Mas nós temos um amor muito grande um pelo outro, acabamos reatando. Só que combinamos: a partir dali teríamos um relacionamento aberto e neste relacionamento aberto só entrariam mulheres. Sei que tem um fundo de machismo nisso, mas eu ainda não consigo aceitar a ideia de outro homem entre nós. Voltamos a morar juntos e ficamos super em paz. A Mara precisava de liberdade para viver uma coisa que foi tomada dela, a bissexualidade que ela não teve a oportunidade de viver. Em tese, eu também podia sair com quem quisesse, embora só tenha começado a ficar com outras meninas muito tempo depois. Ela tinha namoradas fixas, me mostrava as fotos. Eu sempre gostei de saber, buscava os detalhes, até por uma questão erótica, embora eu saiba que mulher não é objeto, a gente não tem de objetificá-las. Até então, as meninas com quem ela saía eram lésbicas —e lésbicas gostam de mulheres, não querem saber de marido que vem pendurado junto. Só que isso foi até ela encontrar a Lili, que é uma mulher bi. Chegou em casa contando: "Nossa, conheci uma menina super legal, a gente foi num bar, rolou o maior clima. Vamos chamar ela pra sair?". Chamamos, fomos para um motel, deu a maior química e a partir daí a gente não se desgrudou mais. A Lili trouxe o equilíbrio que faltava para a nossa família. Meu, como eu amo a Lili. Ela é o meu colo, o meu porto seguro, é aquela pessoa que quando eu estou pra baixo me acolhe, me dá carinho, me ouve. Ela e a Mara também se completam muito. Querem sempre fazer a mesma coisa, coincidem a tal ponto que eu digo pra elas: "Vocês são uma unidade que alguém separou e agora a gente está juntando de novo". A diferença é que a Mara é mais prática e a Lili é mais sentimental. Lili é a mais velha de nós três. Tem 35 anos. A Mara tem 34 e eu, 33. Pouquíssimo tempo depois daquele nosso primeiro encontro a três, eu e a Mara convidamos a Lili pra morar com a gente. Ela é publicitária e vivia sozinha. Nós já tínhamos dois filhos. Como não queríamos afugentá-la, combinamos: vamos ficar juntos uma semana. Se der certo, ficamos um mês. Se for legal, ficamos seis meses. E se for muito legal, moramos juntos. No começo, dormíamos todos numa cama pequena. Agora compramos um colchão king size, que por enquanto está em cima de um pallet. Sexualmente, é muito legal. Elas transam entre elas, eu transo com as duas. Às vezes também transo com uma só. A Mara trabalha de manhã, a Lili entra no trabalho às 13h e eu trabalho à noite. Então, eu faço muito sexo com a Lili de manhã. A Mara não gosta de transar nesse horário. Já quando a Lili vai para a casa da mãe dela, eu e a Mara revivemos a rotina de casalzinho de novo. Mas não é o que a gente curte. A gente curte muito mais a três, é o que a gente gosta. Não tem um roteiro. Por exemplo, uma vez eu cheguei em casa e as duas estavam transando. Estava uma coisa tão legal que eu falei: "Mano, não vou atrapalhar". Fui no quarto das crianças, peguei um travesseiro e dormi na sala. Transar é que nem dançar, as coisas acontecem na hora. Quando vamos a algum lugar, as pessoas estranham muito. Algumas vezes, chegamos de mãos dadas, como fazem todos os casais. Mas o que pega muito é quando as meninas se beijam. Alguns se sentem ofendidos, outros chegam a me beijar na cabeça, achando que eu sou super feliz, que a gente só transa o dia inteiro. Tem uns vizinhos que dizem: "Eu queria ser que nem você". Eu penso: "E eu queria te ver às seis horas da manhã, tentando organizar quem você vai por no carro, quem vai levar primeiro, quem vai ter de buscar, como vai ser a volta". Eu tenho três crianças que estudam [depois da chegada de Lili, eles adotaram um terceiro filho], duas mulheres que trabalham e um carro só. A logística é complicada e isso pode parecer só um detalhe. Só que a nossa vida é cheia destes detalhes. E tem também as pessoas que eu mal conheço e que falam: "Nossa, você come as duas, deve ser muito louco!". Às vezes o cara quer te elogiar e te ofende: - Mas e aí, hein? Como é que é esse negócio de três? - Eu digo: "O quê? Eu vou falar da minha intimidade pra você? Vou falar da intimidade das minhas mulheres pra você, seu escroto?" Arrumo briga, saio de grosso, mas não estou nem aí. Na comunidade LGBTQIA+, sou muito mais respeitado. Mas entre os homens hetero, tenho de cobrar respeito. Eu sou pai de família, não acho legal isso." (continua na próxima newsletter) |