Um estudo publicado nesta quinta-feira (30) mostra que nos últimos dois anos houve um crescimento forte de ações na justiça contra os causadores da mudança climática, sejam eles governos ou empresas. Dos 2002 casos abertos desde 1986 em 44 países e cortes internacionais e regionais, quase 25% (475) foram apresentados após 2020, com tendência de crescimento também nos países do Sul Global. A pesquisa "Global trends in climate change litigation: 2022 snapshot" foi publicada pelo Instituto Grantham de Pesquisa em Mudança Climática e Ambiente da London School of Economics and Political Science. A apresentação dos resultados foi feita durante o evento "Tendências Globais em Litígios Climáticos" como parte da Semana de Ação Climática de Londres. A maior parte das ações desde 2020 foi aberta nos Estados Unidos (321) e apenas 7% (32) em países pobres e de renda média. Apesar do número baixo, as autoras do levantamento, Joana Setzer e Catherine Higham, identificam uma tendência de crescimento em todo o Sul Global, principalmente contra empresas de combustíveis fósseis, as maiores causadoras da mudança climática em curso, além de governos. Elas descobriram ainda que dos 454 casos desde 1986 abertos fora dos Estados Unidos cujos resultados são conhecidos, 54% (245) das decisões foram "favoráveis à ação climática". "Casos também estão sendo apresentados contra uma gama mais diversificada de atores corporativos. Em 2021, enquanto 16 dos 38 processos contra réus corporativos foram movidos contra empresas de combustíveis fósseis, mais da metade foi movida contra réus de outros setores, sendo que alimentos, agricultura, transporte, plásticos e finanças foram apontados em múltiplos casos", diz o texto. Essa diversidade de réus em processos de litigância climática pode ser observada na América Latina. Uma plataforma lançada este ano reúne todas as ações envolvendo a mudança climática na região desde 2019, muitas delas contra o governo brasileiro, como o caso aberto por partidos da oposição ao governo federal pela não implementação do PPCDAm (Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal) prevista em lei. Para Javier Dávalos, advogado sênior do Programa de Clima da AIDA (Asociación Interamericana para la Defensa del Ambiente), há uma diferença entre o perfil de ações legais nos países ricos e pobres. Segundo ele, os processos no Norte Global tratam quase exclusivamente de ambição climática, e cita como exemplo os casos Urgenda e Shell, ambos na Holanda. Nos países pobres e de renda média, os direitos humanos são um tema mais central nesses processos. "Por outro lado, no Brasil e no México já vemos casos em que pessoas ou organizações demandam o Estado especificamente pela diminuição de sua ambição climática", afirma o jurista, citando o caso da "pedalada climática" da meta brasileira no Acordo de Paris. Nesta ação que ainda tramita na justiça, um grupo de jovens ativistas processa o Brasil por alterar a linha de base de cálculo de suas emissões, permitindo índices maiores do que foi prometido em 2015, traindo o espírito do Acordo. "Está havendo um intercâmbio muito interessante de experiências de litígio climático em vários lugares. Eu espero que isso envolva também todo o restante da comunidade jurídica — juízes, advogados, acadêmicos, estudantes e professores — para que haja cada vez mais conhecimento sobre como usar o direito como uma ferramenta para obrigar governos e empresas a proteger o clima", afirma Dávalos. No levantamento britânico, Setzer e Higham também identificam uma espécie de "contágio" causado por cada caso novo e chamam a atenção para potenciais tendências futuras, com "mais litígios focados na responsabilidade pessoal (desde ações criminais até casos sobre deveres de diretores, administradores e curadores para gerenciar riscos climáticos), mas também litígios internacionais que tratam da prevenção e reparação (ou 'perdas e danos') da mudança climática", afirma o texto. Elas também esperam "um aumento contínuo do litígio contra governos e grandes emissores desafiando compromissos que se baseiam excessivamente na remoção de gases de efeito estufa ou tecnologias de 'emissões negativas', bem como casos que estão explicitamente preocupados com o nexo entre o clima e a biodiversidade." PUBLICIDADE | | |