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Farol baixo durante o dia aumenta segurança, mas multas são problema

Especial para o UOL

11/07/2016 06h00

A partir da última sexta (8), o uso do farol baixo em rodovias durante o dia passou a ser obrigatório. Desta forma, reescreve-se o artigo 40 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), lei 9503, de 1997: “o condutor manterá acesos os faróis do veículo, utilizando luz baixa, durante a noite e durante o dia nos túneis providos de iluminação pública e nas rodovias”.

Ao não obrigar o uso do farol em vias urbanas, deveria existir sinalização indicativa em acessos de rodovias, e direito de impugnação de multas em caso contrário. Se fosse obrigatório em todas as vias públicas, urbanas ou não, a resposta de segurança poderia ser significativa, em função da exposição de risco a pedestres e ciclistas, bem como maior volume de cruzamentos interveiculares.

Como motoristas não veem seus faróis acesos, há considerável probabilidade de agigantamento de recursos contra multas. Fortalece a justificativa aos que buscam se proteger na alegada “indústria da multa”. Como as manchas urbanas transcenderam o alinhamento de rodovias, o considerável volume extra de veículos nas avenidas rodoviárias pode causar enorme transtorno.

O uso dos faróis durante o dia tende a maximizar a segurança viária. A origem dessa imposição se reporta à Escandinávia, onde a incidência de raios solares contrasta às regiões tropicais. Contudo, nos EUA os faróis de rodagem diurna são compostos por lâmpadas específicas de uso diurno, as “Daytime running lamp” (DRL). São ligadas de forma automática ao se dar partida, evitando riscos de esquecimento. São de baixo consumo, mantendo maior equilíbrio no balanço energético veicular e têm vida útil elevada.

Carros antigos, com mais de 10 anos, estão sujeitos a risco maior de falhas no sistema de iluminação. Relés velhos ou sujeitos a carga excessiva geram o desligamento dos faróis. Circulando à noite, seus motoristas têm “clara” evidência do problema, como indicativo para manutenção ou correção. De dia, não saberão do fato e estarão sujeitos a multa.  Os emplacados há mais de 10 anos correspondem a 47% da frota de 92 milhões de veículos, segundo o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito). Normalmente, apresentam lâmpadas incandescentes, de alto consumo e reduzida vida útil quando comparadas às DRLs.

Há ainda de se observar que no artigo 40, inciso II, do CTB não se pode usar luz alta atrás de outros veículos ou ao cruzá-los, fato que ocorre com frequência, gerando riscos talvez até maiores do que o relativo ao expediente do uso diurno. No inciso III, também no mesmo artigo, a liberdade de avisar que deseja ultrapassar, ao efetuar lampejos contínuos, tem sido usada como forma de coagir assustados motoristas que tentam manter a velocidade máxima e que não querem ultrapassar em locais perigosos. Estes irresponsáveis parecem dizer que, se o que está à sua frente “não correr” ou ultrapassar, será “atropelado”. Não se vê coibição efetiva a essas práticas do uso de faróis.

Recentemente, o Denatran fez uma pesquisa para avaliar a tendência de cumprimento da obrigatoriedade de uso de faróis durante o dia, em rodovias paulistas de alto volume de tráfego diário. Foram observados 1.027 veículos –praticamente 1% do volume diário médio das vias envolvidas– e 57% deles estavam com faróis acesos (excluindo-se carros com DRL e motocicletas).

Vale destacar ainda um dado curioso da pesquisa. Na Rodovia Antônio Sant´Ana, uma das avaliadas, 67% dos motoristas estavam com faróis acesos quando o Sol incidia em seus rostos, caindo para 52% quando o Sol incidia nas costas. Outro fato chama a atenção: a grande diferença do uso do farol durante o dia em rodovias do interior e próximas à capital: 60% e 34%, respectivamente. Esses dados permitem inferir que o volume de multas na fase inicial da nova lei pode ser elevado.

Indústria da multa

Os dois maiores problemas do trânsito brasileiro são o excesso de velocidade e o ato de dirigir depois de beber. Pelo CTB, até 2006, transitar em rodovias com velocidade superior à máxima em mais de 20% era infração gravíssima e já dava suspensão do direito de dirigir (art. 218/CTB, lei 9503 de 23/9/97). A lei 11334, de 25/7/2006, altera esse artigo: passa o excesso de mais de 20% para infração grave com multa, mas não mais com suspensão do direito de dirigir.

A sensação de risco menor de ser flagrado e “perder” a carteira provavelmente colaborou na manutenção do crescimento das estatísticas. Quanto à lei 11.705, de 2008, a conhecida lei seca, há de se abordar que o número de mortos por ano diminuiu no ano seguinte, mas explodiu nos anos subsequentes –reduzindo apenas em 2013, já sob influência do desaquecimento da economia.

As estatísticas de mortos ano a ano no trânsito ajudam a mensurar o problema. Segundo o Datasus, de 2004 a 2014, o crescimento de médio de mortos no trânsito por ano foi de 2,27%, contra 1,1 % da taxa de aumento da população brasileira.

Como multas devem servir para a disciplina de motoristas, a já alta carga de multas, que tem gerado forte reprovação, mais do que vergonha, em motoristas infratores, pode aumentar na fase de imposição dessa nova lei de uso dos faróis. O que faltam mesmo são faróis na aplicação dos recursos de multas, como sites que apresentassem detalhes das multas pagas e os projetos de aplicação dos recursos, de acordo com o artigo 320 do CTB. Esta luz sim poderia garantir maior efetividade nas políticas de trânsito.

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