OPINIÃO
Eleições suplementares são ponta de iceberg de milhares de ações judiciais
Ary Jorge Aguiar Nogueira
Da Abradep*
09/04/2024 04h00
No último domingo de abril, cerca de 60 mil pessoas irão às urnas para escolher, em eleições suplementares, quem ocupará o cargo de prefeito em Alto Alegre (RR), Armação dos Búzios (RJ), São Francisco de Assis (RS) e Turvelândia (GO).
Os eleitos, entretanto, deixarão os cargos em 31 de dezembro de 2024, pois um pouco antes, em outubro, o eleitorado nacional escolherá prefeitos e vereadores de 5.568 municípios.
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A ocorrência das eleições suplementares é prevista no artigo 224, do Código Eleitoral. Dentre as hipóteses legais, destaca-se a do parágrafo terceiro, que determina a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados, quando decisão da Justiça Eleitoral importar o indeferimento do registro, a cassação do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em pleito majoritário.
Em média, 2% das eleições municipais brasileiras são renovadas em suplementares. No entanto, essa é a parte visível de um imenso iceberg formado por milhares de ações judiciais.
Recentemente, apuramos que cerca de 70% das pessoas eleitas nos municípios do Rio de janeiro responderam a ações que poderiam invalidar os resultados. Em São Paulo, a cifra é de cerca de 50%.
Além disso, quando observamos os resultados eleitorais no Brasil, vimos que, em média, metade das suplementares são vencidas pela oposição local.
Os dados nos demandam reflexão, pois, a cada eleição, mais pessoas vão às urnas sem ter a certeza de que suas escolhas sobreviverão ao escrutínio das cortes.
Evidentemente, não defendemos a omissão frente a maus feitos, porém, o alto percentual de ações e o baixo número de invalidações de resultados sugerem a utilização estratégica das demandas pelas campanhas.
Nesse sentido, o baixíssimo custo da litigância, somado à alta recompensa em caso de vitória, parece estar incentivando os atores políticos a demandarem seus concorrentes, na busca por "terceiros turnos" decretados judicialmente.
A democracia brasileira é resiliente, mas a percepção social é quase tão importante quanto a própria integridade eleitoral. Não podemos nos dar ao luxo de ignorar os impactos no eleitorado em razão da realização tão tardia de novas eleições, bem como do alto volume de demandas que se mostram infrutíferas.
*Ary Jorge Aguiar Nogueira é doutor em direito pela USP e membro da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político).
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL