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Retrocesso da PEC da Anistia e os desafios na representatividade

Votação no plenário da câmara dos deputados Imagem: 17.mai.2023 - Ton Molina/Estadão Conteúdo

Débora do Carmo Vicente e Rafael Morgental Soares*

Especial para o UOL

19/09/2023 04h00

Provavelmente o maior defeito da democracia brasileira é a baixa representatividade de grupos importantíssimos da população, sobretudo mulheres, indígenas e pessoas negras.

Num ranking de 193 países que avalia a representação feminina no Legislativo, O Brasil se encontra na 133ª posição, atrás de nações bem menos comprometidas com os direitos das mulheres, como Iraque (70.ª) e Arábia Saudita (119.ª).

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Na América do Sul somos o país com o menor índice de participação feminina no parlamento, com 17,7%, abaixo da média continental, de 34,7%.

A situação de indígenas e pessoas negras é ainda pior. Nosso Congresso Nacional é dominado pela persona do homem branco, rico, de meia-idade, que estipula as regras do jogo eleitoral.

E dos poucos avanços que tivemos nos últimos anos para reverter essa representação política injusta e ineficiente, boa parte foi impulsionada pelo Judiciário, que constrangeu o parlamento a aprovar leis em favor da proporcionalidade.

A verdade é que o legislador brasileiro não tem compromisso com a igualdade eleitoral. Ao contrário, tenta aprovar retrocessos sempre que surge a oportunidade, como agora, com a discussão de uma minirreforma eleitoral.

Nesse contexto surge a Proposta de Emenda Constitucional 09/2023, voltada a anistiar partidos que não respeitaram a proporcionalidade na distribuição dos quase 8 bilhões de reais de recursos públicos destinados a campanhas eleitorais, deixando mulheres e pessoas negras em desvantagem.

Mas não é só.

A intenção é também proibir a cassação de candidatos eleitos por partidos que não cumpram a cota de gênero, desde que entre eles haja pelo menos uma mulher eleita.

A medida é uma resposta à Justiça Eleitoral, que vem derrubando a chapa inteira de partidos descomprometidos com a igualdade de gênero, e que lançam candidaturas de mulheres fictícias e/ou fraudulentas apenas para garantir a viabilidade eleitoral de homens.

Com relação às pessoas negras, o retrocesso também é gritante. Embora sejam a maioria da população, não terão mais a garantia de proporcionalidade no recebimento dos recursos públicos de campanha fixada pelo TSE e pelo STF em sua jurisprudência, mas apenas 20% da verba disponível, no máximo, ainda que o percentual de candidaturas negras do partido seja maior.

Em resumo, a PEC 09 é um retrocesso lamentável, que enfraquece a democracia brasileira apostando num modelo excludente e homogêneo que nunca deu certo, afinal, o vigor do regime democrático representativo vem justamente da pluralidade e da diversidade na ocupação dos espaços de poder.

*Débora do Carmo Vicente é mestre em direito, servidora do TRE-RS, coordenadora da Comissão de Participação Feminina Institucional do TRE-RS e membro da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político) e Igade (Instituto Gaúcho de Direito Eleitoral).

*Rafael Morgental Soares é mestre em direito, advogado, membro da Abradep e Igade.

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