"Mudar de nome no papel foi um processo complicado. Passei um bom tempo com o nome alterado no CPF, mas não o sexo. Para alteração do sexo, era necessária uma perícia física e psíquica no Imesc (Instituto de Medicina Social e de Criminologia). Fiz o exame psíquico e depois tive de ficar aguardando a perícia física. Meses depois, chegou a carta. Fui lá e vem o médico, sempre me chamando pelo nome masculino. - Ah, você é o Agnello? Você quer mudar seu nome? Por que você quer mudar seu nome? - Porque eu sou mulher, me sinto mulher, sempre fui uma mulher. - Você fez a cirurgia? - Fiz. - Tira a roupa. Tirei. - Vira. Deita aqui na maca. Quero você de lado. Agora de costas, com a perna dobrada. Aí ele ficou olhando pra minha vagina e tocou a ponto de colocar o dedo pra ter certeza de que havia profundidade. - Pode vestir a roupa, Agnello. Aguarda a resposta na sua casa. O Imesc é o mesmo lugar em que eles identificam quem é psicopata. Então, eles te veem como outro doente mental que está querendo uma coisa esdrúxula e a medicina, porque é mais louca ainda, resolveu passar operados pra eles. Por isso que foi tão importante a resolução do STF (Supremo Tribunal Federal), que diz que basta a declaração do indivíduo e do seu médico para autorizar a mudança de nome nos documentos. Da outra forma, o constrangimento é imenso. Eu acho que a minha cirurgia só foi possível depois que eu cheguei à conclusão de que, independentemente de quão boa ficasse a operação, de quão boa fosse a minha transição, eu sempre seria uma mulher trans. Acho que eu tinha uma esperança muito imaginária e ilusória de uma transformação total. Não foi fácil aceitar as limitações da minha condição — aceitar que eu nunca seria uma mulher biológica. |