O que a nova composição do Congresso representa para as agendas climática e ambiental no Brasil? Ambientalistas afirmam que o cenário continua desafiador, mas que há o que comemorar. E concordam que a atuação do legislativo, particularmente a dos partidos do chamado Centrão, será muito influenciada pelo presidente eleito em 30 de outubro. "O jogo de forças no Congresso Nacional estará equilibrado com a vitória da candidatura Lula-Alckmin para uma agenda positiva na área ambiental, e contará com uma boa representação de contenção de danos e retrocessos em uma eventual reeleição de Bolsonaro", prevê Malu Ribeiro, diretora de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica. A organização fez as contas e dos 216 signatários da Frente Parlamentar Ambientalista, 112 se reelegeram. Este grupo pode ganhar adesões entre os novos eleitos e somar forças com os não-signatários da Frente, mas que têm atuado de maneira sensível às pautas ambientais. Por outro lado, ao se tornar o maior partido do Congresso, o PL do atual presidente terá grande capacidade de enfraquecer a legislação ambiental ao se articular com os partidos do Centrão de atuação essencialmente antiambiental. "Se o Bolsonaro se reeleger, com este legislativo, estou certo de que veremos uma escalada de retrocessos. Se o Lula se eleger, é possível que a força de um executivo federal mais alinhado com a pauta de clima crie o balanço necessário para impedir o avanço de agendas antiambientais no Congresso." André Lima, consultor sênior de Política e Direito Socioambiental do IDS (Instituto Democracia e Sustentabilidade) Ribeiro destaca que a paralisia do atual Congresso com temas ambientais é tamanha, que o Brasil ainda não definiu sua representação para a COP 27, que será realizada daqui a exatamente um mês. "O país poderia estar avançando numa agenda climática internacional, em temas como mercado de carbono e universalização do saneamento, mas na medida em que o parlamento não se engaja, o país fica à mercê de lobbies pontuais" "O Congresso permaneceu com um perfil muito ruim, apesar da eleição de uma bancada ambiental importante, como as lideranças indígenas Sônia Guajajara e Célia Xakriabá, além de outros importantes nomes", afirma Márcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima. "Com um número ainda alto de parlamentares conservadores e de extrema direita, o que se espera das casas legislativas brasileiras é que continuem tentando impor agendas de retrocessos para o clima e o meio ambiente. Mas a parte mais importante da eleição brasileira ainda não terminou." Perde e ganhaPara Lima, tanto na Câmara como no Senado a agenda ambiental perde em quantidade e em qualidade, mas é possível construir um balanço de forças no próximo legislativo. "Na Câmara, onde a coisa já estava ruim, perdemos alguns parlamentares muito bem avaliados na área socioambiental, ao mesmo tempo em que tivemos algumas compensações. O quanto a gente conseguiu compensar essas perdas é algo que vamos descobrir." André Lima, consultor sênior do IDS Ribeiro é um pouco mais otimista. "Nós perdemos o deputado Rodrigo Agostinho [PSB-SP], que era o coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista e uma grande liderança no tema. Ganhamos Marina Silva [REDE-SP], Sônia Guajajara [PSOL-SP], Guilherme Boulos [PSOL-SP] - novos nomes que vão oxigenar essa pauta por direitos socioambientais". Para Ribeiro, o perfil mais militante de novos eleitos será um diferencial. "A deputada Talíria Petrone [PSOL-RJ], do Rio de Janeiro, foi uma das mais votadas e é a coordenadora do GT sobre Água, Segurança Climática e Gênero que é uma agenda extremamente importante." A eleição do ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles é vista pelos ambientalistas como um indicativo do tipo de liderança antiambiental do próximo legislativo. Ele recebeu forte financiamento do agronegócio paulista e deixou o cargo após ser investigado em um caso de contrabando de madeira da Amazônia para os EUA. "Houve um enorme investimento em candidaturas como a do ex-ministro Salles, que tem até problemas gravíssimos na agenda antiambiental, mas ele terá que debater com representantes da qualidade da Marina Silva", diz Ribeiro. "No Senado, a gente elegeu mais parlamentares com desempenho ruim na área de meio ambiente, mas em relação à composição anterior há um empate. O aspecto que chama atenção é que o partido do presidente Bolsonaro (PL) conseguiu eleger um número importante de senadores e, com isso, o PL vai operar como um bloco com grande possibilidade de indicar o presidente do Senado", avalia Lima. "Se Bolsonaro for reeleito, isso aponta para o fim de um equilíbrio de forças que foi crucial nos últimos anos, quando muitos retrocessos ambientais foram freados no Senado." Parlamentares sensíveisA partir de 2023, haverá mais presença da sociedade civil nas casas legislativas, estima Ribeiro, um elemento político que foi neutralizado nos últimos anos pela pandemia e por uma nova rotina de votações remotas. "Com a presença das pessoas nas votações, os lobbies ruralista, da energia fóssil e da mineração terão que se equilibrar. Haverá mais exposição das posições de cada parlamentar e muito mais pressão, ao mesmo tempo em que as cobranças do mercado e no exterior por mais alinhamento climático crescem." Malu Ribeiro, diretora de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica Um indicativo de que muitos parlamentares terão interesse em se mostrar mais sensíveis aos temas ambientais vem da ANA (Articulação Nacional de Agroecologia). A composição da Câmara dos Deputados terá 12% de parlamentares (64) que aderiram a compromissos da organização para a erradicação da fome e o fortalecimento da agricultura familiar, além de adesões dos legislativos e executivos estaduais. Para Ribeiro, o maior risco de retrocessos está na agenda de direitos humanos, elemento central das pautas de clima e meio ambiente. "São as conquistas da Constituição de 1988 que estão em jogo. Veremos ataques a questões de gênero, equidade e direitos dos povos indígenas e tradicionais, o que impacta diretamente no desempenho climático do país". PUBLICIDADE | | |