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Omissão dos bons favorece escassez de ética na política

Especial para o UOL

22/08/2015 06h00

"O castigo dos bons que não fazem política é ser governados pelos maus" - Platão

A palavra-chave e que melhor descreve o cenário que o país atravessa é instabilidade. O trabalhador vê a inflação corroer seu salário, no mesmo instante em que o atual governo tem sérias dificuldades na condução política e bate recordes de impopularidade. Os desafios são grandes e, para dificultar, nem sabemos se há lideranças capazes de explicar para a sociedade que, ainda que se faça a coisa certa, direcionar o Brasil para o rumo correto não será fácil, muito menos indolor, e pode exigir dos cidadãos de bem mais que o ato de exercer seu direito ao voto.

No ano que vem haverá eleições municipais e a maior parte dos brasileiros concorda que precisamos de mudanças, sejam elas em relação aos políticos ou às regras do jogo, pregando, para tanto, uma reforma política. Resta saber duas coisas: quantos deles estão predispostos a participar ativamente do processo? Ou, quando estão, qual incentivo que os partidos políticos oferecem para que um cidadão comum, que realiza um grande trabalho social, torne-se um agente eleito, capaz de produzir, com ainda mais força e alcance, um projeto de interesse público?

Infelizmente, sabemos que a diferença entre um ladrão de galinha e aquele que desvia milhões é a oportunidade (ou falta dela). A escassez de valores e de princípios éticos também goza de crescimento recorde nos últimos anos, perpassa a derrocada da família e culmina na relativização do certo e do errado e no fato de termos agentes públicos que, propositalmente, confundem o público com o privado. Mas o quanto disso tudo é influenciado pela omissão dos bons? Daqueles que não se envolvem direta e indiretamente no processo político?

Em alguns casos percebe-se que é preciso algo além da predisposição para candidatar-se ou participar da política. As mulheres, por exemplo – que ainda ocupam poucas cadeiras no Parlamento, apesar de serem maioria da população – cresceram substancialmente em número de candidatas na última eleição: foram 6.245, um aumento de 70% entre 2010 e 2014. Mas, destas, apenas 178 foram eleitas, um número ainda menor que em 2010 (193 mulheres).  

No meu caso em específico, por ter sido eleita coordenadora de todos os partidos políticos na campanha nacional por mais mulheres no parlamento, apoiada massivamente por deputados e senadores, percebo que há diversas outras questões a exigir mais que predisposição de participar: apoio familiar, o preconceito dentro das próprias legendas e o auto boicote. Há até mesmo as próprias mulheres que pensam “em mulher eu não voto”, como se o gênero acrescentasse ou tirasse capacidade de gestão.

Enfim, o problema não está apenas no sistema que permite que os erros aconteçam, mas em nossa mentalidade que, muitas vezes, condena o erro do vizinho, mas minora o próprio equívoco. E está principalmente em nossa tendência à cordialidade, de supervalorizar as intenções e subvalorizar os resultados, de coletivizar erros de indivíduos que deveriam ter coragem para encarar de frente a impunidade.

Estamos há pouco mais de um ano de novas eleições, mas há pouco menos de 60 dias para que se filiem a algum partido e se apresentem os que se julgam aptos a colaborar ativamente para uma sociedade melhor. São esses que, independentemente de legenda, ideologia ou defesa, devem dar demonstração clara de que é a nossa consciência cidadã e social que deve falar mais alto e fazer acontecer.

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