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Ex-sargento da Rota ostenta "lista da morte" nas redes sociais

Roberto Lopez Martinez costuma publicar fotos com facas em seus perfis Imagem: Reprodução/Facebook

Colunista do UOL

12/07/2020 11h31

O sargento Roberto Lopez Martinez, apontado como um dos maiores matadores da Rota (Ronda Ostensivas Tobias de Aguiar), unidade de elite da Polícia Militar, acusado por ao menos 45 homicídios, ostenta nas redes sociais uma espécie de "lista da morte" de suas vítimas.

Ele é protagonista do caso Rota 66 —narrado no premiado livro de Caco Barcellos—, no qual três jovens de classe média foram mortos por policiais militares nos Jardins, área nobre da zona sul paulistana. À época, os PMs alegaram ter havido troca de tiros e foram absolvidos nesse episódio.

Passados 45 anos do caso Rota 66, ocorrido em 23 de abril de 1975, o sargento ainda é reverenciado e chamado de herói por admiradores em um de seus perfis no Facebook.

Foi nessa rede social que ele postou "a lista da morte". A reportagem não conseguiu contato com Martinez.

A relação tem três páginas. Há datas de 72 audiências judiciais e números de processos aos quais o sargento respondeu no período de 25 de junho de 1986 a 7 de abril de 1995, pelas mortes de civis quando ele atuava na Rota.

A lista traz ainda os locais onde aconteceram os homicídios. Bairros pobres da periferia da capital e região metropolitana de São Paulo compõem a maioria dos lugares.

Lista da morte apresenta pequenas manchas amareladas pelo tempo Imagem: Reprodução/Facebook

As anotações foram escritas a caneta. O nome de Martinez aparece em todas as audiências agendadas. Outros policiais militares também são mencionados.

Na primeira coluna das páginas, sempre do lado esquerdo, aparece em cada uma das linhas o número de mortos em determinada ocorrência. A relação, por ser antiga e ter sido escrita há 25 anos, apresenta pequenas manchas amareladas pelo tempo.

Um fato que chama a atenção na lista é que Martinez se envolveu em ocorrência com morte até mesmo no bairro que consta como seu endereço, fornecido por ele em um processo judicial na área cível. Isso aconteceu em 1985, em um município na Grande São Paulo.

No ano passado, quando o caso Rota 66 completou mais um ano, o sargento fez a seguinte postagem em um de seus três perfis no Facebook: "Em 23 de abril de 1975, ou seja, há exatos 44 anos, eu segurei um dos maiores pepinos da Polícia Militar. E seguro até hoje", escreveu.

No mesmo perfil lhe sobram elogios: "Você é o ícone da Segurança Pública". Outro completa: "Fez a diferença entre bandido e mocinho". Um terceiro acrescenta: "Símbolo de honra". Um admirador posta que batizou o filho com nome de Martinez em homenagem ao sargento.

Nos outros perfis, Martinez mostra ser um ferrenho defensor e eleitor do presidente Jair Bolsonaro. Há dezenas de fotos dele vestindo verde e amarelo em manifestações políticas. Em outras postagens, ele ironiza a homossexualidade e publica fotos com facas.

Na célebre obra "Rota 66 - A História da Polícia que Mata", o repórter e escritor Caco Barcellos diz que o sargento é o maior matador da Rota, a tropa mais letal da Polícia Militar. O livro atribui a Martinez a autoria de 45 mortes.

Segundo os números do Tribunal de Justiça Militar, fornecidos à reportagem, Martinez foi absolvido em 15 processos de homicídio.

Outros 19 Inquéritos Policiais Militares de homicídios e dois por lesões corporais foram arquivados. Outros quatro inquéritos com mortes de civis foram encaminhados à Justiça Comum.

A reportagem procurou neste sábado (11), o Serviço de Comunicação Social da Polícia Militar para saber se Roberto Lopes Martinez foi expulso da corporação e quando.

Porém, no sistema eletrônico de consulta de dados da corporação não aparecia o nome dele.

O livro de Caco Barcellos descreve que Martinez foi preso em 1986. A expulsão aconteceu em março do mesmo ano. O motivo foi o assassinato de dois adolescentes de 17 anos em um lixão em Diadema, na Grande São Paulo. Ele foi preso e condenado pelo duplo homicídio.

No caso Rota 66, Martinez alegou que os três jovens, ocupando um Fusca azul, haviam furtado um toca-fitas e que durante perseguição atiraram contra a guarnição dos policiais e acabaram mortos no revide. As famílias dos rapazes contestam até hoje essa versão.

Mesmo expulso da Polícia Militar, Martinez cansou de ser visto nos últimos anos durante visitas e cerimônias no quartel da Rota, na avenida Tiradentes, na região da Luz, centro. O sargento foi enaltecido pela tropa e por colegas veteranos.

O sargento sempre gostou de fazer fotos ao lado de viaturas antigas dentro do quartel, onde há uma inscrição antiga com a seguinte frase: "A Rota é reservada aos heróis".

Outro prazer de Martinez é participar de desfiles militares em veículos blindados e com fardamento da Rota.

No último dia 24 de junho, Martinez perdeu um "irmão" de farda. O sargento Everaldo Borges de Souza, também citado no livro de Caco Barcellos, morreu vítima de coronavírus no Hospital da Polícia Militar, na Água Fria, zona norte.

Everaldo também se envolveu em ações polêmicas. Uma delas foi a Operação Castelinho, em março de 2002, quando 12 integrantes do PCC (Primeiro Comando da Capital) morreram em suposto tiroteio com policiais da Rota e de outros batalhões da PM. Os policiais foram denunciados à Justiça pelos homicídios, mas acabaram absolvidos.

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