em vez de drenar áreas úmidas, deveríamos estar recuperando áreas degradadas", lamenta o pesquisador. "Infelizmente os agentes públicos e privados não estão se apoiando nas melhores informações disponíveis." PUBLICIDADE | | |